Alonso volta como ‘piloto-propaganda’ e lança questão: é a melhor solução para Renault?

Na terceira passagem pela equipe francesa, o bicampeão que logo vai fazer 39 anos não terá a bolha de proteção de Flavio Briatore, mas a missão de dar um rumo que a esquadra tanto precisa. Será?

Menos de dois anos após deixar a F1, Fernando Alonso está de volta. A verdade é que, depois daquele 14 de agosto de 2018, o retorno ao grid parecia improvável. Afinal, o espanhol optara por renunciar ao Mundial porque não via mais chances de guiar um carro competitivo e que lhe desse condições de vitória ou até mesmo de disputar o sonhado tricampeonato. As três grandes equipes também jamais deram a entender que haveria, em algum momento, lugar para o asturiano. Enquanto a Mercedes seguiu firme seus planos com Lewis Hamilton, a Red Bull e a Ferrari preferiram apostar em jovens audazes. Sem espaço, embora pensasse em retornar em um 2021 de renovação das regras, uma boa vaga se mostrava como um artigo inalcançável. Portanto, tornou-se difícil imaginar que Alonso aceitasse voltar para andar em um pelotão intermediário, ainda que desejasse muito uma despedida mais digna da F1.

Só que as decisões de Fernando nem sempre são tão simples e claras. Aliás, muitos atribuem os diversos reveses que ele viveu na carreira aos caminhos tortos que tomou. Por exemplo, quando optou por bater de frente com Ron Dennis numa McLaren que tinha Hamilton como prodígio ou ainda quando deixou de assinar com a Red Bull pouco antes dos energéticos se tornarem uma potência, no início da década. Sem contar a opção de abraçar o projeto da Honda na mesma equipe inglesa, mas sem filtro para críticas ou paciência para o desenvolvimento. É certo dizer que o espanhol não tinha como adivinhar algumas das mazelas, mas muitas vezes seu temperamento ajudou a colocá-lo em apuros. Muitos apuros. A passagem pela equipe de Woking talvez seja o maior exemplo disso, que acabou respingando também na aventura na Indy.

Agora, Alonso tenta mais uma vez escrever um capítulo diferente.

Fernando Alonso
Fernando Alonso jamais fechou a porta para a Fórmula 1 (Foto: Rodrigo Berton/Grande Prêmio)

O bicampeão assinou com a velha parceira Renault para o retorno à F1. A equipe ainda fica em Enstone, na Inglaterra, ainda leva o amarelo na carenagem e há muita gente, entre mecânicos, engenheiros e técnicos, da época do espanhol. A ideia de volta ao lar para por aí, no entanto. Hoje, a esquadra francesa é muito diferente daquela que o asturiano deixou em 2009, manchada pelo escândalo do caso da batida proposital do GP de Singapura de 2008. Aquele time que carregava o estilo mais duro de Flavio Briatore não existe mais. Não pode ser visto como uma espécie de recuperação para Alonso, como foi na segunda passagem, logo depois que saiu da McLaren devido às desavenças com Dennis e Hamilton.

Agora, a estrutura é outra e o propósito também é diferente. A Renault precisou se reerguer daquele vexame, e só em 2016 é que foi capaz de retornar ao grid. E aí veio com um novo estilo de administração. Cyril Abiteboul foi quem apareceu no comando. Pouco conhecido no paddock à época, o francês tinha no currículo uma longa trajetória dentro da marca. Foi diretor de desenvolvimento em 2007, em que era responsável por assuntos comerciais, parceiros e patrocinadores. Também se tornou diretor-executivo em 2010. Um ano depois, esteve à frente dos contratos para fornecimento de motores. O trabalho na Renault o levou à chefia da extinta Caterham em 2012. Cyril voltaria à equipe gaulesa dois anos depois para assumir o papel de diretor administrativo, o que o alçou ao posto principal, onde está desde então.

A Renault de hoje não lembra em nada aquela que deu a Alonso seus dois campeonatos na F1 (Foto: Renault)

À frente da marca, o dirigente impôs um modo de resistência, digamos assim. Nos bastidores, brigou por regulamentos mais equilibrados e o teto orçamentário. Na garagem da Renault, entretanto, foi errático e inimigo dos críticos. Não soube conduzir a parceria com a Red Bull, e isso causou o fim da associação. Também cometeu falhas na escolha de pilotos – afinal, quem não se lembra de Jolyon Palmer? O fato de Daniel Ricciardo, trazido a peso de ouro, sair tão rapidamente também é outra prova de um gerenciamento questionável. O cenário, agora, é delicado.

A equipe não vence ou vai ao pódio desde o retorno à F1. Teve enorme dificuldade na adoção dos motores V6 híbridos e levou tempo para tornar suas unidades confiáveis e potentes – e ainda não conseguiu se igualar ao resto do grid. Além disso, atravessa um momento complexo em termos financeiros e teve de pedir um empréstimo de € 5 bilhões ao governo francês. A Renault precisa de um norte. Só isso justifica o investimento em alguém como Alonso, um piloto-propaganda.

É uma aposta baseada no passado, mas se justifica. Fernando é um dos pilotos mais completos do mundo. Quase aos 39 anos, pode andar rápido de qualquer coisa com rodas e motor. Ponto final. Mas também há o lado competitivo. A Renault não chega nem perto de Mercedes e Red Bull neste ano. A Racing Point também desponta, junto com a McLaren. No meio delas, está a Ferrari. Então, os problemas são grandes e o tempo será decisivo. 2021 vai repetir 2020. A revolução só vem em 2022. Alonso terá essa paciência toda?

O sucesso nesta volta para casa, na equipe que lhe deu seus dois títulos, vai depender muito mais da mentalidade de Fernando e do que ele próprio espera dessa passagem derradeira. É de conhecimento público a alta exigência técnica e a fome de vitórias do asturiano, mas a Renault de hoje é um projeto estagnado. Não há a expectativa de um novo parceiro ou engenheiros famosos. Só há a certeza de que a equipe segue no pelotão do meio e que o trabalho para mudar é hercúleo, mas sem nenhuma garantia. Além disso, Fernando não vai encontrar nessa Renault aquela bolha de proteção que teve com Briatore e até Zak Brown. Vai colocar a cara para bater, de fato. E isso é muito bom.

Se Alonso desembarcar na Renault com a urgência de vencer que mostrou na segunda passagem por lá ou da época da McLaren-Honda, a chance de tudo dar errado é enorme. E aí perdem todos. Agora, se Fernando chegar consciente do cenário e do que pode tirar dele, as coisas podem funcionar de maneira diferente. Afinal, Fernando é sensacional e sabe como ninguém tirar tempo de carro.

Isso será suficiente? É a melhor solução? O melhor seria a reedição de uma espécie de Brawn GP: que de uma mudança drástica de regulamento, a equipe francesa retornasse poderosa e vencedora. Não é tão simples. A bola está nas mãos da Renault. Não pode virar uma batata quente.

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