‘Fraude Abt’ escancara: eSports não ameaça. O que ameaça é falha de caráter

Daniel Abt errou grave, errou rude e vai ter de pagar o preço. A reação dos seus pares é duvidosa: parecem acreditar que as carreiras no mundo real estão em risco pelas atuações nos eSports. Um erro

Conseguiram encontrar um limite no que é possível fazer nos videogames. Apenas algumas horas após gravar um GP às 10 comentando a situação de Daniel Abt, o GRANDE PRÊMIO agora volta a analisar a situação após os desdobramentos. A Audi suspendeu o contrato do piloto alemão e não irá renovar o vínculo, que termina em dois meses. A bobagem do fim de semana põe um fim numa ligação que durava bons anos: seis somente na Fórmula E. 
 
Com tudo que foi dito no GP às 10 e no Paddock GP, temos uma base que não repetiremos. 
 

Seguiremos daqui em diante para desdobramentos da última terça-feira com apenas uma recapitulação. Abt ia mal nas corridas virtuais da Fórmula E. Resolveu chamar um piloto de eSports para correr no lugar dele, um dublê, e foi pego. Acabou desclassificado pela categoria, mas foi realmente a fábrica alemã que pegou pesado.
 
Abt fraudou a corrida. Disse que fez com o intuito de brincadeira. Que brincadeira é essa que ninguém sabia e que precisou de uma investigação da categoria para ser desfraldada? Desculpa esfarrapada. "Mas é só o videogame, é uma coisa que serve para entreter os fãs nesse período". Não serve só para entreter os fãs, serve para expor a marca das equipes e seus patrocinadores. Não se trata de uma caridade para os fãs, esse argumento é mentiroso. É importante estabelecer isso agora.
 
Bom, como dito quando o assunto foi tratado anteriormente nas outras atrações da casa, o que Abt fez é diferente do acidente proposital de Simon Pagenaud e da ultrapassagem fantasma de Lando Norris na simulação do IMS. Aquilo não dialoga com o mundo real, mas fraude, sim. É errado ser moralista demais com os videogames, mas não se trata de terra de ninguém.
Daniel Abt não mostrou o rosto e foi acusado de chamar outra pessoa para pilotar (Foto: Reprodução)
Diversos pilotos se manifestaram de forma contrária à punição. António Félix da Costa e Jean-Éric Vergne, por exemplo. Usaram do fato de ser um jogo. Membros da imprensa internacional, então, ficaram indignados. Uma fraude e uma ofensa racista – essa de Kyle Larson, da Nascar – renderam punições no mundo real. O que faremos agora, meu Deus? Como se essas coisas não se traduzissem da mesma forma no mundo real. Por que usar a 'n-word' em um jogo que todo mundo pode acompanhar é menos grave que seria na pista? 
 
Eu, Pedro, vivo nesse mundo estranho e de elite que é o das pessoas do esporte a motor há alguns anos e ainda me causa espanto a capacidade de gente, no Brasil e fora dele, lutar pelo direito da boçalidade. Enfim, divago, não se trata do caso Larson aqui. 
 
Vergne questionou por qual motivo as batidas propositais não são tratadas da mesma forma. Ora, porque não encontram relação no mundo real. E, sim, você pode achar errado e um absurdo, mas não coloca a vida de ninguém em risco. A fraude é fraude. Não existe uma delimitação entre a fraude real e a fraude virtual. Que conceito nonsense é esse da fraude que pode?
 
Da Costa disse que não há sentido participar desses eventos quando tudo pode ser usado contra você no mundo real. Jura? Porque quando Abt nada rendia e chegava muito longe das primeiras colocações, ninguém estava julgando de verdade as capacidades de pilotagem dele. Ninguém discutiu que Max Günther, voando nas desinteressantes corridas virtuais, deveria receber as chaves da humanidade em forma de Excalibur. 
 
Lembrei do vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, quando, no auge do movimento #MeToo, disse que o segredo para ele não sofrer acusações de assédio sexual era "não jantar sozinho com mulheres". Reparem bem no que eu estou dizendo aqui e que NÃO HÁ RELAÇÃO entre assédio sexual e os pilotos. Peguem só o exemplo.
Daniel Abt não mostrou o rosto e foi acusado de chamar outra pessoa para pilotar (Foto: Reprodução)
Se o único problema real que os pilotos da Fórmula E enfrentaram até agora nas cinco corridas do Race at Home Challenge foi uma fraude, ora, é só não fraudar as coisas. A carreira de Da Costa não está em risco, a carreira dele está a salvo sendo ele bom ou ruim nos videogames. Ninguém se importa.
 
Agora, se o português ou qualquer outro piloto acha que não consegue evitar cometer um ato fraudulento ou fazer uma ofensa racista, aí deve mesmo ficar fora. Mas é pelas próprias incapacidades, não por culpa de qualquer outro que seja. E aí, companheiro, tchau e bênção.

Para encerrar. Dizer que a situação de Daniel Abt mostrou uma falha de caráter é ser factual, mas não quer dizer que o piloto é mau-caráter. Jamais. Todos temos falhas de caráter e, por pior que sejam, acabam surgindo em alguns momentos da vida. Se ele entender o que fez de errado, o motivo de causar indignação e não repetir, ótimo. Que siga a carreira em sucesso. É o que todos torcemos.

 

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