Coluna Parabólica, por Rodrigo Mattar: F3 Brasil, questão de ego ou questão de sobrevivência?

Uma coisa é certa: as vitórias do filho do tricampeão devolveram os holofotes à F3 Brasil como há muito tempo não se via. É hora de arregaçar as mangas e tirar partido dessa visibilidade. E que as outras equipes arregacem as mangas para oferecer ao público mais e melhores corridas. É isso que queremos

Em qualquer atividade na vida profissional, o sucesso incomoda. A F3, que deixou de ser sul-americana no nome que carregava desde 1987 para ser brasileira no nome e na essência em 2014, começa sua nova trajetória despertando a velha celeuma da ‘irregularidade’. Tudo porque um sobrenome de muito peso reaparece fazendo barulho como de outras vezes, ganhando corridas e despertando assim a maldade alheia.

Aos 16 anos incompletos, Pedro Piquet, mais do que um pedigree de respeito, carrega nos ombros a responsabilidade das palavras do próprio pai, que hoje o considera o “menino dos olhos”, talvez o melhor dos seus herdeiros. O entusiasmo de Nelson Piquet com o potencial do menino é tanto que ele acompanha com grande interesse e atenção os primeiros passos de seu filho depois que este saiu do kart rumo às corridas de fórmula.

As primeiras corridas do garoto na F3, pela equipe de Augusto Cesário, deram alguma razão ao que se diz dele. Três vitórias consecutivas, sem tomar conhecimento dos adversários e quatro triunfos na principal divisão, com carros Dallara F309, já que Vitor Baptista conseguiu uma rara façanha: vencer na geral com um velho F301 no circuito gaúcho de Santa Cruz do Sul, no fim de semana passado.

Pedro Piquet comemorou a vitória ao lado do pai. (Foto: Duda Bairros/Vicar)

Um início de temporada com quatro vitórias seria motivo de júbilo, não fosse o diz-que-diz-que a tomar conta dos bastidores da categoria assim que as duas primeiras rodadas duplas foram disputadas. Sempre bem informado, o querido amigo Américo Teixeira Júnior disse em seu site, o ótimo Diário Motorsport, que já havia uma ‘movimentação’ de bastidores para evitar o acachapante domínio de Pedro Piquet na F3 Brasil.

A Vicar, organizadora da categoria, tratou de pôr panos quentes na situação. Maurício Slaviero, em depoimento ao próprio Américo, negou que essa ‘movimentação’ tenha como causa uma suposta crise de egos em tiras pelo domínio inicial do piloto da equipe Cesário e que as reuniões previamente agendadas seriam para ouvir queixas das demais escuderias acerca de ‘irregularidades’. E, dando sequência a tudo isso, o dono da escuderia na qual corre Pedro Piquet foi taxativo. “Não há irregularidades. Há trabalho.”

Campeã por muitos anos da categoria, a Cesário reuniu Piquet e um velho conhecido da F3: o engenheiro Felipe Vargas, que conhece muito do riscado e foi o grande artífice do surgimento da Piquet Sports, a escuderia na qual se investiu muito para que Nelsinho Piquet subisse da categoria continental de monopostos para chegar à Inglaterra (e vencer) e, posteriormente, na GP2 Series e na F1. Se não deu certo, é outra história. Como profissional e especialista no acerto de carros, Felipe Vargas é dos melhores e seu retorno ao Brasil só agrega valor à categoria.

Tudo do que a F3 não precisa é de um momento de ciúmes que pode, aí sim, acarretar numa crise. Cabe lembrar que, no ano passado, quando a situação era muito pior, com grids magérrimos, Felipe Guimarães foi o senhor absoluto da situação pela equipe Hitech Racing, do não menos competente Rodrigo Contin, e ninguém levantou a voz para questionar o domínio do piloto, que voltou ao automobilismo europeu. Ninguém falou em ‘irregularidade’ como agora, quando a personagem em questão é o filho de Nelson Piquet.

Talvez o problema esteja no fato de Pedro carregar o sobrenome que tem e de que, no início deste ano, ele e o pai se envolveram numa bulha com a Confederação Brasileira de Automobilismo, que emitiu uma licença provisória para que o piloto competisse na Toyota Racing Series, campeonato de inverno com cinco provas na Nova Zelândia, no qual ele teria seu primeiro contato com um monoposto. Nelson Piquet investiu pesado para dar todas as condições do filho evoluir na categoria e após duas rodadas, foi informado que Pedro estava vetado para competir no resto do campeonato. Ficou uma arara, com razão – afinal, quem não ficaria? – uma vez que o dinheiro gasto não foi e nem teria como ser devolvido.

O maior problema da F3 em seu recomeço não é o domínio do piloto da Cesário.

É a busca da credibilidade perdida de um certame que já foi dos mais chamativos e que reuniu dezenas de excelentes pilotos que foram para o exterior buscar carreira internacional. E para conseguir devolver essa credibilidade à F3, a Vicar tem que aparar várias arestas.

Sugiro ao Maurício Slaviero que seja costurada uma parceria com as duas categorias regionais de monoposto que ainda sobrevivem no país: a Fórmula Júnior e a Fórmula Gaúcha. São excelentes alternativas para o surgimento de jovens valores para o automobilismo brasileiro porque são campeonatos de custo baixo e a oferta de testes ou mesmo de uma temporada completa na F-3 Brasil seria um chamariz dos bons para a renovação de pilotos – que praticamente inexiste a nível nacional.

E já que o negócio é sugerir, vou mais além: para aumentar a visibilidade da categoria num ano que começou com 16 carros inscritos em Tarumã – diminuindo para 14 em Santa Cruz do Sul em decorrência de acidentes, creio eu – é imperioso que os promotores da categoria não façam o que se fez no domingo passado. Marcar uma prova da F3 Brasil para o horário de 7h55 da manhã é uma brincadeira de mau gosto com equipes, pilotos, público e com quem gostaria de acompanhar as provas no site Terra, no qual se prometeu as transmissões ao vivo, aos domingos.

Tem mais: cadê a divulgação dos VTs das corridas na semana posterior à realização das mesmas? Alguém sabe? Alguém viu? Se passou, eu não vi. Infelizmente.

Fui – e ainda me considero como tal – um dos maiores defensores da sobrevivência da F3 no território nacional porque acredito que ainda podemos dar a volta por cima e fazer do Brasil um novo celeiro de talentos como já fomos no passado. A CBA e a Vicar precisam ter essa consciência do que têm em mãos e do que a categoria representa ao esporte em termos históricos.

Brigar porque Pedro Piquet teve competência para ganhar quatro corridas em quatro disputadas não adianta de absolutamente nada. O cerne da discussão é outro: é o futuro da F-3 e da formação de pilotos para o automobilismo brasileiro seguir bem representado no exterior que está em jogo. Rogo para que os promotores da categoria não tratem a categoria de monoposto como um simples evento suporte e valorizem-na da forma como ela precisa ser valorizada. Afinal de contas, de que terá valido a pena ao Dárcio dos Santos, por exemplo, voltar com a PropCar, de tão rica história na categoria? Se ele voltou, é porque acredita que pode haver um retorno na formação de pilotos a médio prazo.

Uma coisa é certa: as vitórias do filho do tricampeão devolveram os holofotes à F3 Brasil como há muito tempo não se via. É hora de arregaçar as mangas e tirar partido dessa visibilidade. E que as outras equipes arregacem as mangas para oferecer ao público mais e melhores corridas. É isso que queremos.

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