Opinião GP: F1 2020 se resume a Verstappen e ‘pneudependência’ por ‘culpa’ da Mercedes

Em qualquer cenário, já seria difícil encarar a Mercedes em 2020, mas o que se vê na atual temporada vai muito além: com uma Ferrari capenga e uma Racing Point deixando a desejar, o campeonato surge perigosamente limitado

APESAR DA PALAVRA CULPA aparecer na manchete, não se pode colocar nas costas da Mercedes os problemas que a Fórmula 1 enfrenta em 2020. A esquadra alemã é o que o campeonato tem de melhor em muitos aspectos, é o que traduz a alma desta que é a maior categoria do automobilismo e que revolucionou o esporte ao longo de uma história de 70 anos de tecnologia, inovação e velocidade. O que a equipe chefiada por Toto Wolff faz é mais do que escrever capítulos vitoriosos, é construir um legado. E Lewis Hamilton é a personificação maior dessa competência. Só que o cenário mais amplo do Mundial não condiz com excelência e flerta com um perigoso caminho que começa justamente com a Mercedes.

Foi notável ver como, mais uma vez, o time da estrela de três pontas reagiu rápido à uma derrota. Isso já aconteceu antes, é bem verdade, mas nunca deixa de causar espanto a forma como esse grupo volta ainda mais forte. Há sete dias, a Mercedes havia tomado um drible inesperado de uma inteligente e talentosa combinação chamada Max Verstappen-Red Bull, que soube identificar as fraquezas do W11 e tirar proveito delas, sendo que os pneus dividiram o protagonismo. Os alemães até aceitaram o revés, mas prometeram o revide.

No forno de Barcelona, a equipe deu o troco. É possível colocar na balança que os pneus eram outros e que a pista tinha características bem diferentes, mas o calor e Verstappen ainda estavam lá. Só que os hexacampeões aprenderam a lição direitinho, e Hamilton soube como cuidar bem da borracha durante as 66 voltas do GP da Espanha. Nada lhe tiraria a vitória deste domingo. Entretanto, a presença de Max ali na segunda colocação, superando de novo um dos carros pretos, tem enorme significado. E não somente pela comprovada habilidade do holandês, mas, principalmente, porque ele é o único com capacidade de encarar Hamilton. Ainda, além do desempenho do piloto da Red Bull, há um outro fator importante: os pneus, que, novamente, tiveram um papel decisivo. Não é de hoje que aconteceu, mas, em 2020, tem sido fundamental também.

Apesar do calorão, reconhecidamente um ponto fraco dos carros pretos, o conjunto de compostos mais duros levados ao circuito da Catalunha compensou as dificuldades que a equipe de Stuttgart enfrenta nessas condições. É claro que a perícia de Hamilton também precisa ser levada em conta, uma vez que o colega Valtteri Bottas não apresentou o mesmo nível de performance. Já Verstappen tentou tirar o máximo de uma gama que não é a melhor para o RB16.

A Pirelli, a fornecedora única de pneus, foi apontada muitas vezes como a principal responsável pela monotonia das corridas, devido aos compostos mais duráveis, o que tirava a expectativa de diferentes estratégias. Também já sofreu críticas por entregar pneus que se desgastavam rapidamente. Isso tudo, porém, acontece com certa injustiça, uma vez que a fabricante apenas reproduziu aquilo que lhe foi pedido. Hoje, há uma sensação geral de satisfação com o desempenho da borracha, mas algumas combinações de compostos acabam tendo um efeito mais contundente que outras – sorte, talvez? Se for, é temerário que a F1 dependa também dela.

A emblemática cena de Hamilton cruzando a linha de chegada com um pneu em frangalhos (Foto: AFP)

O caso de Silverstone foi isolado, uma vez que também foi a primeira vez que o Mundial correu de forma seguida em um mesmo circuito. A opção por alterar os compostos para a segunda corrida foi acertada, mas precisou ser tomada como maneira de jogar um tempero a mais na disputa e acabou dando certo, mas só porque os carros pretos tiveram um surpreendente desgaste excessivo.  

Há uma nova tentativa. Para o GP da Bélgica, o próximo do calendário, há uma mudança em relação a 2019. A Pirelli vai levar pneus mais macios, semelhantes aos que transformaram o GP dos 70 Anos. E aqui também é necessário outro questionamento: até que ponto seleções distintas podem ser vistas como normais ou são apenas soluções artificiais para melhorar o espetáculo?  O fato é que os compostos têm grande peso nos resultados. Para o bem e para o mal.

Verstappen venceu na ousadia e inteligência, mas contou com os problemas da Mercedes (Foto: AFP)

Ainda, como dito antes, não se pode culpar a Mercedes pela incompetência dos adversários, mas a excelência da equipe é tal que serve para dimensionar bem o abismo técnico que há para os demais times. Talvez 2020 assuste porque a temporada passada, embora tenha testemunhado certo domínio dos alemães, foi recheada de boas corridas e brigas reais, envolvendo ora a Red Bull, ora a Ferrari, ora ambas. Agora, no entanto, só a primeira foi capaz de manter sua posição de destaque. A escuderia italiana, por outro lado, naufraga em uma crise que não parece ter fim. Além de ter nas garagens um carro mal nascido e inguiável, tem também um grupo técnico desordenado e um piloto de saída, sem saída. Já a novidade do ano, a Racing Point, também conhecida como ‘Mercedes rosa’, ainda disse a que veio. McLaren e Renault seguem como protagonistas do pelotão intermediário. Diante disso, sobra mesmo só o carro #33. E a F1 deve muito ao dono dele também.

O holandês de 22 anos impediu que a Mercedes vencesse todas as corridas da temporada e é uma dorzinha de cabeça, sim, para os hexacampeões, especialmente porque aparece ali na vice-liderança do Mundial, esbanjando uma performance genuína. A distância ainda seria menor se Max não tivesse abandonado na Áustria ou vencido o GP da Inglaterra. De qualquer jeito, o rapaz tem sido exemplar.

Só que parece claro que apenas dois elementos são capazes, neste momento, de trazer alguma imprevisibilidade à Fórmula 1: Verstappen e os compostos menos e mais macios. E isso é muito grave.

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