Coluna Parabólica, por Rodrigo Mattar: As bodas de prata de Emerson na Indy 500, na verdade, comemoram 40 anos

Emerson Fittipaldi muito contribuiu para a abertura de mais uma porta para os seus compatriotas, ao se tornar o primeiro brasileiro a correr em Indianápolis e também a vencer pela primeira vez, há exatos 25 anos. Mas isso só foi possível porque o próprio Emerson, quarenta anos atrás, teve sua primeira experiência na pista em que só estrearia oficialmente uma década mais tarde, quando tentava se refazer das agruras da Fittipaldi na F1

Neste domingo de grandes provas do automobilismo, talvez o mais significativo domingo dentre todos a cada ano, tem GP de Mônaco de F1 e a Charlotte 600, a corrida mais longa da Nascar. E não podemos esquecer-nos das 500 Milhas de Indianápolis, o mais antigo dos eventos disputados em circuitos ovais na história do esporte.

O hoje centenário Brickyard é um circuito com muito significado para o automobilismo brasileiro, porque vimos um total de sete conquistas dos nossos pilotos. Emerson Fittipaldi muito contribuiu para a abertura de mais uma porta para os seus compatriotas, ao se tornar o primeiro brasileiro a correr em Indianápolis e também a vencer pela primeira vez, há exatos 25 anos, numa conquista épica que merece ser relembrada por esta coluna.

Mas isso só foi possível porque o próprio Emerson, quarenta anos atrás, teve sua primeira experiência na pista em que só estrearia oficialmente uma década mais tarde, quando tentava se refazer das agruras da Fittipaldi na F1.

Como consequência do título mundial conquistado em 1974 pela McLaren, o Rato foi convidado para um teste no Indianápolis Motor Speedway. A equipe vencera as 500 Milhas daquele ano com Johnny Rutherford a bordo do McLaren M16 com motor Offenhauser e seria nesse carro que o bicampeão andaria. A máquina era um projeto do mesmo Gordon Coppuck que desenhara o M23 do título mundial do brasileiro.

Emerson Fittipaldi em Indianápolis, na edição de 1989 (Foto: Arquivo)

Ao chegar no circuito, Emerson foi recebido por AJ Foyt, que seria quatro vezes campeão da prova, e por Herb Foster, o responsável por abrir a pista para testes dos pilotos novatos. Ele confidenciou numa matéria da revista ‘Quatro Rodas’ de dezembro de 1974 que o primeiro bate-papo com Foster foi fundamental para que realizasse o teste, pois os pilotos psicologicamente mal preparados eram – e acredito que até hoje o sejam – impedidos de andar no mítico oval de 2,5 milhas de extensão.

No contato com o texano Foyt, que o levou num carrinho de golfe para conhecer as curvas pelo infield, Emerson disse que o então piloto mostrou muito respeito pelo que ele fizera na F1. Mas logo advertiu, a sério, dando a entender que Indianápolis não era brincadeira e que era muito diferente de Monza, Monte-Carlo, Nürburgring e Interlagos.

“Tome cuidado”, recomendou Foyt a Emerson.

O carro, segundo recordou o brasileiro, foi preparado de forma que ele não pudesse aproveitar toda a cavalaria do motor Offenhauser que, com máxima potência do turbo, podia passar de 1000 HP. Era uma potência bestial, num circuito velocíssimo e num carro que, é bom recordar, não tinha nem 15% da segurança que hoje os monopostos apresentam. Era o que carinhosamente chamamos de “cadeira elétrica”.

Emerson foi recomendado a andar no limite máximo de 150 mph (240 km/h) para adaptar-se e passou onze milhas do limite, fazendo os ianques torcerem o nariz. Mesmo assim, Tyler Alexander, o chefe da equipe McLaren para Indianápolis, convidou Emerson para mais meia hora de treinos, em que o bicampeão de F1 chegou a 183 mph (295 km/h) de velocidade final. Para a mesma Quatro Rodas, ele declararia o seguinte: “Gostaria de assistir uma 500 Milhas. Deve ser sensacional para o público ver 33 carros andando juntos a uma grande velocidade. Mas embora tenha adorado a experiência de andar no circuito, não vou correr em Indianápolis.”

Palavra de campeão, às vezes, nem sempre se cumpre e Emerson não cumpriu, para nossa sorte, o que dissera em 1974. Tanto que, dez anos depois, recebeu um convite de um tresloucado cubano chamado Pepe Romero, de uma escuderia chamada WIT Racing Promotions, para estrear à vera em Indianápolis com um March 83C pintado de cor de rosa. E foi assim que a história dos brasileiros nas 500 Milhas definitivamente começou, há exatos 30 anos.

Emerson Fittipaldi venceria novamente em Indy em 1993 (Foto: Pascal Rondeau/Getty Images)

Aquela corrida não foi das mais marcantes para o brasileiro, mas ele adorou e, ao contrário da época do teste com a McLaren, ele achou os carros bem mais seguros – embora ainda suscetíveis a muitos acidentes sérios, por causa das velocidades alucinantes. E decidiu voltar. E ficou.

A partir de 1985, passou à equipe de U.E. “Pat” Patrick e correu nos primeiros anos com um carro pintado nas cores da 7-Eleven. Isso até 1987, quando a velha parceria com a Marlboro voltou. No ano seguinte, a bordo de um March 88C Chevrolet, Emerson só foi superado por Rick Mears. Era a senha de que a primeira vitória estava cada vez mais próxima. E ela veio, num domingo mágico, 28 de maio de 1989.

Um dos trunfos da vitória foi a aquisição de um chassi Penske PC18, que junto com o motor Chevrolet formavam o conjunto mais competitivo daquela prova. A compra do chassi foi intermediada pela Phillip Morris. Roger Penske não poderia prever que assim se formaria o binômio que derrotaria sua própria equipe, que tinha o “Rei dos Ovais” Rick Mears, o campeão de 1988 Danny Sullivan e Al Unser.

Largando em terceiro, Emerson logo arrancou de forma sensacional para a liderança ainda na primeira volta. E dominou quase toda a corrida, até a 185ª volta, quando um erro de cálculo quase pôs tudo a perder: a Patrick Racing, escaldada por um trauma de outros carnavais, encheu o tanque do Penske de Emerson até o gargalo com metanol. Pelo número de voltas que faltava, não era necessário, e a Galles, que alinhava um Lola para Al Unser Jr., pôs o combustível suficiente para chegar até o fim.

Com o carro pesado, a diferença de três segundos entre os dois pilotos baixou de forma dramática e Emerson foi alcançado e logo superado por Little Al. E a tevê estadunidense caprichava no drama, mostrando os takes de Tereza Fittipaldi, então mulher de Emerson, e de Shelley Unser nos pits.

Tereza rezava e chorava. Shelley estava com a adrenalina a mil e, de repente, um tráfego pesado bloqueou Unser. Emerson, mesmo com mais peso de combustível, acelerou tudo e não cedeu. A 350 km/h, os dois voaram pela reta oposta em direção à Curva 3 e o resto é história. Os dois se tocaram, Unser bateu, Emerson sobreviveu, venceu e tornou-se o primeiro campeão de F1 desde Graham Hill em 1966 a ganhar em Indianápolis. E foi também o primeiro a ganhar US$ 1 milhão de prêmios.

Foi uma conquista que emocionou a todos nós e também a Ayrton Senna, que ao ser informado da vitória por Reginaldo Leme, faltando poucos minutos para a largada do GP do México, caiu em prantos. Senna também venceria naquele domingo, tornando o 28 de maio de 1989 mais histórico do que nunca.

Numa cabine de transmissão do Indianápolis Motor Speedway, outro homem sorria satisfeito: Luciano do Valle, que apostara todas as suas fichas na popularidade da categoria no Brasil, transmitindo as corridas pela Bandeirantes, tinha a certeza de que acertara no milhar. A vitória de Emerson manteve as provas ao vivo e o brasileiro seria campeão ao fim do ano, em mais uma conquista histórica de um homem predestinado dentro das pistas.

Emerson ainda venceria mais uma vez em Indianápolis em 1993 e, depois dele, Hélio Castroneves chegaria a três conquistas. Gil de Ferran foi o campeão no circuito em 2003 e ano passado foi a vez de Tony Kanaan, numa corrida espetacular. Tudo consequência daquele teste no já distante ano de 1974 e também da mudança de opinião de Fittipaldi. Dez anos de diferença entre o teste e o convite de Pepe Romero fizeram a diferença e foram, indiretamente, responsáveis pelo fato de que os torcedores brasileiros, hoje, podem se orgulhar de ver os pilotos do nosso país brilhando no mítico oval estadunidense.

GRANDE PRÊMIO cobre 'in loco' as 500 Milhas de Indianápolis com os repórteres Victor Martins e Evelyn Guimarães. Para acompanhar todo o noticiário, clique aqui.

GRANDE PRÊMIO cobre 'in loco' o GP de Mônaco, sexta etapa do Mundial de F1, com o repórter Renan do Couto. Para acompanhar todo o noticiário, clique aqui.

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