Análise: Porsche voltou a Le Mans para pôr ordem na casa. E venceu no ‘estilo Audi’

A Porsche queria voltar a competir no mais alto nível no automobilismo, e resolveu que precisava colocar ordem na casa para seguir como maior vencedora das 24 Horas de Le Mans. Para conseguir a 17ª vitória, executou muito bem o que a Audi se especializou em fazer nos últimos anos

Há diversos motivos para uma montadora mergulhar em um projeto no automobilismo: a busca por vitórias, novas tecnologias, explorar o potencial de marketing, impulsionar as vendas de carros. Cada marca tem seu propósito, seu interesse, sua preferência de acordo com o nicho de mercado que atende e a sua filosofia.

A Porsche teve suas razões para retornar à LMP1. Queriam desenvolver novas tecnologias, e se viram atraídos por um regulamento que dá liberdade para o aprimoramento de sistemas de recuperação de energia. Queriam um retorno de mídia maior em comparação ao que obtinham competindo apenas na GTE Pro, e para isso é preciso vencer na classificação geral. Queriam continuar como recordistas de vitórias nas 24 Horas de Le Mans, e a Audi se aproximava de forma perigosa.

Este foi um resultado histórico para a Porsche (Foto: AP)

Neste domingo (14), a Porsche colheu sua recompensa, e em grande estilo. Do jeito que a Audi se acostumou a fazer nos anos em que alguma concorrente ameaçou sua soberania.

O trabalho rumo a esta vitória começou em 2014, com a reentrada na LMP1, mas foi fundamental a evolução conquistada ao longo do último inverno europeu.

No ano passado, o 919 já era um protótipo muito rápido. No entanto, o ritmo de corrida deixava a desejar, e a confiabilidade também seguia como um problema. A única vitória foi na última corrida, em São Paulo, e certamente serviu de impulso para a ascensão de 2015.

Algo que foi chave foi a mudança para a classe de 8 MJ, subindo em relação aos 6 MJ de 2014. Essa capacidade de evolução, por exemplo, faltou na Toyota, que dominou o último campeonato. E, na comparação com a Audi, é quase um prêmio por possuir um sistema híbrido mais desenvolvido, que é o que o regulamento técnico prioriza. Os 4 MJ a mais de potência em relação aos coirmãos fazem a diferença principalmente em ritmo de classificação, mas o 919 foi capaz, em Le Mans, de imprimir um ritmo de corrida muito bom. A autonomia ligeiramente maior entre os pit-stops fez a diferença para permitir a dobradinha, com o Porsche #17 na segunda colocação.

Mas o que foi chave foi a confiabilidade. Isso que permitiu à Porsche executar tão bem o que a Audi fazia nos últimos anos: crescer na corrida nos momentos de oscilação dos adversários. Fez isso muto bem nos últimos dois anos, inclusive.

A Porsche estava insegura antes da largada, pois, apesar do 1-2-3 no grid, jamais havia completado um teste de 24 horas sem apresentar problemas. Sim, em Le Mans, foi a primeira vez que os 919 concluíram 24 horas seguidas de trabalho sem falhas técnicas graves — e não um, mas os três carros chegaram desta forma à bandeirada.

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Livre de contratempos, a Porsche conseguiu aproveitar a noite, com as temperaturas mais baixas, para assumir a liderança e abrir com Nico Hülkenberg, Nick Tandy e Earl Bamber. Já a Audi, que teve o carro mais rápido da prova e estabeleceu uma nova volta recorde em corrida, sofreu justamente no início da manhã, quando deveria alcançar seu melhor rendimento. O #7 teve um problema na carenagem que exigiu alguns pit-stops para ser consertado, além de ter de parar no final para completar o óleo; o #9 perdeu muito tempo com um problema no sistema híbrido; e o #8 até esteve rápido, mas não o bastante para se recuperar do acidente sofrido por Loïc Duval no fim da terceira hora.

E ainda assim a Audi seguiu na briga até as últimas horas: os reparos todos foram sempre muito rápidos, obrigando a Porsche a seguir atacando para aumentar a vantagem. Algo de errado poderia surgir, e não se sabia qual seria a gravidade ou qual o poder de reação. Por isso Hülkenberg, Tandy e Bamber completaram 395 voltas, apenas duas a menos que o recorde, registrado em 1971 e em 2010.

Assim a Porsche quebrou uma sequência de cinco vitórias consecutivas da Audi e conseguiu mais uma de vantagem na contagem total, 17 a 13.

Até se falou, na ocasião do retorno da Porsche à LMP1, que não fazia muito sentido o Grupo Volskwagen ter duas marcas competindo uma contra a outra no Mundial de Endurance e se recusar a entrar na F1. Mas agora a 'família' pode bater no peito e dizer que conseguiu uma quina em uma das corridas mais importantes do planeta. A imagem de Wolfgang Ullrich, o chefão da Audi, entrando no box da Porsche nos minutos finais para cumprimentar Fritz Enzinger, o chefe do projeto LMP1 da rival, para parabenizá-lo foi marcante.

Fica a expectativa, agora, por uma interessantíssima batalha no restante do Mundial de Endurance. A Audi venceu as duas primeiras provas, mas a Porsche se põe em condição de igualdade graças à pontuação dobrada de Le Mans. E predominam, agora, circuitos em que a maior potência híbrida dos 919 tende a representar uma boa vantagem em relação aos R18 e-tron quattro.

Expectativa ainda maior começa a se formar para as 24 Horas de Le Mans de 2016. Allan McNish, três vezes vencedor, diz que a derrota em Sarthe é a mais dolorosa de todas, pois é preciso esperar um ano para se ter outra chance. Ao mesmo tempo, só é tão especial por causa de toda essa espera.

Para a Porsche, foram 17 anos de espera até a 17ª.

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