Coluna Superpole, por Victor Martins: O futuro de Montoya

Nenhuma operação com a grana que movimenta, por mais que admire seu funcionário, aguenta sobreviver se a eficiência e as metas não forem alcançadas. Montoya jamais terminou um campeonato da Nascar melhor que 17º. Diria o outro que assim não pode, assim não dá. Juan Pablo tem 37 anos e uma decisão a tomar, considerando que não deve passar por sua cabeça a hipótese de terminar a carreira: insistir na Nascar ou ver outro rumo. Que é o endurance

 
As temporadas de 1994 e 1995 foram de profunda transformação no automobilismo. As mortes de Roland Ratzenberger e Ayrton Senna naquele GP de San Marino repuseram a F1 como esporte de altíssimo perigo e, no lado da competição, quando lembrado, tudo o que Michael Schumacher fazia era posto em dúvida porque a Benetton não fazia usos e costumes das regras. Também pela mágoa decorrente da partida do brasileiro, os dois títulos conquistados pelo alemão eram vistos quase com um asterisco, sub judice.
Villeneuve foi o primeiro a fazer a América para conquistar a Europa nos anos recentes (Foto: Getty Images)

Por outro lado, a internacionalização da Indy – no sentido de atrair cada vez mais pilotos de várias procedências – começou a popularizar a categoria. No caso brasileiro, a evidente abertura de porta de Emerson Fittipaldi e de suas conquistas, somada às transmissões ao vivo, davam ao público uma opção. Se Emmo não fez um discípulo rápido, nem mesmo Christian, ao menos o povo passava a saber de onde estava vindo Michael Andretti e para onde fora Nigel Mansell. E naquelas tais temporadas, quem era o filho de Gilles Villeneuve. Jacques fez a América sendo rookie e depois campeão, com direito a vitória na Indy 500, com o belo e chamativo carro azul da Forsythe.


A F1, sobretudo a Williams, precisava de um novo alguém para brigar com aquele Schumacher que decidira ir para a Ferrari. E a Indy, então muito bem estabelecida, sofreu a rasteira de Tony George e se viu partir em duas. Villeneuve se preparou para a mudança como nunca se vira antes, e lá na cisão, a Ganassi se pôs como grande força no lado menos fraco, a Cart. A IRL, coitada, não era nada.

Schumacher e Villeneuve não foram propriamente rivais em 1996 porque Damon Hill aproveitou-se, enfim, do penúltimo trabalho bem feito do time de Frank. Foi em 1997 que o bicho pegou, com o inglês indo parar na Arrows, naquela memorável decisão em Jerez em que o alemão deu mais lenha aos seus detratores quando tentou acabar com a corrida de Jacques ao se ver superado no fim da corrida. O título do canadense também atestava que a Indy – no caso a Cart – era um bom celeiro de talentos, uma Catho On-board.
 

Como na F1, 1996 foi um ano de transição na Cart. Foi o mediano Jimmy Vasser quem apareceu como campeão no famoso carro vermelho patrocinado pela Target. O interessante é que Chip Ganassi havia tido a mesma visão de Frank, importando alguém do mundo europeu: Alessandro Zanardi. Depois de uma primeira metade de temporada de adaptação, o italiano fez brilhar e acontecer, e a ultrapassagem sobre Bryan Herta no Saca-Rolha de Laguna Seca mostrava não só um dos momentos mais colossais de todos os tempos do esporte, mas que o ex-piloto da Lotus seria facilmente o novo astro da categoria. De fato, Alex deitou e rolou em 97 e 98.

Em 1998, na F1, Schumacher passou a ter a McLaren com seu principal problema com a mudança técnica nos carros. A Williams se perdeu por completo, também com a saída da Rothmans. Villeneuve desapareceu, tanto que foi se juntar novamente a Craig Pollock, seu empresário dos tempos de Indy, para fundar a BAR bancada pela tabagista BAT no ano seguinte. A abertura da vaga na Williams só podia caber a ele mesmo, Zanardi. E para o lugar deste, Ganassi ousou e foi buscar um jovem ali na categoria de base da F1, o então campeão da F-3000, Juan Pablo Montoya.

Montoya dominou a temporada de 1999 da Indy e ampiiou a sequência da Ganassi (Foto: Getty Images)

Os caminhos de Zanardi e Montoya foram absolutamente distintos em 1999. Zanardi foi um fiasco absurdo. É bem verdade que o carro da Williams seguiu sendo uma draga, mas não pontuar na temporada enquanto Ralf Schumacher tinha 35 na tabela só podia dar ao italiano o cartão vermelho. Juan Pablo foi esperto: viu que a F1 estava sem nenhuma vaga decente e foi fazer da Indy pedestal seguindo os exemplos de Villeneuve e Zanardi. Levou de cara o título. Em 2000, a Ganassi trocou os motores Honda pelos Toyota. A mudança fez mal para a equipe, que esteve longe de brigar com a Penske de Gil de Ferran. Mas Chip, outro espertão, deu o grande bote do ano: alinhou seus dois pilotos para disputar as 500 Milhas de Indianápolis na IRL no primeiro momento de laço entre as séries. Montoya venceu de braçada. Com isso, pela terceira vez, a Williams importava alguém da América, oferecendo um pacote atraente: a parceria com a BMW.

Montoya caiu na F1 justamente quando Schumacher dava início ao seu reinado. Louco de pedra, a disputa com o alemão em Interlagos em que quase o mandou às favas no S do Senna aproximou o colombiano do povo que queria ver o destronamento de Michael. Quando dava, Montoya beliscava suas vitórias, poles e voltas mais rápidas – 4, 11 e 8, respectivamente, em quatro temporadas. Mas a Williams não tinha condições de brigar com aquela Ferrari armada durante aquela era, e Montoya, farto, foi tentar a sorte na McLaren.

Se na casa anterior colocava o irmão de Schumacher no bolso rechonchudo, Juan Pablo tinha noção de que teria certa dificuldade com aquele Kimi Räikkönen que já dava o que falar. O resultado final no campeonato resumiu o vareio que levou: 112 a 60, sete vitórias do finlandês contra três suas. Em meio a isso, já se ouvia que a relação com Ron Dennis não era das melhores – estávamos sem manchetes. Bom latino que é, Juan Pablo também nunca foi de baixar a cabeça. E como o mundo da F1, suas regras e perfeições – principalmente corporais – já haviam dado no saco, Montoya largou tudo no meio de 2006 e voltou à América para comer hambúrguer adoidado e para o colo acolhedor de Ganassi. JP não tinha o que fazer na Indy, então se viu na óbvia opção de tentar a Nascar.

Só que a Nascar, meu jovem, não era aquela Indy popularizada e aberta a qualquer não americano. A Nascar ainda era território fechado, dominado por zilhões de patrocinadores que agradavam àquele público local, que não sabiam – ou, se sabiam, haviam esquecido – 1) quem diabos era Montoya e 2) o que era a tal da F1 de onde ele havia vindo e se era de comer. Montoya começou humilde, na escala: andou na ARCA, de caminhão na então Busch Series e chegou até a fazer uma prova pela Nascar naquele ano. Daí foi jogado às feras por Chip.

Arte: Victor Martins/Grande Prêmio

De lá para cá foram seis temporadas. Chip passou a ter sócios na equipe, mas seu modo de conduzir a operação, perfeito e fantástico, não mudou. Montoya, sim. Montoya ganhou um peso descomunal para um atleta que depende de seu físico para andar quase três horas todo santo fim de semana, e isso foi melhor acompanhado com o advento das redes sociais, às quais se debruçava não para falar com seus fãs, mas às idas ao McDonald’s da vida, ao churrasco com aquele T-bone e aquela chuleta especial ou a porcolhices similares. É claro que o excesso de peso não é seu maior problema, mas se juntam aos resultados que nunca vieram: duas vitórias em um certame de 36 corridas/ano é irrisório para um piloto de seu calibre, e ambas em mistos – o que significa dizer que Juan Pablo jamais venceu em circuito oval. OK, esteve muito perto, mas estar perto não é vencer. Ponto. Nenhuma operação com a grana que movimenta, por mais que admire seu funcionário, aguenta sobreviver se a eficiência e as metas não forem alcançadas. Montoya jamais terminou um campeonato da Nascar melhor que oitavo. Diria o outro que assim não pode, assim não dá. E Félix Sabates, um dos comandantes da operação, e o próprio Ganassi, sabem que não dá mais. Não houve o anúncio oficial, mas a ‘AP’ já cravou, o boato se espalhou, ninguém se preocupou em negar, e é por aí mesmo.

Montoya tem 37 anos e uma decisão a tomar, considerando que não deve passar por sua cabeça a hipótese de terminar a carreira: insistir na Nascar ou ver outro rumo.

Aos que ainda sonham com um retorno a alguma das fases anteriores, dois pontos: Montoya não quer saber da F1. E não que simplesmente dá de ombros: ele tem raiva e asco da F1. Juan Pablo não é das pessoas mais fáceis, afáveis e simpáticas do mundo, mas é interessante que sempre tenha se recusado a falar do seu ano e meio de McLaren, por exemplo. Jornalistas e amigos próximos sabem e avisam de antemão a quem tenta tirar dele alguma declaração bombástica de que não adianta. E sobre a Indy: Montoya mal cabe no carro.

 
Bem, optar por aquela primeira não é a coisa mais inteligente de se fazer: se com um Ganassi empurrando, não houve êxito, dificilmente Juan Pablo vai encontrar melhor sorte em outra equipe – e, claro, não haveria de pegar uma qualquer só para fazer figuração. Só que Montoya não precisa pensar muito, e é bem capaz que pensem por ele: há um universo saltando aos olhos que o próprio já experimentou e se deu bem.
 
Desde 2007, Montoya faz pelo menos uma corrida na Grand-Am, um dos campeonatos de endurance dos EUA. Correndo, sempre, pelo múltiplo Ganassi. Em cooperação com Sabates. Com motor BMW. Uma conjunção tripla muitíssimo bem conhecida a Juan Pablo que lhe deu três vitórias nas 24 Horas de Daytona, a última neste ano, ao lado de Scott Pruett e Memo Rojas – os atuais tricampeões da categoria – e de Charlie Kimball – recém-vencedor do GP de Mid-Ohio da Indy – entre os protótipos. No ano que vem, a Grand-Am se funde à ALMS em um movimento enfim inteligente para dar vida à United SportsCar, com os mesmos conceitos e, principalmente, a categoria principal, a DP.
 
É claro que Ganassi vai alinhar sua equipe no novo campeonato, UCSR para os íntimos, com a mesma força e o mesmo favoritismo de sempre. É claro que Sabates sabe que, por trás daquele não mais jovem piloto ainda há alguém de puro talento e que cai como uma luva para as pretensões da equipe. É mais do que claro que os dois não vão abrir mão do bonachão Juan Pablo, que já apresenta credenciais suficientes para se tornar um dos grandes de todos os tempos no ramo das provas de longa duração e pode alçar escritas maiores com as conquistas que já tem. Montoyucho só não abraça a ideia, na prática, se não quiser.
 
Porque se quiser, os dois estão lá, prontos e de braços abertos para o abraço.
Chip Ganassi e Juan Pablo Montoya: um abraço para a eternidade (Foto: Getty Images)

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Q1: Não é de hoje que a presidente Neusa Batista Félix ambiciona ampliar as fronteiras da F-Truck e realizar provas nos EUA e no México. Mas diante do cenário do automobilismo brasileiro, a empresária estuda dar um salto ousado: transferir sua categoria para fora.

As etapas da F-Truck são as que mais recebem (os únicos, na realidade) público no Brasil e superlotam as arquibancadas. A questão é que apenas em Interlagos é possível fazer o evento completo — os demais autódromos não comportam. Levar a sede do campeonato dos caminhões de Santos para a América seria a saída.

Q2: É válido que a Stock Car traga pilotos internacionais ou renomados para algumas etapas, como Helio Castroneves, mas para isso é preciso um pouco mais do que boa vontade. Estrutura, por exemplo. Ou, ainda, responsabilidade: uma vistoria bem feita (foi feita mesmo?) já traria mais segurança aos pilotos. 

Q3: Vettel – Alonso, Vettel – Räikkönen ou Alonso – Räikkönen, que dupla a F1 há de ver em 2014? O palpite segue na segunda, mas a excessiva preocupação da Ferrari em desmentir começa a apontar muito para a terceira…

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