De bem com a vida, soberano Hamilton tem a si mesmo como maior adversário na luta pelo tricampeonato em 2015

No ano passado, Lewis Hamilton teve na segunda parte da temporada seu melhor desempenho. Muito mais à vontade na Mercedes, o britânico tem tudo para repetir e evoluir sua performance a partir deste fim de semana para igualar o ídolo Ayrton Senna em vitórias e também em número de títulos

Dez corridas, nove poles, cinco vitórias, 202 pontos e uma grande fase. Números que evidenciam a grande campanha feita até agora por Lewis Hamilton na temporada 2015 do Mundial de F1. Consagrado como o responsável por colocar a Mercedes de volta ao caminho dos títulos, o britânico de 30 anos vem brilhando como diamante em um ano que pode culminar com a conquista do tricampeonato mundial, igualando ninguém menos que seu grande ídolo no esporte, Ayrton Senna. De bem com a vida, dono de um ótimo contrato com a Mercedes e desfrutando ao máximo, Lewis está no auge e tem tudo para confirmar o título nas próximas nove etapas do calendário.

Dizer que Hamilton não tem adversários no seu caminho rumo ao tri é uma meia-verdade. Na teoria, matematicamente falando, Nico Rosberg e até mesmo Sebastian Vettel podem representar alguma ameaça. Seu companheiro de Mercedes está 21 pontos atrás, enquanto o tetracampeão do mundo tem 42 de desvantagem. Mas na prática, e com base no retrospecto recente dos três nos circuitos que faltam para fechar o campeonato, dá para dizer que Lewis só perde o tri para ele mesmo. Qualquer erro cometido pode ser crucial para que Rosberg, principalmente, dê o ‘pulo do gato’, como quase aconteceu em Hungaroring, há quatro semanas.

Com exceção de Hungaroring, onde Hamilton sofreu com um autêntico ‘apagão’ — deu tudo errado para o britânico naquela corrida e, mesmo assim, ainda saiu no lucro depois de ver Rosberg terminar duas posições atrás, em oitavo —, nas outras nove corridas o piloto, se não foi perfeito, ao menos fez um grande trabalho.

A imagem mais repetida do ano até agora: Hamilton fazendo a festa após mais uma vitória na F1 (Foto: Beto Issa)

Começo avassalador

No belíssimo circuito de Albert Park, em Melbourne, Hamilton abriu a temporada da mesma forma que terminou 2014: no alto do pódio e com um desempenho dominante, sem dar qualquer chance a Rosberg, um coadjuvante de luxo na Austrália. O grande temor, tamanho foi a supremacia exibida pelos novos Mercedes W06 Hybrid, era que a temporada fosse enfadonha e predominada pelo prateado. Mas aí veio o GP da Malásia para dar um colorido todo vermelho ao campeonato.

Em Sepang, Hamilton acabou levando um ‘nó tático’ da Ferrari, e nem mesmo o melhor carro foi capaz de deter o grande Sebastian Vettel que, com uma parada a menos em relação a Mercedes, saiu da Malásia com a vitória. Mas ao menos para Lewis, não foi um resultado de todo ruim pelo fato de ter cruzado a linha de chegada à frente de Rosberg. Uma vez que a vitória de Seb veio em condições atípicas, era de se esperar que o britânico tomasse as rédeas da disputa em Xangai. E foi justamente isso o que aconteceu.

Lewis Hamilton comemora triunfo em Xangai. E Rosberg acusa o golpe (Foto: AP)

O terceiro confronto entre Hamilton e Rosberg mostrou o quanto o alemão estava desnorteado. Lewis dominou todo o fim de semana, largou na pole e só não liderou nas voltas em que parou para fazer suas paradas. Nico, em momento algum foi páreo para o companheiro de equipe. E pior. No fim da corrida, na entrevista coletiva de imprensa destinada aos três primeiros, o alemão alegou, de forma inacreditável, que seu companheiro de equipe segurou o ritmo para atrapalhá-lo em Xangai. Obviamente, uma declaração sem sentido, de quem já estava nas cordas, pronto para ser nocauteado ainda no começo do round. Patético foi pouco. Choro de perdedor.

E nem sequer houve tempo para Rosberg sair das cordas. Hamilton, brilhante, aplicou mais um duro golpe no alemão, agora no Bahrein. No treino classificatório, foi um massacre, ao ponto de Nico sequer conseguir completar a primeira fila. Vettel largou ao lado de Lewis no suntuoso circuito de Sakhir, enquanto Rosberg partiu em terceiro. Durante a corrida, o bicampeão do mundo tirou proveito do melhor carro do grid para abrir vantagem, que acabou sendo decisiva no fim da prova.

Com problemas no sistema de freios, Lewis segurou o ritmo nas voltas finais, mas conseguiu terminar à frente de Kimi Räikkönen, que ainda lhe ajudou no trabalho ao deixar Rosberg — que também enfrentou o mesmo problema — para trás na parte final da corrida. Para completar o desfecho quase perfeito de GP do Bahrein, Sebastian Vettel, que teve uma jornada difícil com a Ferrari, terminou só em quinto. Assim, a primeira fase do campeonato era altamente favorável a Hamilton, que tinha devastadores 93 pontos, contra 66 de Rosberg e 65 de Seb.

Sinal de alerta e perigo

Às vésperas do GP da Espanha, na prova que marcou o retorno da F1 ao seu continente-base, Lewis ostentava um desempenho avassalador. Afinal, eram nove vitórias nas últimas 11 corridas, contabilizando as sete últimas de 2014. Depois de deixar Rosberg ‘grogue’ com uma série de grandes resultados, Hamilton foi claro: não havia guerra psicológica com o alemão. “A única guerra psicológica que existe está dentro de mim mesmo. Seu pior inimigo pode ser você mesmo, então você está lutando contra o pior inimigo invisível”, disse.

Era mais um indicativo de que, na prática, Lewis Hamilton via só a si mesmo como grande inimigo no caminho rumo ao tri. Era humilhação demais para Rosberg, que precisava urgentemente reagir, ganhar uma sobrevida, sob o risco de ver Lewis comemorar o título com muitas corridas de antecipação. Por isso, Nico tratou de arregaçar as mangas e mostrar que não estava morto.

Lewis não escondeu a cara da derrota após o duro revés em Mônaco (Foto: AP)

A única vez no ano em que Lewis foi superado em treinos classificatórios foi no GP da Espanha, em Barcelona, onde Rosberg fez um ótimo trabalho para assegurar, até o momento, sua única pole em 2015. E o germânico tirou proveito da boa posição de largada, pulou na frente e controlou a corrida para chegar na frente. Hamilton foi esmagado por Nico, mas em termos de campeonato o segundo lugar em Montmeló não foi ruim. Afinal, sua vantagem na briga pelo título seguia bastante relevante: 111 pontos, contra 91 de Rosberg.

Mônaco veio como a grande chance para Hamilton dar o troco e provar que o ocorrido na Catalunha foi apenas uma exceção, um fato atípico. E de certa forma, Lewis provou isso dominando todo o fim de semana, incluindo a corrida, pelo menos até o momento do acidente que envolveu Max Verstappen e Romain Grosjean. Mas o britânico só não contava com um erro clamoroso da Mercedes, que influenciou diretamente no resultado da corrida e lhe tirou das mãos uma vitória certa.

A chamada errada na hora errada para fazer um pit-stop sem sentido fez com que Lewis perdesse não apenas a vitória, mas também o segundo lugar. O triunfo acabou caindo no colo de Rosberg, que parecia não acreditar, mas comemorou como um menino. Ao britânico, restou-lhe o gosto amargo do champanhe numa nada festiva cerimônia de premiação no pódio improvisado no Principado.

Mas o que ficou evidente, independente do terrível revés causado pela Mercedes, é que o desempenho favorável a Rosberg em Barcelona tinha sido mesmo uma exceção. Em condições normais, era improvável que Nico repetisse a performance e batesse Lewis com tanta propriedade como em Montmeló. E o GP do Canadá veio justamente para comprovar que, no confronto mano a mano, Hamilton é muito melhor que Rosberg.

No ótimo circuito Gilles Villeneuve, Hamilton aplicou uma surra do seu companheiro de equipe, enfiando nada menos que 0s3 de frente no treino classificatório para garantir mais uma pole no ano. E durante a corrida, o britânico tornou sua jornada fácil, mamão com açúcar, e não deu a menor chance a Nico, impondo mais uma sonora derrota ao alemão no Mundial. A vantagem de Lewis, dos ameaçadores dez pontos sobre Rosberg após o GP de Mônaco, subia para 17.

Com nova derrota no campeonato, Rosberg tinha duas opções contra Hamilton: ou se entregar de vez à sofrência ou então lutar com a arma que tem em mãos. Mas como deter um inimigo dotado de armamento igual? Tirando proveito do seu ponto fraco. Foi o que Nico fez contra Lewis no GP da Áustria, prova que marcou o regresso da F1 à Europa depois do giro rápido pela América do Norte.

Hamilton garantiu mais uma pole com autoridade perante o alemão, impondo uma dianteira de 0s2. Boa vantagem, definitivamente, mas nada disso contou muito no dia seguinte, na largada. Nico tracionou melhor e tomou a ponta de Lewis. Com o desempenho dos dois Mercedes muito semelhante, a aerodinâmica dos carros não permite uma grande briga pela ponta devido à turbulência que o bólido que vem de trás sofre do carro à sua frente. Então a corrida ali em Spielberg foi definida no começo. Era a terceira vitória de Rosberg contra quatro de Hamilton.

Nico estava mesmo reagindo, acendendo o sinal de alerta para Hamilton. Na corrida seguinte, em casa, diante dos fãs em Silverstone, só havia uma opção: era vencer ou vencer. Nada mais.

Festa e redenção: Hamilton vence em casa e abre vantagem para Rosberg no Mundial (Foto: AP)

De forma incrível, para delírio da torcida, o xodó britânico cravou a oitava pole em nove GPs na temporada e parecia pavimentar o caminho para uma consagradora vitória em Silverstone. Mas Lewis não contava com dois fatores que tornariam sua jornada muito mais difícil em casa: a má largada, de novo, e a grande performance da Williams nesse quesito, que pulou na frente com Felipe Massa e Valtteri Bottas, deixando Hamilton em terceiro, à frente de Rosberg.

Entretanto, diferente do que aconteceu em Mônaco, dessa vez a Mercedes trabalhou da melhor forma com a estratégia e as chamadas para troca de pneus em meio à instabilidade climática e o chuva-para de Silverstone. Foi aí que Hamilton se deu bem e conseguiu assegurar uma vitória para lavar a alma e aliviar a pressão que Rosberg começava a esboçar. Definitivamente, um dia para Lewis recordar.

Entre o GP da Inglaterra e a etapa de Budapeste, o mundo do esporte teve de lidar com a morte na F1 21 anos depois do trágico fim de semana do GP de San Marino de 1994, que viu o passamento precoce de Roland Ratzenberger e Ayrton Senna. A terrível perda de Jules Bianchi no dia 17 de julho, pouco mais de nove meses após o acidente sofrido pelo francês no GP do Japão, abalou o mundo da F1, e era inevitável que os pilotos, humanos, sentissem o baque na corrida seguinte.

E Hamilton acabou tendo sua pior performance no ano exatamente na corrida seguinte após se emocionar no adeus a Bianchi. Embora não veja nenhuma correlação entre as duas situações, o fato é que Lewis se mostrou irreconhecível na corrida. Antes, em todos os treinos, o piloto foi muito superior e dominou as sessões livres e também a classificação, mas não foi nem sombra do grande nome da temporada no domingo, que viu a vitória, pela segunda vez no ano, de Sebastian Vettel.

A nove passos do tri

Depois de uma jornada tão cansativa ao redor do mundo, nada melhor do que algumas semanas de folga merecida. E Lewis rasgou a fantasia: curtiu adoidado o carnaval de Barbados com Rihanna, aproveitou com os cachorros, participou de eventos com celebridades, enfim, foi Lewis Hamilton na sua pura essência.

 

Positively preposterous behaviour I say!! #0FucksGiven #daggeringboss #BarbadosCropOver

Uma foto publicada por Lewis Hamilton (@lewishamilton) em

Ago 5, 2015 às 11:16 PDT

Agora é a hora de retomar os trabalhos e voltar ao volante do W06 no segundo semestre, época em que Hamilton acredita que poderá ser ainda melhor. E no comparativo com os números do ano passado, é bem possível que isso venha acontecer: Em 2014, Lewis venceu os GPs de Itália, Cingapura, Japão, Rússia, Estados Unidos e Abu Dhabi. Rosberg só triunfou uma vez nesse espaço de tempo: em Interlagos, na penúltima corrida do campeonato.

Assim, com todo o retrospecto jogando em seu favor, só mesmo um fato anormal nas nove corridas que restam nesta temporada pode tirar o tri de Hamilton. Rosberg adota um discurso otimista ao dizer que o campeonato está aberto, e matematicamente até está. Resta a Lewis controlar a ansiedade, apresentar a maturidade na hora certa para garantir mais uma taça, talvez até de forma antecipada, e realizar o sonho de igualar Senna, o que pode acontecer não somente em títulos, mas também em vitórias.

Atualmente, Lewis soma 38 vitórias, três a menos em relação à mística marca de 41 eternizada por Senna no GP da Austrália de 1993 e igualada por Vettel há quatro semanas, em Budapeste.

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