Guia F1 2015: Ferrari muda por completo e vai em rumo certo para voltar a ser forte

Com novas caras, um modus operandi diferente e um carro que aparenta ser bem melhor que o do ano passado, a Ferrari começa 2015 pensando em se reerguer para, no futuro, voltar a brigar por títulos

A FERRARI QUE COMEÇA A TEMPORADA 2015, neste fim de semana, na Austrália, está longe de ser aquela que terminou o ano passado. As mudanças após o primeiro campeonato sem vitórias em 21 anos foram muitas, dos pilotos ao presidente, todas com um objetivo: dar à escuderia de Maranello um novo rumo.
 
Seis anos já se passaram desde que um título foi comemorado pela última vez. Desde então, nem mesmo os maiores esforços de Fernando Alonso foram capazes de transformar em campeões carros que eram inferiores aos da concorrência.
 
Tal jejum gerou um desgaste que inevitavelmente conduziu a um movimento de mudança geral que tem como objetivo dar um novo fôlego ao time. Trata-se de uma Ferrari mais humilde, uma equipe que, com os pés no chão, dá início a um ciclo em 2015. Os resultados são esperados a longo prazo.
 
“Humildade” foi a palavra escolhida pelo novo presidente Sergio Marchionne para definir o modo como a Ferrari precisa se comportar hoje. A equipe não é mais a toda-poderosa da F1. No último campeonato, Mercedes, Red Bull e Ferrari se saíram muito melhor. E dá até para enquadrar dentro desta modéstia a meta estabelecida pelo novo diretor esportivo, Maurizio Arrivabene, de vencer duas corridas em 2015.
 
“É uma meta mais ambiciosa do que realista”, admite Arrivabene.
 
E desde quando a Ferrari foi equipe de se contentar com duas vitórias?
Kimi Raikkonen (Foto: Xavi Bonilla/Grande Prêmio)

A melhora na pista
 
Indícios: é isso que a pré-temporada apresenta. Muitas perguntas que só começarão respondidas com os carros na pista a partir dos treinos livres no Albert Park ficam no ar. Uma das que gera a maior ansiedade no ambiente da F1 é: a Ferrari melhorou mesmo?
 
Os indícios são de que sim.
 
Desde que os novos carros estrearam nos testes em Jerez, a impressão geral é de que a Ferrari deu um salto de qualidade. Em todos os quatro dias na Andaluzia, apenas bólidos com motores italianos ocuparam as duas primeiras posições. Duas semanas mais tarde, a F1 foi a Barcelona, e lá foi mantida a boa impressão. Não pelos tempos, mas pelo trabalho que foi sendo realizado. Espera-se que Sebastian Vettel e Kimi Räikkönen possam brigar com maior frequência contra a Williams e a Red Bull por pódios.
 
Para fazer o vice-campeão mundial Nico Rosberg dizer que está “de olhos bem abertos”, a Ferrari fez progressos importantes tanto com o motor quanto com o chassi.

Sebastian Vettel (Foto: Xavi Bonilla/Grande Prêmio)

Contratado junto à Lotus no fim de 2013, o diretor técnico James Allison participou da concepção da F14T, mas a primeira Ferrari cujo desenvolvimento foi inteiramente coordenado por ele é a SF15-T. Um modelo que já foi capaz de deixar Räikkönen bem mais contente.
 
No retorno a Maranello em 2014, o finlandês sofreu muito, especialmente com a parte dianteira do carro. Neste ano, já no primeiro dia de testes dizia estar livre destas dificuldades: “O equipamento é um tanto melhor do que terminamos o ano passado”.
 
Allison teve a incumbência de reorganizar as peças do time técnico, contando com o aval de Arrivabene. O ex-diretor de engenharia Pat Fry e o ex-designer-chefe Nikolas Tombazis foram demitidos. Simone Resta foi promovido ao lugar do grego. Ainda no meio do ano passado, Luca Marmorini também havia deixado o departamento de motores, assumido por Mattia Binotto.
 
“James estava trabalhando para escolher as pessoas corretas e colocá-las nas posições corretas. Era o primeiro passo. O segundo passo: sim, eu dei a minha contribuição, mesmo antes de eu ser oficialmente empregado pela Ferrari. Já estava bem claro. Eu discuti com o Marchionne por um bom tempo e finalmente decidimos depositar nossa confiança em algumas pessoas”, relata Arrivabene.
 
Mas o principal parece ser a evolução do motor. Um passo importante, visto que as unidades de força V6 turbo da montadora italiana foram as que somaram o menor número de pontos no ano passado.
 
Na pré-temporada deste ano, os propulsores da Ferrari percorreram um total de 11.132 km, uma média de 5.566 km por equipe — a maior entre as quatro montadoras.
 
“Estou escutando os pilotos, e eles disseram que podem sentir uma melhora”, diz Arrivabene. “É honesto dizer que os outros times não estão dormindo, é claro. Precisamos medir a melhora real na Austrália. Aqui todos fazem testes, vão em configurações diferentes, combustível. Dá para ter uma ideia, mas é diferente. Na Austrália, você precisa ser sério.”
 
“Eu não estava aqui no ano passado, mas sinto que o carro é muito melhor do que o anterior”, confirma Vettel.

Sergio Marchionne ainda teve tempo de falar com Vettel (Foto: Ferrari)

A melhora fora da pista
 
“A atmosfera é muito boa na equipe. Muitas mudanças foram feitas, mas pelas razões corretas. Esperançosamente vamos poder ter um bom ano. Mas agora temos que trabalhar duro. Está sendo ótimo como todos estão animados e como as pessoas estão trabalhando juntas.”
 
A declaração de Räikkönen é representativa. Dá para simplificar dizendo que a Ferrari é um time outra vez.
 
Alonso sempre foi conhecido por ser centralizador e fazer a equipe trabalhar para si. Isso por si só já gera certo desequilíbrio dentro da garagem. Acontece que a relação do espanhol com o time se deteriorou demais nos últimos 18 meses de sua passagem por Maranello. Complicando ainda mais o quadro, a Ferrari teve em Marco Mattiacci um chefe ranzinza, que caiu de paraquedas na F1 depois da renúncia de Stefano Domenicali e não soube administrar bem os ânimos.
 
Arrivabene já mostrou ser diferente. O ex-dirigente da Philip Morris se encaixa bem no estereótipo que se tem dos italianos: gosta de falar, dá entrevistas animadas, faz graça. Tem algumas visões diferentes a respeito da F1 e está se esforçando para apresentá-las. Quis provocar a categoria ao lançar um conceito ousado de carro e fez um protesto contra a redução no número de credenciais para o paddock entregues às equipes indo às arquibancadas do Circuito da Catalunha para ver os testes em meio à torcida.
 
Faz piada até com o próprio nome e pede para ser chamado de Maurizio. Arrivabene — “chega bem” na tradução para o português — vai dar azar. “Talvez no futuro”, brinca.
 
E, neste bom humor, ele tenta puxar a equipe consigo. Conta que os engenheiros ouviam o som dos motores em vez de “Toca o sino” na semana do Natal e que até Räikkönen fala sem parar nos bastidores. “Os caras estão cheios de paixão e totalmente concentrados no trabalho que estão fazendo, e estou bem satisfeito com o resultado."
 
Piloto da Ferrari por oito temporadas, Felipe Massa conviveu com Arrivabene em Maranello e dá sua opinião a respeito da mudança. “Ele é muito trabalhador e é um chefe. Sempre foi na área dele”, afirma. “Agora é uma área diferente, um trabalho diferente. A gente tem que entender exatamente como vai ser. Não será um trabalho fácil, sem dúvida. Você tem que trabalho e empurrar as pessoas no caminho certo.”

Maurizio Arrivabene (Foto: Xavi Bonilla/Grande Prêmio)

O herdeiro alemão
 
Räikkönen é um campeão mundial — o último campeão mundial pela Ferrari — e deve ser respeitado. Mas é impossível que o centro das atenções deixe de ser o tetracampeão Sebastian Vettel.
 
Não tem como olhar para Vettel com o uniforme vermelho sem se lembrar de Michael Schumacher. Ainda mais quando, nos dois primeiros dias de testes com a equipe, ele termina na primeira colocação. Foram resultados simbólicos em Jerez.
 
E é justo dizer que uma boa parcela do alto astral que há na Ferrari é por causa da motivação que ele dá ao time, tanto pelo seu currículo quanto pelo seu modo de trabalhar. Vettel já se sente em casa.
 
“Há muitas surpresas positivas”, diz o animado Vettel sobre a chegada à Ferrari. “A maior, eu acho que é a paixão pela marca. As pessoas têm muita paixão. Pela F1 e também pelo GT, onde os carros de rua são construídos.”
 
Ele se enquadra no grupo de apaixonados, uma faceta que manteve escondida por muitos anos enquanto esteve ligado à Red Bull. Era necessário: se as especulações a respeito de uma mudança para a Ferrari já eram grandes com ele negando, imagine se ele fizesse juras de amor à marca fundada por Enzo Ferrari.
 
A primeira vez que Vettel foi ligado à escuderia italiana foi em março de 2008, quando ele estava apenas iniciando sua primeira temporada completa no Mundial.
 
“Para ser honesto, sonhava em correr pela Ferrari muito antes de 2008. Ainda estava nos karts e a F1 estava muito distante, bem como a Ferrari. Realmente é algo especial”, confessou Vettel ao ser perguntado pelo GRANDE PRÊMIO. “Obviamente, quando você está no paddock, digamos, você conhece as pessoas e conversa sobre muitas coisas, entre elas o seu futuro. E eu acho que é natural manter seus olhos e orelhas abertas e usar o relacionamento para checar suas opções. Foi o que eu fiz no fim do ano passado. Acho que senti que era a hora certa para uma mudança.”

Sebastian Vettel (Foto: Xavi Bonilla/Grande Prêmio)

Arrivabene garante que vê em Sebastian um piloto bastante feliz. “Ele me disse várias vezes que a Ferrari sempre foi seu sonho, desde a infância. Eu o vi muito feliz, muito interessado em construir toda a infraestrutura, as pessoas. Isso é muito legal. Ele estava indo a todos os departamentos, tirando fotos, cumprimentando as pessoas. Também está se tornando cliente da Ferrari, disse que finalmente pode comprar uma!”
 
“Seb é super profissional, e às vezes eu fico impressionado porque, quando o vejo trabalhando, vejo outro alemão”, acrescenta. “Fiquei impressionado com sua capacidade de concentração e com como ele trabalha com os detalhes no carro.”
 
É muito cedo para saber se a Ferrari realmente vai retomar o caminho do sucesso. Dá para ter a certeza, no entanto, de que os primeiros passos estão sendo dados da maneira correta. Agora é trabalhar para continuar caminhando em frente.

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