Helicóptero rasgando o céu e ambulância em duas rodas: os bastidores de mais uma morte em Interlagos

Repórteres do GRANDE PRÊMIO contam como a alegria de uma cobertura in loco foi antes das 9h15 contrastada com a tristeza pela morte de Danilo Berto, do SuperBike Brasil. Entre momentos de intimidação, respeito e dor dos familiares, ficou o sentimento unânime de que algo precisa ser feito

O jornalismo nos colocou nesse domingo (26) diante de um dos desafios mais cruéis da profissão. Quando se fala de uma morte no esporte, não importa o tamanho do evento ou a importância do piloto. Danilo Berto, do SuperBike Brasil, morreu em Interlagos, diante dos nossos olhos, câmeras, computadores e bloquinhos de anotações que, claro, foram ao chão assim que a trágica cobertura terminou.
 
Estávamos lá ciente dos riscos e, mais do que isso, do histórico recente. Justamente na última etapa da categoria, outro piloto, Maurício Paludete, o Linguiça, havia morrido. Se em circunstâncias parecidas, negligências ou fatalidades, as investigações vão dizer.  
 
Mas quando, antes das 9h15 (de Brasília), o helicóptero Águia da Polícia Militar rasgou o céu de São Paulo e uma ambulância do Corpo de Bombeiros fez em duas rodas a curva do túnel da entrada principal do autódromo, sabíamos que ali estava a notícia. Pouco tempo depois, todos nós estávamos no Centro Médico.
 
Muita, mas muita gente, não gostou que dois repórteres foram até o local buscar mais informações sobre o que já se pintava como trágico.  
Centro médico em Interlagos, para onde foi levado Danilo Berto (Foto: Gabriel Pedreschi/Grande Prêmio)

Passados os ânimos exaltados, deu claramente para entender que a atitude de cão-de-guarda foi até compreensível para quem anda, com ou sem razão, levando porrada de todos os lados. Um membro da equipe médica do local chegou a tentar despistar e dizer que o piloto havia sofrido uma fratura na perna, e só.

 
A desconfiança e uma dose de coragem nos mantiveram ali até o final.  
 
Os nossos textos, e estes em nada editorializados — deixamos (ou, ao menos, tentamos deixar) bem claro quando estamos emitindo puramente opinião — foram publicados e depois ‘verificados’ pela organização.  
 
Apesar de só por aí se configurar uma mínima intimidação, mais uma vez, é compreensível. Nada foi, e nem precisaria, ser alterado. Esse talvez tenha sido o melhor dos reconhecimentos. Ali ficou estabelecido o respeito não só pelo trabalho, mas por quem se importa com a categoria.
 
Com o helicóptero no ar, a conversa sobre o que faríamos no dia de trabalho foi finalizada rapidamente. Afinal, nada mais importava que o estado de saúde do piloto e as questões de segurança da categoria e do autódromo, que viram, em um mês, dois pilotos serem transferidos com urgência para hospitais. Todas as informações eram necessárias para montar o quebra-cabeça do acidente. Com a confirmação dos detalhes, informamos o ocorrido. Um enorme trabalho de apuração dentro do circuito e, também, fora, já que, ao mesmo tempo, toda a redação do GRANDE PRÊMIO estava acionada mesmo tendo de se dividir arduamente com GP de Mônaco da Fórmula 1 e as 500 Milhas de Indianápolis da Indy.
 
A felicidade da nossa primeira cobertura in loco de uma corrida como repórteres do GP era contrastada por aquele momento. E mais, em Interlagos. Éramos estranhos no nosso ninho mesmo já tendo passado boa parte da vida vendo as nuvens saírem de trás da represa.  
 
Foram horas e horas de trabalho para trazermos o fato como aconteceu, com diversas fontes e diretamente do local. Uma apuração de verdade que não terminou nem depois do boletim médico do Hospital das Clínicas.
Danilo Berto (Foto: Reprodução/Facebook)
Com as informações cada vez mais escassas devido ao grave estado de saúde do piloto, que passava por cirurgia no hospital, era hora de buscarmos a segunda parte: segurança para corridas de moto no autódromo. E, olha, rendeu história e longas conversas, que serão dissecadas e trabalhadas pelo GRANDE PRÊMIO ao longo do tempo. Sem entrar muito nesse assunto e, agora sim, dando a nossa opinião, o autódromo como está não pode receber corridas de moto de jeito nenhum.  
 
E a categoria sabe disso. E os responsáveis pelo circuito, que liberam o uso, também. Será que os competidores sabem? Será que o público tem a real noção? Por isso informar.
 

Enquanto sim, já pensávamos em ir embora, surgiu, alguns minutos antes das 17h, o boato que o piloto de 35 anos, natural de Valinhos, não havia resistido aos traumas do acidente e havia morrido no hospital. Enquanto voltávamos para a sala de imprensa para trabalharmos o texto e continuar a apuração, conversamos com pessoas que, aos poucos, também tomavam conta do fato. A morte nos foi confirmada através da assessoria do hospital, às 17h03.
 
Dali em diante, havia a preocupação de checar se a família já sabia do ocorrido. Poderíamos perder o ‘furo’, para usar um jargão jornalístico, mas teríamos o respeito dos mais próximos. O trabalho, em respeito ao Mauricio e ao Danilo, além dos outros mortos e com grandes lesões, em outros acidentes na categoria, segue sendo feito. Independentemente da categoria, da organização, do piloto, de sei lá quem, a morte não pode ser presença garantida. Só 24 horas depois essas palavras conseguem tomar corpo.
 
Forças para as famílias. Muita força para seguir em frente. E vamos, com respeito, imparcialidade, apuração e, principalmente, com as palavras, não esquecer essas mortes e ajudar a evitar novas mortes no futuro. Nossos olhos, câmeras, computadores e bloquinhos de anotações também vão voltar ao trabalho.

Acidente de Maurício Paludete em Interlagos:

Em respeito à família e ao público, o GRANDE PRÊMIO não vai divulgar as imagens de um celular próximo ao local do acidente que registram Paludete. As imagens a seguir foram feitas por um fã da arquibancada da reta principal e dão a dimensão do que aconteceu.


 
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