Há um ano, Sebastian Vettel chegava a Hockenheim líder da
Fórmula 1 e favorito à vitória diante de sua torcida caseira – e caseira mesmo, já que Seb nasceu e cresceu há poucos quilômetros da histórica pista da Floresta Negra. Apenas oito pontos o separavam do segundo colocado e maior rival, Lewis Hamilton. A verdade
é que os dois então tetracampeões protagonizavam uma dura briga pelo campeonato, se revezando na parte de cima da tabela, ponto a ponto. Qualquer pequeno erro poderia por tudo a perder. Enquanto Hamilton era o campeão vigente e vinha trabalhando para ampliar seus recordes, Vettel seguia na ingrata missão de tirar a Ferrari da seca de conquistas. Finalmente, os italianos foram capazes de construir um carro competitivo e veloz o bastante para desafiar a poderosa Mercedes. Existia a clara impressão de que a equipe vermelha estava diante de uma grande chance para encerrar o malfadado jejum. Só que a
escuderia vivia também sob enorme pressão e andava angustiada pela falta de comando máximo – o presidente Sergio Marchionne estava muito doente e sua condição inspirava extremo cuidado.
O dirigente morreria dias depois.
Foi nesse cenário que Vettel conquistou a pole-position em casa. Hamilton enfrentou problemas na classificação e ficou apenas com o 14º lugar do grid. No dia seguinte, Sebastian largou diante de arquibancadas cheias e vibrantes. Era impossível não acreditar no triunfo, dado o excelente início de corrida. Mas aí uma marota chuva se aproximou do circuito, umedecendo trechos diferentes do traçado. Apesar da larga vantagem, o #5 se viu pressionado pela bela recuperação do adversário inglês e dos tempos mais rápidos, mesmo com pneus piores. Aí que, na volta 52, o ferrarista pisou no freio tarde demais, já com o asfalto molhado e pneus slicks, perdeu aderência na parte traseira e saiu reto na brita. Preso na área de escape, Vettel esmurrou o volante da pobre SF71H, gritou e xingou. Deixou o carro afundado na placa de publicidade. A contrariedade veio nos chutes em falso que deu, já exausto de tudo. Não havia mais nada que pudesse fazer.
Sebastian Vettel vem tentando se livrar dos erros (Foto: AFP)
Na pista, Hamilton decidira, com a ajuda da Mercedes, que não pararia novamente e seguiu com os pneus ultramacios – em uma manobra controversa, já que o piloto estava entrando nos boxes quando o engenheiro pediu para que permanecesse na pista. O episódio chegou a ser investigado, mas nada mudou o resultado da prova. Ao mesmo tempo, os concorrentes Valtteri Bottas e Kimi Räikkönen aproveitaram o safety-car, por conta da chuva e do acidente de Vettel, para mudar de pneus. Dessa forma, a liderança caiu nas mãos do #44, que não a largou mais.
O ferrarista ainda seria derrotado na Hungria depois da etapa alemã. Após a providencial pausa do verão europeu, veio o triunfo na Bélgica e pareceu que tudo voltaria ao normal. Mas não: o piloto perdeu a pole em Monza e, na corrida, se meteu em um roda a roda desesperado com Hamilton e levou a pior logo na primeira volta. Três etapas mais tarde, no Japão, se jogou em uma briga bisonha com Max Verstappen, rodou de novo e perdeu mais uma chance. Na prova seguinte, em Austin, se enroscou com Daniel Ricciardo e, praticamente, deu adeus à disputa com Hamilton, que se aproveitou de todos, absolutamente todos, os incidentes do rival.
Sebastian precisou amargar a derrota, sabendo que grande parte dela se deveu aos próprios erros. Aí veio 2019 e uma nova chance. Depois de uma pré-temporada muito forte, a Ferrari começou o ano envolta em problemas de pneus e de estratégia,
além de ter de lidar com um insolente Charles Leclerc. Mas já na segunda prova, no Bahrein, Vettel reeditou o incidente da Itália e rodou depois de uma disputa com Hamilton, abrindo mão da vitória. A primeira luz amarela acendeu neste ponto.
Lewis Hamilton e Sebastian Vettel (Foto: Mercedes)
Aí a equipe italiana viveu corridas para esquecer, marcadas por falta de desempenho, confusão com ordens de equipe e mais erros. Até que chegou o GP do Canadá e uma oportunidade se abriu. Seb largou da pole e vinha liderando com um Hamilton sem dar refresco. E de novo sob pressão, o #5 sucumbiu. Errou uma freada, passou reto entre as curvas 3 e 4, espremeu o rival no retorno ao traçado e tomou 5s de punição. Pode-se até questionar a decisão dos comissários, mas nada muda o fato de que Vettel errou enquanto era perseguido por Lewis.
A essa altura, a disputa do título já era, tal domínio do inglês e da Mercedes frente a uma Ferrari desorganizada e confusa. Mas havia mais por vir. No GP da Inglaterra, marcado pela eletrizante briga entre Leclerc e Verstappen, Vettel assumiu o papel de vilão novamente. Depois de ser ultrapassado pelo holandês, errou a freada e encheu a traseira do Red Bull #33. Por conta do incidente, de novo foi punido.
Por isso, a mais recente controvérsia gerou a ira de seus críticos e da histérica imprensa italiana, que não o perdoa mais. Para boa parte da mídia, Seb é um problema para a Ferrari, enquanto outros questionam se ele não é o principal responsável pela “sequência de erros mais intensa, danosa e preocupante de um piloto da Ferrari em 69 anos de história da equipe”.
Quase não se tem argumentos contra isso.
O momento do acidente (Foto: Reprodução)
É difícil explicar a performance errática de alguém como Vettel. O alemão surgiu com uma carreira meteórica. Encontrou na Red Bull um ambiente protegido e altamente competitivo, em que teve tempo para desenvolver seu talento sem qualquer pressão. Ganhou quatro títulos mundiais, é o terceiro maior vencedor da história da F1 e viveu disputas com nomes fortes, como Fernando Alonso. A mudança para a Ferrari foi compreensível. Não foi só uma questão de defender uma equipe diferente, mas correr pela escudeira mais famosa do mundo, ajudá-la a deixar a fila de títulos, e isso não tem preço, para o bem e para o mal. Seb parece experimentar neste momento todo o lado invertido da coisa. Reservado, também é difícil de traduzir seus pensamentos. Mas as atitudes revelam alguém desesperado.
Parecendo viver em um cenário de coisas muito estranhas e em um universo invertido, o tetracampeão precisa fechar esse portal e se reencontrar com o que costumava ser. E essa é a única opção.
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