De homem forte da Marlboro a diretor da Ferrari, Arrivabene faz jus ao sobrenome: ‘chega bem’ demais

Nomeado para o posto de diretor-esportivo da Ferrari em novembro, Maurizio Arrivabene era conhecido dentro da F1, mas não para o público da F1. Em quatro meses no cargo, o italiano tenta ser e fazer diferente na tentativa de levar a escuderia italiana de volta ao topo

Há pouco mais de um mês, Maurizio Arrivabene deu as caras pela primeira vez no paddock da F1 ainda precisando se apresentar. Passava algumas vezes do motorhome para o box da Ferrari sempre com uma echarpe no pescoço, protegendo-se do frio da Espanha, e os cabelos grisalhos empapados com gel, formando um alto topete — que, às vezes, se rebela.
 
Mas a cara ainda era um pouco fechada e não dava muitas pistas sobre a personalidade do italiano que nasceu em Brescia nos idos de 1957.
 
A máscara começou a cair no primeiro contato com os jornalistas, ainda em Barcelona. Ao ser chamado de “Maurizio” antes da primeira pergunta da entrevista coletiva, abriu um sorriso e agradeceu:
 
— Gostei que você me chamou de Maurizio. Por favor, isso é para todos: não me chamem de Arrivabene. Vai dar azar. Arrivabene, talvez no futuro.
 
Sim, ele estava renegando o próprio nome — em tom de brincadeira, é claro. Ainda não fizera, desportivamente falando, nada que justificasse ser chamado de “chega bem”, a tradução literal do italiano. O posicionamento merece ser repensado após as duas primeiras corridas da temporada.
Arrivabene é o homem de confiança de Sergio Marchionne (Foto: Ferrari)

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Arrivabene entrou no mundo da F1 por causa de seu antigo emprego na Marlboro. Trabalhando desde 1997 para a marca da Philip Morris, tornou-se o homem forte do departamento de comunicação e marketing da empresa, principal patrocinadora da Ferrari por mais de uma década. Um vendedor de cigarros. Em 2010, passou a participar das reuniões da Comissão da F1 na FIA como representante dos patrocinadores.

 
O currículo e o convívio conquistaram a confiança de Sergio Marchionne, que assumiu em outubro a presidência da Ferrari. Em 23 de novembro, um comunicado do time anunciou a demissão de Marco Mattiacci e a nomeação de Arrivabene. Mattiacci, ex-diretor-executivo da Ferrari na América do Norte e diretor-esportivo desde a saída de Stefano Domenicali em abril, não colecionou amigos na F1. Por vezes, pareceu tentar tratar a escuderia da mesma forma que estava habituado a lidar com o mundo dos negócios. Não teve, no esporte, o mesmo sucesso das vendas.
 
Não deu liga, e isso ficou evidente na fala de Marchionne. “Decidimos indicar Maurizio Arrivabene porque, para o momento histórico que vivem a Ferrari e a F1, precisamos de uma pessoa com a compreensão não só da Ferrari, mas também dos mecanismos de governância e das exigências do esporte”, declarou o presidente.
 
“Maurizio tem uma riqueza de conhecimento incomparável: foi extremamente próximo da escuderia por anos e, como membro da Comissão da F1, também está ciente dos desafios que estamos enfrentando. Foi uma fonte constante de ideias inovadoras focadas na revitalização da F1. Sua experiência de gerência em um mercado altamente complexo e estritamente regulado também é de grande importância e vai ajudá-lo a motivar o time”, reforçou.
Bernie Ecclestone com Arrivabene em uma das edições do Wrooom, evento que a Philip Morris organizava todo início de ano em Madonna di Campiglio, na Itália (Foto: Vladimir Rys/Getty Images)
Discurso introdutório à parte, essa última frase de Marchionne salienta uma característica que já ficou bastante clara: Arrivabene é um motivador.
 
Um chefe de equipe não precisa ser um engenheiro ou um projetista consagrado — até pode, vide Ross Brawn. Precisa, mesmo, ser um gerente, um líder, alguém que saiba colocar as pessoas certas nos lugares corretos e extrair o melhor delas. Para isso, cada um tem seu estilo. É um trabalho que está sendo feito com James Allison, o diretor-técnico, e que envolveu a contratação de Sebastian Vettel para o lugar de Fernando Alonso. Ele diz que teve um dedinho de responsabilidade no processo, ajudando a ligar os pontos.
 
No GP da Austrália, Kimi Räikkönen abandonou depois que a roda traseira esquerda ficou solta no pit-stop. Um problema na porca da roda, que já havia se manifestado na primeira parada do finlandês. Minutos mais tarde, as câmeras de TV flagraram Arrivabene no pit-lane conversando com o mecânico para compreender o problema e transmitir tranquilidade: “Eu simplesmente disse e ‘se acalme, fique concentrado, não se preocupe’. Coisas assim acontecem”.
Mas a cena ainda mais marcante foi a da festa pela vitória no GP da Malásia. Seria natural que o próprio Arrivabene — ou então um dos principais diretores da Ferrari — fosse ao pódio receber o troféu em nome da equipe. Porém ele escolheu o gerente de operações de corrida, Diego Loverno, que nunca esteve debaixo dos holofotes.
 
A ideia: ressaltar e recompensar o “trabalho duro” feito em Maranello nos últimos meses. O esforço dos funcionários que passaram o fim de ano escutando o barulho de motores em vez de músicas natalinas. Populismo? Talvez.
 
Mas o dirigente é um líder, segundo Felipe Massa, que o conhece dos tempos em que correu pela Ferrari. “Ele é muito trabalhador e é um chefe. Sempre foi na área dele”, afirma. “Agora é uma área diferente, um trabalho diferente. A gente tem que entender exatamente como vai ser. Não será um trabalho fácil, sem dúvida. Você tem que fazer o trabalho e empurrar as pessoas no caminho certo.”
 
Com Diego lá em cima, ficou ‘no meio do povo’ para entoar o hino italiano a plenos pulmões — uma das imagens do fim de semana.
Arrivabene se empolgou ao cantar o hino italiano em Sepang (Foto: Reprodução)
Arrivabene quer ser e fazer diferente para levar a Ferrari de volta ao topo. Diferente de seu antecessor, Mattiacci, e diferente dos adversários. Já admitiu que quis chamar a atenção quando, no lançamento da SF15-T, chamou o carro de “sexy”. Por que dar uma declaração normal, padronizada, tão comum que passaria como mais uma? Ora bolas, o carro é sexy! “Aquela frase saiu da boca e do coração”, afirmou. Traçou a meta "mais ambiciosa do que realista" de vencer duas corridas, porém se preocupou em não fazer promessas que não pode cumprir. Também quis fazer uma provocação ao divulgar um conceito de carro ‘futurista’. Foi à arquibancada protestar contra Bernie Ecclestone. Acredita que a F1 precisa sofrer uma revolução para voltar a crescer e quer incentivar o povo de dentro e de fora a dar ideias, mesmo que absurdas, que levem a propostas construtivas de mudança.
 
Figura nova em um paddock de tipos ao mesmo tempo tão distintos e tão semelhantes, Arrivabene vai aos poucos sendo compreendido. Até que ponto está fazendo marketing pessoal? Até que ponto suas ideias e métodos são válidas? Essas respostas ainda não foram dadas, mas os resultados na pista com certeza contribuirão para que ele tenha voz mais ativa dentro da F1. Ficasse a Ferrari só perdendo, Maurizio correria certo de risco de ser lembrado como um falastrão que certa vez colocaram como chefe da equipe. Mas ele chegou bem, e isso já começa a fazer a diferença.
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