Coluna Warm Up, por Flavio Gomes: Gorducho

Os caras na Nascar não gostam de forasteiros. É como naquelas cidades do Velho Oeste, em que chega um sujeito, entra no saloon e todo mundo para de conversar, a música é interrompida, e o barman ignora

(Foto: Divulgação)

Fiquei sabendo que o Chip Ganassi não vai renovar seu contrato. Acabou a mamata. Também, mais de sete anos aí e nada? Duas vitórias em 239 corridas? Fazer o quê, agora?

Tenho sugestões. Apesar dessa sua paixão pela América, pelos sanduíches, pelos refrigerantes, pela cafonice de Miami, por montanhas-russas e pelas gírias do Bronx, acho que seu lugar é a Europa. Para correr, pelo menos. Vejamos. Você está com 37 anos e meio rechonchudo. Voltar à F1 está fora de questão. Vamos ser sinceros… Ninguém mais se lembra de você por lá. Culpa sua. Saiu falando um monte e as pessoas se decepcionaram com sua decisão. Afinal, hermano, chegaste com fama e marra. Justificadas. Ganhou a F3000 num ano, a Indy no outro, mais uma temporada boa nos EUA e caiu logo de cara na Williams, estrutura de time grande, BMW por trás e tudo mais.

Já ganhou corrida no primeiro ano, teve aquele chega-pra-lá no Schumacher em Interlagos e pronto, virou ídolo. Fez um monte de poles e andou sempre na frente. Depois foi para a McLaren. Era da turma da ponta. E então, de repente, avisa no meio da temporada que não quer mais, troca a F1 por essa coisa provinciana e cafona da Nascar, queria o quê? Quem te chamassem de volta? Pode tirar o cavalinho da chuva.

OK, tenho cá comigo algum preconceito com a Nascar. O “cafona” aí em cima é por minha conta. Na verdade, o preconceito é com os Estados Unidos. E vamos ser sinceros… Os caras na Nascar não gostam de forasteiros. É como naquelas cidades do Velho Oeste, em que chega um sujeito de fora, entra no saloon e todo mundo para de conversar, a música é interrompida, o sujeito chega no balcão, pede um trago e o barman ignora. Até que alguém com chapéu enorme, barba por fazer, Colt no coldre, vai até o estranho e pergunta o que é que ele está fazendo ali. E então começa a pancadaria e o tiroteio.

Não vou dizer que vi todas suas corridas na Nascar, na verdade não vi quase nada, nem sei se você levou pancada ou tiro de Colt. Mas creio que você passou pela situação do cara que chega no balcão. E nessas histórias de faroeste, se não for o mocinho do filme, não ganha. Seu caso, precisamente. Você não virou mocinho na Nascar, e não ganhou.

Juan Pablo Montoya se despede da Nascar (Foto: Getty Images)

Ganhou muita grana, isso a gente sabe. Fiz umas contas aí e só nos últimos cinco anos, foram 23 milhões de doletas. Em prêmios. Deu para fazer uma poupança razoável. Vai gastar em quê? Em Double Whoppers?

Me diga… Se não aparecer outra jabiraca qualquer para você correr, vai fazer o quê? Parar?

Não, não pare. Apesar de um certo ressentimento na Europa, eu diria que você ainda tem espaço para algumas coisas. Não falemos mais de F1, já disse que isso acabou, você passou da idade e do peso. Se bem que cheguei a imaginar uma volta em grande estilo, como fez o Kimi. Mas no seu caso é mais complicado. Entre outras coisas, teria de fazer um bom regime. E não sei se teria saco para começar quase do zero. Não, esqueça. Mas tem o WEC aí. Equipes legais, carros grandes, poucas corridas por ano e uma enorme boa vontade de todos para trazer nomes famosos. Já imaginou você de Porsche com o Webber? Por que não bate um fio para ele? O que é bater um fio? Telefonar, Juan Pablo, antigamente a gente falava assim, bater um fio, os telefones tinham fios ligados na parede. Ainda têm, alguns. Nesses motéis de beira de estrada aí na América todos têm fios ligados na parede.

Bem, é uma ideia. A Toyota pode ser outra. Você deve conhecer gente na Toyota. Teve um ano na Indy que você andou de Toyota, não teve? Em 2000? O ano que ganhou Indianápolis? Sim, eu sei, nas 500 o motor era outro, Oldsmobile, alguma coisa desse naipe, mas no campeonato da Champ Car era Toyota. Deve ter sobrado algum amigo japa para você bater um fio.

O que eu acho é que você desperdiçou sua carreira saindo da F1. Esses anos aí de Nascar pouco mais te trouxeram do que dinheiro e calorias. Do ponto de vista esportivo, não vi grande vantagem, não. Olhei as estatísticas, porque os caras aí têm estatística para tudo, e sua posição média de largada foi 19° e de chegada, 22°. Desempenho muito próximo do meu Lada de corrida. Sim, eu corro de Lada. Não, não adianta dar risada. Tenho mais troféu do que você. Enfim, reconhece a queda e não desanima.

E Connie, como está? E as crianças? Isso a gente tem de admitir, ela parece adorar os EUA, as crianças idem, e você tem tempo para curtir a família, apesar desse monte de corrida por ano. É tudo mais o menos perto, dá para dormir quase todo dia em casa. Se você aceitar a sugestão, essa de correr de Porsche ou de Toyota, nem precisa se mudar da Flórida. Fica por aí mesmo, o WEC tem meia dúzia de corridas, é tranquilo. E você gosta dessas provas longas, andou ganhando algumas por esses dias, tenho acompanhado meio de longe.

Pense bem. Se for ficar na Nascar, vai pegar alguma trapizonga de quinta categoria e andar atrás. Você continua sendo um forasteiro, hermano. O cara do bar sempre vai se negar a te servir um trago. E sempre vai ter um caubói de chapéu e Colt para arrumar encrenca. A vida pode ser mais tranquila, acredite. Vai por mim. Endurance, Le Mans, Spa, Interlagos. É divertido e paga bem.

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