Análise: e se fosse o contrário, a Red Bull revelaria seus segredos aerodinâmicos?

A Red Bull, em pé de guerra com a Renault, disparou também para o lado da Ferrari antes mesmo de assinar e ameaçou sair da F1 se não receber da fabricante italiana motores iguais na próxima temporada. Agora, se a situação fosse oposta, estariam os rubro-taurinos propensos a colaborar?

OK, o regulamento não permite. Cada equipe precisa ser responsável pelo próprio chassi e pela própria aerodinâmica, portanto, a Red Bull não poderia negociar seus segredos aerodinâmicos. Mas, diante da ‘trucada’ que os rubro-taurinos deram nesta terça-feira (22) para cima da Ferrari — e da F1 — exigindo motores iguais para 2016, é um exercício válido de raciocínio.
 
Sim, está claro para todos que a F1 precisa de mais competitividade entre as escuderias. Vide o GP de Cingapura, vencido pela Ferrari, o único em um ano e meio em que a Mercedes realmente esteve fora do ritmo dos ponteiros. A presença de equipes diferentes nas primeiras posições já tornou a corrida interessante, e é isso que o fã de automobilismo quer ver a cada duas semanas.
 
Só que os fins não podem justificar os meios.
 
É óbvio que uma Red Bull mais competitiva, capaz de desafiar Mercedes e Ferrari com frequência, seria excelente para o Mundial. Teríamos campeonatos interessantes como foram os de 2010 e 2012, com pelo menos três equipes vencendo corridas e chegando às últimas etapas ainda sonhando.
 
Mas será que a Red Bull realmente pensa no bem coletivo quando dá tamanho ultimato público à uma empresa com a qual tenta estabelecer um acordo de colaboração técnica? Ou só olha para o próprio umbigo?
Hoje, a maior força da Red Bull não é técnica. A equipe tem poder e grana, e tenta fazer isso valer para voltar ao topo (Foto: Mark Thompson)
O grande problema para o time que, entre 2010 e 2013, faturou todos os títulos de Pilotos e Construtores, venceu 41 GPs e cravou 52 poles, é que o fator que faz a diferença na atual fase da F1 não fica dentro de sua área de expertise. Ao longo da última década, a Red Bull construiu um competentíssimo departamento aerodinâmico e dominou o Mundial enquanto este aspecto era o mais importante. Hoje, não é, e a sua parceira não deu conta do recado.
 
Fazendo a prova real, tomemos uma certa liberdade: se fosse permitido ‘trocar’ segredos aerodinâmicos para ter esse motor igual ao da Ferrari para as temporadas 2016 e 2017, após o rompimento com a Red Bull, eles aceitariam? Provavelmente não. Durante os quatro últimos anos da era dos V8, o discurso de Christian Horner, Adrian Newey e Sebastian Vettel era de que não era justo criticá-los pela monotonia da F1 porque eles haviam trabalhado muito duro para isso. A mesma medida deve valer agora.
 
A Ferrari também não trabalhou? Se a Ferrari sente que é no motor que leva vantagem sobre a Red Bull, por que abrir mão disso? “Por que vou dar à Red Bull os meios para me vencer?”, deve estar pensando, lá em Maranello, a cúpula da equipe italiana.
 
É falta de espírito esportivo da equipe italiana? De forma alguma. É mais falta de espírito esportivo, de fair play, da própria Red Bull, ao bater o pé de tal forma no momento em que viu que perdeu o bonde. É a hora de dar um passo atrás para dar dois à frente.
 
A competitividade/igualdade de que a F1 tanto necessita para produzir grandes corridas e se mostrar novamente atraente para o público não pode entrar tanto neste campo. Ela precisa existir é de uma forma que o esporte seja interessante para diversas montadoras. Assim, a Red Bull conseguiria mais facilmente atrair uma nova parceira para ocupar o lugar da Renault. Ou que não tivesse tornado tão difícil a vida da McLaren Honda neste ano. Já as equipes que desejam, optam, veem-se na obrigação de comprar motores de uma rival com a qual dividirá curvas quinzenalmente, essas terão de entender que limitações existirão.
A Mercedes sabe que, se der as ferramentas para a Red Bull, pode acabar derrotada (Foto: AP)
A observação que se faz necessária
 
Vejam o caso da Mercedes, que levou uma versão atualizada do motor para Monza, mas não a entregou para a Williams, a Force India e a Lotus. A Williams, o tempo todo, dizia que tinha o mesmo motor que a Mercedes no carro e que era apenas uma questão de fazer um trabalho melhor com o chassis para vencer. De repente, se viu sem a nova versão.
 
A justificativa dada por Toto Wolff: o motor ainda estava em desenvolvimento, havia elementos que precisavam ser confirmados na pista, e certamente as clientes ficariam insatisfeitas se o motor novo quebrasse na mão deles. A fala do austríaco ganha peso quando se leva em conta que a unidade de potência de Nico Rosberg realmente apresentou problemas nos treinos livres em Monza, foi retirada do carro e ainda é estudada. Nico teve de partir para o quarto e último motor do ano no GP de Cingapura, no qual largou só na terceira fila e terminou na quarta posição.
 
A Mercedes, aliás, se recusou a vender motores para a Red Bull. O argumento: “Decidimos com o nosso Conselho que, como fabricante de motor e como equipe, trabalhamos muito duro por muito tempo para conseguir o sucesso que temos hoje. Portanto, tomamos essa decisão contrária a fornecer motores para a Red Bull. Gostaríamos de continuar com o nosso modelo de apoiar equipes privadas independentes, e respeitar os relacionamentos que já temos com os nossos clientes, junto do nosso foco principal na equipe oficial da Mercedes”.
 
Além disso, a Mercedes está observando de camarote a lavagem de roupa suja em público que a Red Bull está fazendo com a Renault. Mais do que a Ferrari, cujos carros são destinados a um público muito segmentado, a Mercedes está no mercado como a Renault, e não quer ver ninguém lhe fazendo acusações dia sim, dia não, por causa da qualidade de um produto adquirido ou do serviço prestado.
Sergio Marchionne sabe que está em vantagem na negociação com a Red Bull (Foto: Ferrari)
Além da Ferrari
 
Se a Red Bull ‘trucou’ para cima da Ferrari ao final da primeira mão, porém, não são os italianos que vão falar 'desce' — ou pedir seis. E olha que eles têm o 7 de Copas na mão. É a própria F1 quem vai ter de ponderar o risco.
 
No fundo, a Ferrari tem mais é a perder se aceitar a exigência da Red Bull. Agora, a F1 é que se vê em uma situação delicada, pois não pode se dar ao luxo de perder Red Bull e Toro Rosso no ano que vem e ter um grid de apenas 16 ou 18 carros. É o típico momento em que se espera que Bernie Ecclestone entre em cena para tentar intermediar o acordo.
 
Normalmente, Bernie resolve. Seja qual for a solução. Colaborando para costurar de vez o acordo com a Volkswagen/Audi para 2018 — e lidando com uma gravíssima situação legal que pode chegar a US$ 18 bilhões nos Estados Unidos —, com mudanças nas regras, negociações internas. Ele tem seus métodos.
 
Enquanto isso, a Red Bull tenta jogar com as cartas que tem. Se é blefe ou não, alguém tem que chamar a ‘trucada’ para descobrir.
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