Coluna Wild Card, por Juliana Tesser: Corrida da morte

Scott Redding se tornou alvo dos apaixonados pelas corridas de rua ao falar sobre as mortes de Bob Price e Karl Harris no TT da Ilha Man. Price participou ativamente da carreira do britânico

A Ilha de Man é uma velha conhecida dos amantes do motociclismo. Localizada no Mar da Irlanda, a pequena ilha de 572 m² recebe desde 1907 uma das mais lendárias – e arriscadas – corridas de moto do mundo: o Troféu Turista da Ilha de Man.
 
O TT é realizado em um traçado de mais de 60 km com 256 curvas, onde as motos rodam a uma velocidade média de 208 km/h em vias públicas, que são interditadas para a disputa. 
TT da Ilha de Man tem uma média de dois mortos por edição (Foto: Dave Kneen)
Por se tratar de uma prova de rua, os pilotos estão expostos a um risco extremo. Ao longo de seus mais de cem anos de história, o TT da Ilha de Man já vitimou mais de 230 pilotos, em uma assustadora média de duas mortes por ano. Trata-se, efetivamente, da prova mais perigosa do mundo. 
 
Reforçando as estatísticas, a edição de 2014 já deixou seus dois mortos: Bob Price e Karl Harris.
 
Price, de 65 anos, faleceu no último dia 2 após um acidente na terceira volta para prova da Supersport. Harris, de 34 anos, morreu um dia depois, após um acidente no segundo giro da Superstock.
 
As duas mortes, claro, repercutiram bastante entre pilotos e fãs do motociclismo, mas foi na última terça-feira que um desabafo carregado de emoção despertou a ira de alguns entusiastas do TT.
 
Pelo Twitter, Scott Redding afirmou que a corrida “estava saindo do controle e não era justo com as famílias”. Na visão do piloto da Gresini, as “motos de hoje são avançadas demais para as corridas de ruas”.
 
“Você guiaria seu carro a 132 Mph (cerca de 212 km/h) em uma vila?? Agora tire duas rodas e a carcaça. Acho que vocês entendem o que eu estou dizendo. Isso não é mais correr. É como uma corrida da morte”, escreveu Scott. “Todos os pilotos que terminam estão aliviados por terminarem inteiros e por verem seus entes queridos. Perdi muitos amigos”, desabafou.
 
“Eu sei que ninguém obriga eles, mas você não pode dizer, de todo o coração, que você não se sente mal quando algo assim acontece. Isso simplesmente me machuca”, continuou. “Não me leve a mal. Sempre que alguém me pergunta sobre o TT, eu digo que tiro o chapéu e que tenho um respeito enorme.”
Scott Redding desistiu de participar de uma parada na Ilha de Man neste fim de semana (Foto: Mirco Lazzari/Getty Images)
“Isso tudo é a minha opinião… Fico feliz que alguns discordem, mas você não pode comparar pista com rua”, defendeu. “Imagina o TT acontecendo todo fim de semana? E agora compare os números”, completou.
 
O desabafo de Scott tem muito a ver com a morte de Bob Price, um amigo da família que esteve diretamente envolvido no início da carreira do britânico. 
 
Muitas das pessoas que criticaram a posição de Redding acusaram o piloto da MotoGP de pedir o cancelamento do TT. Esse não é o ponto. 
 
O TT da Ilha de Man nada mais é do que uma reação à decisão do Parlamento Britânico de proibir as corridas de rua no início do século XX. O Automóvel Clube Britânico decidiu, então, pedir apoio ao governo local para a realização da disputa, que só não aconteceu nos anos da Segunda Guerra Mundial e em 2001, por conta de um surto de febre aftosa.
 
Scott tem razão quando diz que os pilotos estão lá por vontade própria. Todos eles foram para Man porque quiserem ir. Eles escolheram correr em provas de ruas. Mas isso não elimina a preocupação com segurança. A preocupação deles, inclusive.
 
A organização do TT não quis comentar as declarações de Scott, mas afirmou que faz um estudo anual do traçado e da velocidade das motos, retirando fãs e fiscais dos pontos mais perigosos. Mas isso não resolve. A média de acidentes fatais segue lá, firme e forte.
 
As pessoas podem até não gostar de ver isso escancarado da forma como Scott o fez, mas o TT é sim uma corrida da morte. Em todos os sentidos. 
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