Coluna Warm Up, por Flavio Gomes: Ninhôôô

Daí que ninguém se surpreendeu quando a BMW voltou ao DTM, o principal campeonato de Turismo do mundo, e te escalou para o time de fábrica. Quem mais? Melhor estreante no ano passado, uma vitória, mais duas neste ano e olha, Ninho, digo, Júnior, dá gosto de ver

Ninhôôô,

Você acabou de fazer 30 anos. É uma boa idade. Jovem e maduro, se é que me entende. Ah, e antes que digam alguma coisa, essa história de “Ninho” do título é culpa rigorosamente sua, por conta de um vídeo que você mesmo colocou no ar outro dia, ao levar sua mulher para uma volta num autódromo. Maldade sua com a moça, acelerar daquele jeito. Mas que foi engraçado, foi. Eu nunca soube que em casa você era chamado de “Ninho”. Na verdade, te conheci como “Júnior”. Augusto Jr., filho do Augusto pai, pois. Farfus também veio depois.

Vejamos… Fim de 1994? Provavelmente sim. Um evento de apresentação da Forti Corse aqui em São Paulo, num restaurante no Itaim, se não me engano. Na mesa, Pedro Paulo Diniz, futuro piloto da equipe, Roberto Moreno, já um veterano, e você, um fedelho de 11 anos que tinha o mesmo patrocínio da Credicard que os dois que alinhariam o carro da nova equipe na F1. Não entendemos, nós os jornalistas, sua presença ali. “Cadê o pai desse menino?”, brincamos. Aí nos explicaram. O menino era o tal de Augusto Jr., paranaense, vice-campeão brasileiro de kart e campeão paulista na Júnior Menor. Estava ali meio de contrabando, o evento envolvia vários patrocinadores, e um deles era o mesmo que o seu. Aí alguém me contou que seu pai era dono de restaurantes em Curitiba e que a Credicard tinha uma ótima parceria com ele, algo assim. Era isso mesmo? Acho que sim.

Verdade seja dita, não demos muita importância porque: 1) ali, a criação de uma nova equipe de F1, com dois pilotos brasileiros, era o motivo do evento; e 2) se tinha uma coisa que não faltava no Brasil na época era moleque bom no kart sendo rotulado de “novo Senna”, ainda mais no ano da morte de Ayrton, meses antes.

Assim, um garoto a mais, um garoto a menos não fazia muita diferença. OK, é bom, quem sabe vire alguma coisa, o tempo dirá. A maioria não vira nada. Acho que no dia seguinte, ou naquele dia mesmo, almocei com você, seu pai e já não lembro se algum assessor de imprensa amigo, ou empresário. Como diz um amigo meu, tem duas coisas que não se pode perder nesta vida: pênalti e almoço de graça. Me convidaram, fui. E então conheci você, um menino de 11 anos, almocei de graça e fui cuidar da vida.

E você foi também. Mais muitos anos de kart, até 1999, a gente aqui acompanhando a distância, mas nada de muito especial, porque o kart, sejamos sinceros, recebe uma atenção muito restrita da imprensa. Não dá para acompanhar tudo, não nos culpe.

Em 2001, porém, veio um resultado nada desprezível: campeão europeu de F-Renault. Opa, quem é esse menino? Ah, aquele Augusto Jr., do Paraná. Caramba, que legal, o menino está andando bem, que beleza. Fiquemos atentos. Então, quando você ganhou a F-3000 Europeia em 2003, já como Farfus, a coisa ficou interessante. O campeonato não era grande coisa, uma espécie de Série B da F-3000 Internacional que fazia preliminar de F1, mas foi de lá que Massa saiu direto para a Sauber. Portanto, olho nesse garoto. E começaram a surgir especulações bem fortes, inclusive com negociações bem avançadas com a Jordan.

Por um motivo ou outro (um: dinheiro; outro: dinheiro, também), acabou não dando certo. E em 2004, em vez de se aboletar dentro de um formulinha qualquer, drenando as finanças da família, lá estava o garoto Farfus num carro de Turismo, contratado para disputar o Mundial pela Alfa Romeo. Fez bem? Fez mal? Olha, sendo muito franco, novamente, as atenções não eram muitas para o novo rumo da sua carreira. Tínhamos Barrichello na Ferrari, tempos divertidos, Massa na Sauber, promissor e futuro piloto de Maranello, e na Indy o Tony conquistava seu primeiro título com uma campanha notável. O Mundial de Turismo era algo menos relevante.

E você nem aí para relevâncias. Foi cuidar da sua carreira de piloto profissional, três anos de Alfa Romeo, resultados sólidos, reputação sendo construída, ganhou Macau em 2005, mais três corridas em 2006, tudo pela Alfa, e de vez em quando a gente se esbarrava num avião aqui, noutro ali, como estão as coisas?, ah, estão bem, e realmente estavam. Tanto que em 2007 a BMW te contratou para a equipe oficial do WTCC, e não dá para dizer que você fez pouco pelos alemães, não. OK, não foi campeão, mas como desprezar as vitórias nas 24 Horas de Nürburgring, duas, a pole em Le Mans na sua categoria, e mais uma vitória em corrida de 24 horas, em Dubai?

Daí que ninguém se surpreendeu quando a BMW voltou ao DTM, o principal campeonato de Turismo do mundo, e te escalou para o time de fábrica. Quem mais? Melhor estreante no ano passado, uma vitória, mais duas neste ano e olha, Ninho, digo, Júnior, dá gosto de ver. Dá gosto de ver a posição que você conquistou junto à equipe, a reverência que os alemães prestam a você, seu nome sendo inscrito na história de uma das marcas mais importantes do mundo, sua simpatia, sua dedicação, seus resultados, o respeito dos adversários, tudo aquilo que faz um piloto se orgulhar do que fez lá atrás, das escolhas difíceis, da mudança de rumo, da coragem que é necessária para abrir mão de um sonho, a F1, e correr atrás de outro.

O Brasil anda mal das pernas no automobilismo, você sabe. Mas tem uns caras, poucos, como você que ainda nos ajudam a lembrar que já fomos bons nisso.

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