Exército recebe R$ 120 mi do governo para viabilizar pista de Deodoro

O autódromo de Deodoro é um projeto que, de acordo com promessas do presidente Jair Bolsonaro, vai correr sem uso de dinheiro público. Entretanto, reportagem da Agência Sportlight revela que mais de R$ 120 milhões foram destinados ao exército desde 2014 apenas para a liberação e limpeza do terreno reservado à pista

As obras do autódromo de Deodoro ainda nem começaram para valer, já que a licitação segue suspensa, mas o investimento do governo federal no projeto já supera a centena de milhão de reais. De acordo com valores divulgados pela Agência Sportlight, o exército brasileiro já recebeu valores na casa de R$ 121 milhões, valor corrigido, para liberar o uso do terreno para a construção do autódromo.
 
O pagamento do valor, precisamente de R$ 121.655.362,28, acontece através do Ministério do Esporte. Foram sete pagamentos distintos realizados desde maio de 2014. Estes tinham como objetivo único a liberação do terreno, antes utilizado pelo exército para treinamentos de tropas. Além do ressarcimento, o valor total inclui ainda por volta de R$ 12 milhões para o serviço de “detecção, varredura, limpeza e neutralização de artefatos de natureza militar” – este último particularmente importante, já que explosivos abandonados no local impossibilitavam o uso do terreno para a construção de um autódromo.
 
O alto investimento entra em contradição com a promessa do governo federal de que a construção do autódromo de Deodoro, assim como a realização de um GP do Brasil no Rio de Janeiro, aconteceria apenas através da iniciativa privada. Ou seja, sem investimento de dinheiro público. Por mais que os pagamentos antecedam o atual governo de Jair Bolsonaro, datando desde a gestão Dilma Rousseff, os pagamentos milionários já jogam tal proposta pelo ralo.
 
A revelação vem poucos dias após a MotoGP se comprometer com uma corrida em Deodoro a partir de 2022, apesar das incertezas que rondam a realização do projeto. A própria Fórmula 1 chegou a flertar com o Rio de Janeiro, mas se aproxima novamente de uma renovação com São Paulo e Interlagos.

 

Leia a reportagem completa na Agência Sportlight.
Projeto de autódromo no Rio de Janeiro (Foto: Divulgação/Rio Motorsports)

Na semana passada, a Justiça Federal do Rio de Janeiro suspendeu o processo de licitação do autódromo de Deodoro, promessa do presidente Jair Bolsonaro e do governador do RJ, Wilson Witzel, sob a justificativa de receber a Fórmula 1 a partir de 2021. A razão foi a falta de aprovação do estudo prévio de impacto ambiental no local.

O juiz Adriano de Oliveira França, da 10ª Vara Federal, responsável pela decisão, justificou a suspensão à falta de aprovação do estudo prévio de impacto ambiental na área imaginada para a construção da pista.
 
No dia 20 de maio, há quase dois meses, uma empresa chamada Rio Motorsports venceu o processo de licitação – sendo a única concorrente. 
Área destinada à construção do autódromo de Deodoro, no Rio de Janeiro (Foto: Divulgação)

Linha do tempo: como começou a história de levar a F1 para o Rio de Janeiro

Tudo começou no início do mês de maio, quando o presidente Jair Bolsonaro anunciou a assinatura de um termo de compromisso para levar a Fórmula 1 de São Paulo para o Rio de Janeiro, em um autódromo a ser construído na região de Deodoro. Na época, o mandatário assegurou que a etapa brasileira do Mundial já seria disputada na capital fluminense em 2020 – ignorando completamente o acordo vigente com Interlagos, que se encerra no ano que vem. Mais tarde, já no mês passado, o mesmo presidente, após encontro com o chefe da F1, Chase Carey, anunciou, novamente por conta própria, que a corrida será em 2021. Na sequência de sua fala, o dirigente americano não confirmou a informação.

Esse é apenas o episódio que abre a série que tenta mudar o palco do GP do Brasil no país. Um outro capítulo, ainda cercado de incertezas, tem a ver com o local, uma vez que não há um circuito capaz de receber a maior das categorias do esporte a motor no Rio


Desde a declaração de Bolsonaro, os trâmites para dar vida ao projeto foram acelerados. Apenas 13 dias depois do primeiro pronunciamento do presidente, a Prefeitura carioca confirmou que o consórcio Rio Motorsports havia vencido a licitação para a execução das obras da nova pista. O grupo, aliás, foi o único interessado na concorrência. 

A publicação no Diário Oficial do Rio de Janeiro, entretanto, veio confusa e sem qualquer explicação sobre como o projeto será financiado. Além disso, deu-se somente um dia depois de o Ministério Público Federal pedir que o processo licitatório fosse adiado devido à ausência de um estudo de impacto ambiental na região de Deodoro

A empresa

O Rio Motorsports tem à frente uma empresa homônima sediada na cidade de Dover, no estado americano do Delaware, cuja reputação é de um estado com amplo sigilo sobre a operação de empresas. José Antonio Soares Pereira Júnior, conhecido como JR Pereira, é quem está na linha de frente e é o presidente do grupo. Um outro componente é Luiz Fernando Mendes de Almeida Junior. Que, segundo revelação do Panama Papers — conjunto de documentos que revelou milhares de companhias em paraísos fiscais —, teve uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, a Kennedia Management. A empresa foi aberta no começo de 2014 e encerrada antes do fim de 2015.

O nome de JR Pereira também aparece em uma dívida milionária com a União, mas por outra empresa. Segundo informações da Folha de S.Paulo, Pereira foi responsável por uma companhia chamada Crown Telecon, que faliu e deve quase R$ 24.7 milhões à União. José Antonio fez carreira nos EUA na área de segurança e defesa. Foi assim que fez contato com as Forças Armadas/militares brasileiros e chegou em Bolsonaro.

Só que o nome do empresário está também ligado à Crown Assessoria e Consultoria Empresarial S.A, em que é sócio, segundo informações do portal G1. De acordo com a matéria publicada pelo G1, essa foi a empresa que prestou consultoria e ajudou a elaborar os estudos que deram origem ao edital de licitação para a construção do autódromo de Deodoro – licitação ganha pelo consórcio presidido por JR Pereira.

Assim, estão claramente feridos os princípios de impessoalidade, moralidade e igualdade previstos no artigo 3º da Lei das Licitações, já que JR Pereira já sabia de antemão, via Crown, como seria a licitação para sua outra empresa, a Rio Motorsports.

A defesa dos envolvidos

A Prefeitura do Rio de Janeiro negou irregularidades no processo. Garantiu que a licitação foi baseada em um procedimento de interesse (PMI) e que, neste caso, é permitido que a empresa que fez o estudo que fundamenta o edital possa participar da concorrência. O Rio Motorsports também negou qualquer ato ilegal. Ambos ainda afirmaram que o capital social no valor de 10% só precisaria ser comprovado no momento da assinatura do contrato, mas que isso ainda não aconteceu.
O autódromo de Deodoro no Rio de Janeiro (Foto: Divulgação)

Outro capítulo 

O processo de licitação vencido pelo Rio Motorsports também chamou a atenção do Ministério Público do Rio de Janeiro, que apura se houve um procedimento irregular. De acordo com reportagem de O Estado de S.Paulo do último sábado, o MP-RJ investiga um possível direcionamento para uma empresa específica na concorrência pela construção do autódromo.
 
Em documento ao qual o Estadão obteve acesso, o Ministério Público Federal indicou que o edital de concorrência foi alterado, de modo que a versão final “demonstra que a licitação é direcionada para empresa específica”. O órgão já pediu à Justiça Federal do Rio a suspensão da contratação e enviou Ação Civil ao Ministério Público Estadual.

Segundo o Ministério Público Federal, a primeira minuta do edital lançado pela Prefeitura do Rio de Janeiro previa que a equipe a ser contratada para a elaboração dos projetos da obra de construção do autódromo deveria possuir, entre outros itens, experiência na elaboração do Estudo de Impacto Ambiental.

A Prefeitura do Rio de Janeiro também respondeu a reportagem do Estadão e argumentou que o processo licitatório foi realizado de acordo com o previsto no edital. "O edital resultou de uma PMI (Procedimento de Manifestação de Interesse) lançada em 2017, com audiência pública em 23/11/18 e foi analisado durante aproximadamente cinco meses pelo Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro (TCM)”, informou a Prefeitura em nota. O órgão também afirmou que “a Comissão de Licitação adotou integralmente todas as orientações sugeridas pelo TCM".
 
O Rio Motorsports, também procurado, se defendeu e argumentou que não foi notificado pelo Ministério Público Federal para prestar esclarecimentos a respeito do processo de licitação.

Como citado acima, nesta reportagem, o processo de licitação está suspenso.

 

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