Coluna Parabólica, por Rodrigo Mattar: Carta ao Rato

Dedico esta coluna a você, Emerson Fittipaldi, por tudo o que você representou e ainda representa para todos nós que o conhecemos e admiramos

Estimado Emerson Fittipaldi,

Para começo de conversa, devo dizer que eu era um guri de três anos quando, em 6 de outubro de 1974, você fazia história novamente e era campeão mundial de F1. Naquele dia, quatro décadas atrás, num domingo como este em que esta carta lhe é dedicada, o Brasil entrava de vez no mapa do automobilismo mundial. 

Em criança, não tinha a menor ideia do que era um carro de corrida. Minha primeira memória afetiva a respeito do tema remonta ao GP do Brasil de 1978, quando eu tinha seis para sete anos e presenciei um carro amarelo número #14 guiado por você, Emerson, chegou em segundo num calorento domingo de verão em Jacarepaguá. E todo mundo naquele dia celebrou sua história e suas glórias como nos velhos tempos.

Voltemos a 74: não foi um campeonato fácil, não é, Emerson? De acordo com os exemplares amassados e amarelados de Quatro Rodas e Auto Esporte que comprei em sebos muito tempo depois, a concorrência era fortíssima. A Ferrari, renascida, tinha Niki Lauda e Clay Regazzoni. A Tyrrell, renovada com a morte de François Cevert e a aposentadoria do tricampeão Jackie Stewart, trazia Jody Scheckter. Seu antigo colega de Lotus Ronnie Peterson por lá ficou. E havia ainda Carlos Reutemann na Brabham. E um punhado de pilotos bons. Era uma F1 que dava gosto de se assistir.

Emerson Fittipaldi conferindo o novo troféu das 6 Horas de São Paulo (Foto: Rodrigo Berton / Grande Prêmio)

Você foi corajoso, campeão. Trocar a Lotus pela McLaren sem ter certeza plena de que o M23 poderia lhe dar títulos foi uma aposta decerto arriscada no início. Mas a equipe tinha gente competente: Teddy Mayer era um bom chefe geral, Gordon Coppuck era um bom engenheiro e Alastair Caldwell, embora parecesse um tanto quanto boquirroto e arrogante às vezes, era competente na sua função. Você estava bem cercado. E o carro era bom. Tinha vencido corridas com Hulme e Revson em 1973. Faltava só um piloto à altura para a McLaren ser campeã mundial pela primeira vez.

Aquela disputa pelo título foi uma gangorra das boas, não foi? Seu colega Hulme ganhou de presente, no colo, a vitória na Argentina. Depois o velho Regazzoni que você conhecia de outros carnavais pegou a ponta do Mundial no Brasil e aí vimos o seu nome na liderança do campeonato por algum tempo. Mas a McLaren começou a perder o passo, a Ferrari tinha o motor mais forte da F1 e tanto Lauda quanto Rega lhe passaram. Só que, por mais que tivessem força e potência, não tinham a sua inteligência e capacidade para dar a volta por cima.

Você fez história naquele ano de 1974 ao introduzir o pré-aquecimento de pneus na F1. Lembra do que fizeste no Canadá, Rato? Fazia um frio de gelar os ossos no circuito de Mosport e aí lhe ocorreu a ideia de aquecer os pneus primeiro usando o aquecimento de um carro de passeio estacionado no hotel nas cercanias do Autódromo. Depois, foram usados os cobertores do próprio hotel para manter a borracha numa temperatura adequada. Genial. Isso foi decisivo para a vitória que deixou Regazzoni em parafuso.

Um campeão não dormiria um sono tranquilo feito o ítalo-suíço às vésperas da batalha final, Emerson. Você, pelo que me lembro de seus depoimentos ao longo dos anos, não conseguia esconder a ansiedade. Foi um ano brigado, tenso, difícil. Uma luta árdua por um objetivo, com certeza bem mais difícil do que a primeira conquista. Foi um título mais brigado. Os números não mentem: afinal, você e Rega estavam simplesmente empatados em 52 pontos quando chegaram a Watkins Glen para a decisão.

Rato, você neutralizou seu rival no psicológico e no técnico. Você era anos-luz mais preparado que o Clay pra ser campeão. E por mais que o suíço de bigode basto e sorriso perene fosse muito gente boa (no que sempre pareceu ser), você sempre foi mais piloto, muito mais competente, muito mais capacitado. Por isso, ninguém da imprensa se surpreendeu há 40 anos quando você foi bicampeão.

A surpresa, meu caro Emerson, você reservaria para anos mais tarde. Justamente quando se juntou ao sonho do seu irmão Wilsinho no projeto pioneiro do Copersucar-Fittipaldi que, por coincidência do destino, dava seus primeiros passos naquele mesmo ano de 1974. Foi um ano especial para uma família que muito contribuiu para o esporte que tanto amamos.

Rato, você abriu as portas para toda uma geração e é desnecessário citar quantos e tão bons nomes vieram na esteira do seu sucesso. Como diz o Alex Dias Ribeiro, que sempre te admirou, você foi o nosso Cristóvão Colombo. Ao “pôr o ovo em pé”, você mostrou que a distância entre o nosso Brasil e o velho mundo – a Europa – não era tão assustadora assim.

Quarenta anos se passaram desde aquela conquista histórica em Glen. E como outras tantas suas, continuaremos lhe pagando tributo enquanto pudermos celebrar os feitos históricos dos nossos maiores pilotos em todos os tempos.

Dedico esta coluna a você, Emerson Fittipaldi, por tudo o que você representou e ainda representa para todos nós que o conhecemos e admiramos.

Obrigado, Rato! 

Continue rugindo pelos próximos anos. De coração.

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