Opinião GP: GP do Catar expõe face da FIA que é a cara de seu autoritário presidente

A Fórmula 1 vive sob o comando de um novo diretor de prova. O português Rui Marques assumiu o posto depois da saída surpresa de Niels Wittich em meados do mês de novembro. E o GP do Catar deste domingo deixou evidente que a abordagem agora será mais rígida e imprevisível. O que já provocou questionamentos no paddock. Mas há algo que parece ainda latente: as mudanças promovidas pela FIA refletem, na verdade, o pensamento dominador de seu presidente. E esse é um sinal de alerta que o Mundial não pode ignorar

BASTOU UM ESPELHO retrovisor para desencadear uma série de situações que deixa evidente que a Fórmula 1 vive agora sob uma nova (mais uma) abordagem. Ainda mais inflexível e irritantemente imprevisível. Os acontecimentos do GP do Catar não só apresentaram uma face atrapalhada e confusa, mas também revelaram como o comando da sala de controle de prova ganhou a assinatura autoritária do presidente da Federação Internacional de Automobilismo (FIA). O fato é que há algo que não se encaixa, e o Mundial não pode simplesmente ignorar.

Porque o fim de semana catari, sob a direção novamente de Rui Marques, abriu diversos precedentes. A decisão de punir Max Verstappen com a perda de uma posição no grid, após o neerlandês ter sido considerado culpado de bloquear o rival George Russell na classificação de sábado, gerou espanto, especialmente pela maneira como foi tratada, quase que aleatoriamente, em critério novo. Então, na corrida de domingo, um surpreendente festival de punições de todo o tipo: sanções de 10s, que antes eram compreendidas de forma diferente, drive-through e até mesmo um stop-and -go — bastante incomum. Mas o que chamou muita atenção mesmo foi a demora em agir em situações críticas.

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A peça da Williams de Alex Albon, que se desprendeu do carro na metade da prova, ficou em plena reta dos boxes por 4 voltas, com a TV mostrando insistentemente. Mas a direção só tomou alguma atitude depois que Valtteri Bottas atropelou o elemento e espalhou os detritos, causado furos de pneus nos carros de Carlos Sainz e Lewis Hamilton. E não foi de forma imediata. Esperou-se ainda para acionar o safety-car. E isso aí mudou a história da corrida.

Outro fato que saltou aos olhos foi a punição de 10s com ida de Lando Norris aos boxes, por não desacelerar em bandeira amarela. A McLaren achou desproporcional e, mesmo que haja casos semelhantes no passado, é incomum. De toda a forma, as ações foram inconsistentes e já serviram de munição para as equipes. A Mercedes também avaliou o caso com preocupação e definiu as decisões como brutais.

O problema aqui é uma mudança de postura abrupta e nebulosa, porque nunca se entende a razão e nem os parâmetros, que por muitas vezes sequer são ações previstas no regulamento.

Não é segredo algum que há um ruído cada vez maior entre a Fórmula 1 e a FIA, na figura do atual mandatário Mohammed Ben Sulayem. Existe ali uma disputa de poder e atenção. Desde que assumiu o cargo, o dirigente coleciona polêmicas e posturas controversas. Até por isso, a entidade, vira e mexe, disputa as manchetes com as conquistas de pilotos e equipes. Agora, são dois pontos que a colocam novamente no olho do furacão. E que, certamente, devem reverberar em pista, como em outros momentos.

O primeiro deles é a lista de demissões da federação, que atinge especialmente o alto escalão em 2024. A última foi a do diretor de provas, Niels Wittich. O alemão assumira o cargo em 2022, dividindo a função com Eduardo Freitas, na esteira da tempestuosa decisão do título da F1 do ano anterior. Mas Freitas não durou muito e, em meados daquele mesmo ano, deixou o posto de forma solo para Wittich, que agora deu lugar ao português Marques. Que passou, inclusive, a acumular o trabalho na F1 com a Fórmula 2. Uma insanidade, que provou ser verdade neste fim de semana,.

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Mohammed Ben Sulayem é favorável À entrada da Andretti na F1
Mohammed Ben Sulayem vive uma gestão turbulenta (Foto: Reprodução/FIA)

Sobre Wittich, a história parece complexa e abre margem para discussão sobre o que acontece na entidade. Porque no dia em que comunicou a saída do diretor, a nota da FIA dizia que ele havia deixado o cargo para “seguir outras oportunidades”. No entanto, o alemão informou à imprensa de seu país que não pediu demissão. E de fato, é muito raro uma troca de comando neste ponto da temporada.

E só para se ter uma ideia do desmantelamento dos últimos meses na FIA: além de Niels, Tim Mayer foi dispensado do posto de comissário-chefe da Fórmula 1 na semana que passou. Filho de Teddy Mayer, cofundador da McLaren, era um dos principais comissários da FIA, além de atuar como delegado da federação nos Estados Unidos. Paolo Bassari, então diretor de compliance da entidade, também deixou o cargo em novembro. Steve Nielsen (ex-diretor-esportivo), Tim Gross (ex-diretor-técnico), Pierre Ketterer e Edward Floydd (ex-membros da área jurídica) são outros exemplos de baixas sofridas recentemente.

Ainda não está claro a razão para todas as saídas e o qual, de fato, é o plano da FIA. Mas fala-se em desentendimentos envolvendo o presidente da federação e insatisfação.

Mas há um outro elemento que tem fomentado a crescente tensão no paddock, e isso, sim, flerta com o perigo. Os pilotos da Fórmula 1 têm questionado cada vez mais as ações da FIA. Russell, presidente da Associação dos competidores (GPDA), pediu por transparência com relação às mudanças na direção de prova e de outros setores. Mas foi uma carta enviada à entidade que colocou fogo nessa relação.

Os astros do grid pediram para serem tratados como adultos — foi uma resposta às punições a Verstappen e Charles Leclerc sobre uso de palavrões — e que o presidente também tivesse cuidado com o “tom e a linguagem” para abordar o assunto, depois de críticas de Lewis Hamilton, que apontou elementos raciais e falas estereotipadas”. Além disso, o documento trouxe uma cobrança sobre o destino das multas que são aplicadas — esse tópico já havia sido motivo de polêmica, quando a federação decidiu aumentar os valores significativamente neste ano.

A posição dos pilotos irritou o mandatário. Que decidiu rebater e criar um novo conflito. E é aqui que se dá o sinal de alerta. Em entrevista à revista Autosport, Ben Sulayem disparou contra os competidores e afirmou que não deve nada a pessoas que estejam fora da federação. A postura autoritária e arrogante contradiz o que se espera da entidade que rege o esporte. Porque, sim, a FIA lida com a vida de milhares de pessoas envolvidas não só com a Fórmula 1 e tem o dever de zelar por isso. É de responsabilidade direta do órgão máximo as ações dentro da direção de prova e de outros setores das mais diversas categorias chanceladas ao redor do mundo. Portanto, não há espaço para vaidade ou qualquer vendeta.

E é preciso tratar o cargo que ocupa com seriedade e respeito, não como um negócio do qual se é dono.

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