Conta-giro: Único piloto campeão da F1 com próprio carro, Brabham deixa “recorde que vai durar para sempre”

Jack Brabham entrou para história do automobilismo em 1966 ao provar que a persistência em seu próprio projeto valeu a pena ao vencer o Mundial de Pilotos com o carro que construiu. Diante da atual conjuntura do esporte, é uma marca que dificilmente será batida, acreditam os pilotos

Ser tricampeão da F1 não é o maior feito da carreira de Jack Brabham, que morreu no início da semana passada aos 88 anos. É apenas um feito que o deixa no mesmo patamar de outros grandes nomes do esporte, como Niki Lauda, Jackie Stewart ou Ayrton Senna. E abaixo de gente como Michael Schumacher, Juan Manuel Fangio, Alain Prost e Sebastian Vettel. Mas o que o australiano fez na temporada 1966, isso sim, é o que deve continuar diferenciando-lhe desses outros gênios das quatro rodas por muito tempo — talvez para sempre.

Depois de ser bicampeão da F1 com a Cooper em 1959 e 1960, Brabham continuou no time por mais um ano, mas sem repetir o mesmo sucesso. Marcou somente quatro pontos. Para o campeonato seguinte, fundou — acompanhado por Ron Tauranac na empreitada — sua própria equipe, então chamada de Brabham Racing Organisation.

Os primeiros anos foram difíceis, com vários problemas mecânicos complicando bastante a vida do então bicampeão. Quando o carro não falhava, os resultados também não eram os melhores. Em 1962, não foi ao pódio nenhuma vez. Só voltou a levantar um troféu na penúltima corrida de 1963 após chegar em segundo no GP do México. Levou para casa mais três taças entre 1964 e 1965 até enfim acertar a mão.

Jack firmou para 1966 uma parceria com a montadora australiana Repco. A intenção da marca era provar que os produtos do país-continente poderiam se destacar no mais alto nível do esporte — e escolher a Brabham para isso era a opção mais óbvia.

O câmbio quebrou em Mônaco, Jack foi quarto na Bélgica e finalmente venceu com o carro que construiu na passagem da F1 pela França. Ali, iniciou uma sequência de quatro triunfos que o deixou com a mão na taça. Comemorou o título antecipado no GP da Itália apesar de abandonar com um vazamento de óleo.

Jack Brabham foi piloto e dono de equipe no Mundial de F1 (Foto: Getty Images)

Desde então, outros pilotos se arriscaram a fundar equipes e defendê-las no Mundial de F1, como John Surtees, Graham Hill e Emerson e Wilson Fittipaldi — nenhum deles chegou perto de ter o mesmo sucesso. 

Nem outros terão. É no que acredita Sebastian Vettel. “Tive sorte o bastante para conhecê-lo pessoalmente há dois anos, no GP da Austrália. É um piloto que será lembrado por muitas coisas, especialmente por isso. É um recorde que vai durar para sempre”, afirmou o alemão da Red Bull em entrevista coletiva em Mônaco na última semana.

“Não vai haver um piloto no futuro para vencer com o próprio carro. Os tempos mudaram, mas essa foi uma conquista incrível”, continuou. “Espero que tenha aproveitado bem esses 88 anos”, completou.

Nos Estados Unidos, Michael Andretti tentou fazer na Indy o que Brabham fez na F1, mas não conseguiu — nem no campeonato, nem nas 500 Milhas de Indianápolis. E o norte-americano não tem dúvidas: Brabham estava alguns passos à frente do restante da sua geração.

“Jack é um ícone para o automobilismo em todo o mundo. Alguém que viu muito além de seu tempo. E que deixou exemplos a serem seguidos. Fez algo que ninguém conseguiu até hoje. Em muitos aspectos, sempre ficamos impressionados com o que ele conseguiu fazer em uma época bem mais complicada. Mais difícil”, disse ao GRANDE PRÊMIO  o dono da equipe vencedora da edição de 2014 das 500 Milhas.

“Além disso, era uma pessoa que todos amavam, era muito gentil e extremamente inteligente. Certamente, vamos sentir muito sua falta. E acho difícil ver alguém hoje fazer o que ele fez no passado”, mencionou.

“Quanto a mim, eu apenas tento construir uma boa equipe aqui. Trabalhamos muito e me sinto alguém de muita sorte por conseguir fazer o que eu faço, porque amo esse esporte. Talvez seja o maior ponto em comum com Jack”, acrescentou. Michael é chefe do neto de Jack, Matthew Brabham, na Indy Lights.

O finlandês Kimi Räikkönen, que já participou da montagem de equipes em categorias de base e no rali, aponta o aumento dos custos envolvidos com a participação no Mundial de F1 como principal barreira para que a marca estabelecida por Brabham seja igualada.

Räikkönen, que passou dois anos competindo no Mundial de Rali, lembra que no tempo de Brabham era possível se aventurar em outros lugares enquanto se está na F1 — o que raramente acontece hoje em dia.

“Atualmente é diferente porque naquele tempo eles costumavam correr em diferentes categorias, diferentes corridas. Seria muito legal se fosse possível tentar coisas diferentes e mais vezes. Mas o problema é que tudo é caro demais hoje em dia e, obviamente, as pessoas ficam com mais medo de que você se machuque que eles tentam controlar tudo o que você faz”, reclamou. “É uma pena, pois acho que seria muito mais divertido para todos, e os esportes também se beneficiariam disso. Seria legal”, opinou.

Neste mesmo sentido, Vettel lembrou de outro feito que pouco provavelmente será repetido: “John Surtees, campeão da F1 e do Mundial de Motovelocidade.” Valentino Rossi chegou a testar carros da Ferrari na última década e namorar com a possibilidade de mudar para os monopostos, mas desistiu. Ficou mesmo no meio das motos, e por lá agora tem uma equipe bem estruturada na Moto3.

Nico Rosberg, da Mercedes, piloto que tem grande interesse em engenharia, também não vê Brabham sendo igualado tão cedo. “É muito improvável que aconteça de novo, mas você nunca sabe. Mas, definitivamente, é um recorde que vai durar um bom tempo”, finalizou.

Brabham foi piloto de sua equipe até sair da F1 no final de 1970, mas já vendera suas ações para Tauranac um ano antes. O sócio logo caçou o rumo e passou a escuderia para as mãos de Bernie Ecclestone entre o final de 1971 e o início de 1972. Nas mãos do britânico, o time voltou a vencer o Mundial de Pilotos em 1981 e 1983 com o brasileiro Nelson Piquet ao volante. O nome Brabham permaneceu na F1 até 1992.

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