Arrivabene entrega Ferrari em posição mais forte. Mas deixa legado de erros, derrotas e desentendimentos

A Ferrari confirmou nesta segunda-feira (7) o que já se falava há algum tempo: sai Maurizio Arrivabene e entra Mattia Binotto. O diretor-técnico agora vai comandar a equipe italiana, que sofre a quarta mudança de chefia desde o último título de Construtores, em 2008. E isso não é nada bom

As consequências da dura derrota para a Mercedes em 2018 e dos erros recorrentes pesaram sobre os ombros de Maurizio Arrivabene, demitido nesta segunda-feira (7). O italiano de 61 anos estava no comando da Ferrari desde 2015, quando assumiu o posto deixado por Marco Mattiacci. À época, a mais tradicional equipe do grid vivia uma crise. Não estava na luta por vitórias e nem pelo campeonato. Assim, uma reestruturação era mais do que necessária, especialmente porque a F1 já se deparava com o domínio acachapante da Mercedes, na nova era híbrida.

As mudanças vieram pelas mãos do então presidente Sergio Marchionne, mas coube a Arrivabene a responsabilidade de renovar o quadro de funcionários e dar novo fôlego ao time. Só que a opção por Maurizio gerou dúvidas e incertezas, porque não era exatamente alguém de dentro da equipe, um engenheiro ou um dirigente experiente. Era um profissional que por anos esteve ligado à escuderia, mas por meio de seu cargo de executivo de uma das principais apoiadoras de Maranello, a Marlboro. Ainda assim, Arrivabene recebeu carta branca para ajustar o que era urgente, sempre com o respaldo da cúpula e sob os olhos atentos de Marchionne.

 
A chegada de Maurizio coincidiu com a contratação de Sebastian Vettel e também da transição da estrutura técnica da equipe, que passava a ter uma organização horizontal e focada nos talentos da casa, embora ainda chefiada pelo inglês James Alisson – o engenheiro acabou deixando o grupo pouco tempo depois para se juntar à Mercedes. A verdade é que Arrivabene conseguiu tornar o pesado clima das garagens ferraristas em um ambiente menos estressante e mais descontraído, ao menos de início. Mais carismático que seu antecessor, ele deu uma nova cara com a promessa de reaproximar a Ferrari de seus fãs, além de recolocá-la na briga por triunfos e títulos. Deu certo até a página seis.
Sebastian Vettel e Maurizio Arrivabene chegaram juntos à Ferrari (Foto: Ferrari)

A primeira temporada sob seu comando viu três vitórias de Vettel. A primeira logo na segunda etapa do ano. O desempenho ganhou manchetes e deu tempo ao dirigente, especialmente porque a esquadra prateada seguia implacável. Foi necessário uma grande dose de paciência, mas os frutos apareceram, mesmo diante de decisões impopulares.

Em 2017, a Ferrari construiu um carro forte, veloz e que chegou a ameaçar a supremacia alemã. Com Seb à frente, foram cinco vitórias e o vice-campeonato. O trabalho continuou firme entre os vermelhos para o ano seguinte. Só que, enquanto isso, Arrivabene optava por uma política diferente. Isolou seus comandados, criou barreiras, tudo em nome da dedicação total à missão de tirar os ferraristas da fila de títulos. A manobra não foi bem vista e gerou críticas – muitas críticas. As cobranças, já grandes, se tornaram ainda maiores, e a pressão por resultados veio na mesma proporção. 

 
Aí veio 2018. Foi o primeiro ano em muito tempo que os vermelhos chegaram a ocupar o posto de favoritos. Por boa parte da temporada, a SF71H foi o melhor carro do grid, desbancando a poderosa Mercedes. A primeira fase do campeonato revelou um Vettel consistente e veloz, além de um Kimi Räikkönen menos alheio. Só que algo aconteceu: surgiram os erros, a afobação e o descontrole. De repente, os homens da Ferrari não conseguiam mais lidar com o favoritismo, e ter o carro mais rápido da F1 parecia ter um gosto agridoce. E o momento não poderia ser pior.
 
A morte inesperada e trágica do líder Marchionne teve ainda um enorme impacto na vida de Maranello, especialmente porque ocorreu em uma fase do campeonato em que a Ferrari dava pinta de que tinha nas mãos as ferramentas certas para vencer. O desaparecimento do homem forte da marca do Cavalinho Rampante também gerou uma crise interna. Arrivabene e Mattia Binotto, então diretor-técnico e principal responsável pelo ótimo carro ferrarista, já não pareciam mais estar na mesma página, e isso chegou à cúpula do time, bem como à agitada imprensa italiana. Foi quando a panela de pressão começou a apitar. 

Na pista, os erros seguiam, tanto de pilotagem quanto de operação e decisões estratégicas, assim como as discussões internas. O clima fechara de vez. Enquanto isso, os adversários se fortaleciam e tinham em um forte Lewis Hamilton uma arma poderosa. O favoritismo italiano rapidamente sumira e a derrota foi inevitável. O fracasso pesou porque os italianos, de fato, tinham nas mãos um carro verdadeiramente vencedor. “Foi difícil de engolir”, como admitiu Sebastian, certa vez. 

O chefão da Ferrari, Maurizio Arrivabene, o ex-presidente Sergio Marchionne e Mattia Binotto, diretor-técnico (Foto: Ferrari)

É difícil reproduzir e entender o que se passou na segunda fase da temporada dentro da Ferrari, mas os resultados refletem muito da atmosfera instável por lá. Segundo a mídia na Itália, Arrivabene e Binotto discordavam quanto aos aspectos técnicos, mas também de tática e operação. As críticas com relação à perda de rendimento do carro, feitas pelo dirigente, irritaram Mattia. Ainda que os rumores tenham sido veemente negados, a figura de Maurizio passou a sofrer um enorme desgaste nos meses derradeiros do ano. E os boatos sobre a demissão apenas se alargavam. 

A demissão de Arrivabene, portanto, não chega a ser uma surpresa. Mas o italiano entrega a Ferrari em uma posição muito mais forte do que quando assumiu o cargo. Isso é bem verdade. Hoje, a mais famosa equipe do grid segue como favorita e é encarada pela Mercedes como a principal rival. É capaz de vencer e possui uma organização técnica competente. Mas o legado de Maurizio não será lembrado por isso. Os equívocos da temporada 2018 sempre vão pesar mais em seu currículo e na avaliação de seu comando. 

 
O que será daqui para frente é uma incógnita. Pela quarta vez, desde 2008, ano da conquista do último Mundial de Construtores, o time troca de chefe de equipe. E isso não é bom, como a história mostra. A verdade é que a Ferrari ainda busca repetir a formação imbatível do fim dos anos 90 e início dos anos 2000. Só que o cenário não parece tão hostil. 
 
A esquadra tem agora uma oportunidade de recomeçar, mais uma vez, apostando no talento da casa. Vettel ainda tem de provar ser o grande líder que o time precisa, mas o talentosíssimo Charles Leclerc pode ser o elemento novo para o início de um necessário processo de renovação. É a chance de reunificar as tropas. E usar um pouco da receita da adversária. 
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