Em pouco mais de um mês a Fórmula 1 vai descobrir como o futuro será. 29 de março é o dia que define os rumos do Brexit, movimento que pode transformar a operação de fábricas e equipes no Reino Unido, coração da F1, em missão das mais difíceis

A Fórmula 1 se vê próxima de uma crise. Não, não é por causa de um regulamento que deu errado, por causa de uma equipe que vence demais, por falta de interesse das pessoas. Quem dera fosse só isso: de forma inédita na história da categoria, uma decisão política passa a ser primordial para a existência do campeonato da forma que conhecemos hoje. Estamos falando dele mesmo: o Brexit traz uma maré de incerteza ao Reino Unido, país menos europeu da Europa, e ameaça a estabilidade da F1 justamente em seu território mais vital.

O Brexit não é exatamente uma novidade. O referendo que determinou o desejo dos britânicos de deixar a União Europeia aconteceu no já distante 2016. O problema é que 29 de março é o prazo final para o Reino Unido decidir se vai de fato optar pela saída do bloco. Restando pouco mais de um mês até lá, ainda não é possível ter uma previsão concreta a respeito de o que vai acontecer. Para a F1, é motivo de dor de cabeça: sair da EU significa aumento de custos para a antes relativamente barata temporada europeia, dificuldades para manter funcionários de outros países e até mesmo incertezas a respeito do futuro de fábricas. Das dez equipes que formam o grid atual, apenas Ferrari e Toro Rosso, sediadas na Itália, e Alfa Romeo, alocada na Suíça, escapam ilesas da ameaça. As outras todas – Mercedes, Red Bull, Renault, Haas, McLaren, Racing Point e Williams – não sabem ao certo o que o futuro reserva.

O problema ainda parece não chamar atenção do grande público. No fim das contas, é muito mais natural que a época de pré-temporada traga outras atenções. Do lado de dentro das equipes, todavia, a história é outra. A Mercedes já se manifestou duas vezes, preocupada com os impactos da saída do Reino Unido da União Europeia. A primeira veio da chefia, através do presidente Dieter Zetsche, que destacou que os britânicos tem na Europa "uma casa". É um apelo sentimental para buscar uma vitória nos negócios. A outra manifestação é de Toto Wolff, chefe da equipe de F1, que usa argumentos do ponto de vista dos negócios para defender a operação mais vitoriosa da F1 na década.
(Divulgação/Mercedes)

"Sim, o Brexit é uma grande preocupação para nós. Deveria ser uma grande preocupação para todos vivendo no Reino Unido”, disse Wolff em entrevista acompanhada pelo GRANDE PREMIUM. “Nós somos equipes de Fórmula 1 que viajam a corridas e fazem testes ao menos 21 vezes por ano. Nós estamos saindo e voltando para o Reino Unido, saindo e voltando para a União Europeia. A forma com que nós conseguimos nossas peças é sempre de última hora, entrando no Reino Unido. Qualquer perturbação nas fronteiras e nos impostos iria mudar a F1 drasticamente no Reino Unido”, seguiu.

Isso [Brexit] é a mãe de todas as bagunças. […] Existe um risco para nossas pessoas, risco para nossa indústria

A sede de 70% do atual grid da Fórmula 1 fica no Reino Unido

A Mercedes, mesmo alemã, escolheu o Reino Unido como centro de operações da Fórmula 1. Brackley, sendo preciso. A possibilidade de ir e vir livremente dentro da Europa é um fator importante para fazer funcionar a equipe sem uma única identidade nacional.

“Nossa equipe é internacional. Somos uma montadora alemã com sua operação de F1 no Reino Unido. Quantas nacionalidades diferentes temos? Acho que são de 15 a 20 [Wolff depois é corrigido, sendo 26 nacionalidades diferentes] nacionalidades diferentes na nossa equipe, muitas da União Europeia. Existe incerteza no momento a respeito de como seria o impacto de um Brexit sem acordo ou só um Brexit sobre aquela que eu considero uma das indústrias mais fora-de-série do Reino Unido. Já dissemos isso antes, essa é a mãe de todas as bagunças”, definiu.

"Nós somos dirigentes de equipes de Fórmula 1, não políticos. Como homens de negócio, esperamos que o pensamento racional prevaleça e venha a proteger uma indústria, assim como a economia britânica. O que nós estamos vendo, ao menos no mundo da F1, é que estamos expostos às decisões que podem ser tomadas a nível político. Existe um risco para nossas pessoas, risco para nossa indústria”, frisou.

A visão negativa de Wolff foi um dos elementos que permitiu a já citada carta aberta da Mercedes, com a mais alta cúpula da Mercedes tomando uma posição então inédita entre representantes do circo da F1.

"Foi discutido durante a semana de Natal se a gente deveria escrever uma carta, envolver-se ou não”, recordou Wolff. “Ele [Dieter Zetsche] sentiu que, como líder do automobilismo britânico, a gente precisava fazer algo. A indústria [da F1] está em risco. Nós temos um acesso fantástico a talentos no Reino Unido e a Fórmula 1 por lá cresceu a ponto de ser como o Vale do Silício nos EUA. A F1 é isso no Reino Unido. Existe o risco de o Reino Unido deixar de ser uma região tão competitiva quanto é hoje. A gente realmente espera que as coisas sigam assim [como hoje]”, ressaltou.

Respeitamos a escolha de vocês. É de vocês, não nossa. […] Mas vocês devem saber que não acreditamos que escolhas são irreversíveis. Nossa porta sempre vai estar aberta

Wolff pode ser o mais preocupado, mas certamente não é o único. Otmar Szafnauer, chefe da Racing Point, vê a mudança de horizontes do Reino Unido surgir em momento de renascimento da escuderia. A sucessora da Force India já tem até planos para construir uma nova fábrica, ainda nas redondezas de Silverstone. Szafnauer não perde o sono com o risco de saída da União Europeia, mas reconhece que questões precisariam ser resolvidas no novo cenário.

"Ir e voltar [da União Europeia] pode ser um problema”, considerou, em entrevista acompanhada pelo GP*. “A gente compra peças na Europa. Eu não sei, não acho que o Brexit iria parar tudo, mas talvez a gente precise pagar mais, e também de mais tempo. Esse tipo de coisa… Eventualmente vai ficar tudo bem. Nossos tanques de combustível, por exemplo, são comprados em uma companhia americana. Elas entram [no Reino Unido], eles não fazem parte da União Europeia. Pode ser que a gente tenha uma dificuldade extra, mas com algum tempo tudo vai ficar bem”, seguiu.

"Certamente seria mais fácil se não tivéssemos um Brexit total. Certamente. Qualquer Brexit seria assim, mas depende de como o Brexit vai ser. Estamos falando de dificuldades para trazer o motorhome para a corrida em Silverstone. Há problemas. Se é a primeira vez que você enfrenta esses problemas, e com um calendário tão apertado, isso poder ter um impacto. Se a gente tem três corridas em sequência com a Inglaterra no meio com um Brexit, isso pode ter um impacto. Nós estamos [fazendo planos de contingência]. Hoje mesmo estávamos falando sobre isso”, revelou.

 

Brexit – afinal, o que é isso?

 

Você pode imaginar que não é missão simples resumir o Brexit e suas possíveis consequências. Em essência, a população britânica foi chamada às urnas em junho de 2016 para responder uma simples pergunta: ‘O Reino Unido deve seguir membro da União Europeia ou deixar a União Europeia?’.

A votação era promessa de campanha de David Cameron, então primeiro ministro, e que saiu pela culatra. 51,89% votou ‘Leave’, ou ‘deixar’, abrindo as portas de um momento dos mais conturbados para a política britânica. Cameron, favorável à permanência, surgiu como grande derrotado e renunciou ao posto. Theresa May surgiu como sucessora.

Com o Brexit agora validado pelo referendo, surgia uma nova questão – ainda sem resposta. Como deve ser essa saída da União Europeia? Quão radical e profunda precisa ser a divisão? Quase três anos depois ninguém tem resposta certa, sendo franco. Negociações andaram e retrocederam, sempre sem rumo claro. Posto isso, o Reino Unido se vê com três opções pela frente.

 

(Theresa May)

A primeira, e talvez mais racional, é um Brexit com chegada a um acordo com a União Europeia. Nesse cenário, o Reino Unido apresenta até 29 de março um acordo de saída do bloco econômico, incluindo período de transição e previsão de como a nova relação vai funcionar. Seria um método mais suave, mas que exige que o parlamento britânico chegue a um consenso sobre tópicos do acordo a ser apresentado, algo que ainda não aconteceu.

A segunda alternativa é o ousado ‘no-deal Brexit’, ou ‘Brexit sem acordo’. Significa aquilo mesmo que você deduziu: o Reino Unido simplesmente deixa a União Europeia em 29 de março. Não há transição alguma, o que representa um possível pesadelo para companhias de atuação europeia em solo britânico. A opção não é exatamente desejada, mas vira alternativa conforme os britânicos sofrem para chegar ao acordo final.

A terceira grande alternativa é… votar outra vez. Grupos político defendem que a população não foi devidamente informada sobre como o Brexit se desenrolaria ou sobre as devidas consequências. A opção, apesar de ser a mais apreciada pelos que querem a permanência na EU, traz o incômodo peso de ignorar uma votação já realizada e validada.

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