A discussão sobre os efeitos negativos que a direção italiana causou na Ferrari com o passar dos anos não é nova. Pelo contrário, é muito antiga. Há quem atribua o fato de longas secas e poucos períodos de domínio, ainda que a Ferrari seja a equipe mais tradicional e quem mais recebe dinheiro de premiação da F1, a este feitio. Os tempos atuais apresentam uma Ferrari que luta pelo título mundial, embora ainda como irmã menor da Mercedes, mas outro fator se destaca. As lideranças inglesas, sempre vistas como as mais elogiáveis, sofrem ainda mais. É um problema inglês?
Uma pincelada história sobre a Ferrari, que está no Mundial desde 1950 e faturou 16 títulos de Pilotos. Seis deles vieram com a dupla do francês Jean Todt com o inglês Ross Brawn no comando durante os anos 2000. Antes disso, a Ferrari não conquistava um campeonato desde Jody Scheckter em 1979. O últimos deles foi com Kimi Räikkönen, em 2007. Tirando a era Michael Schumacher, apenas uma outra vez a escuderia italiana faturou um campeonato por dois anos seguidos: 1952 e 1953, então com o italiano Alberto Ascari.
Especialmente a partir dos anos 1980, a conversa sobre a incapacidade ferrarista aumentou por conta da dificuldade para entregar um título sequer. Pilotos como Gilles Villeneuve, Alain Prost e Nigel Mansell tentaram tirar os italianos da fila, sem sucesso. Por outro lado, a conversa sobre a excelência britânica no automobilismo ganhava força. A ascensão das inglesas McLaren e Williams se juntou ao mito de Colin Chapman, na Lotus dos anos 1960 e 1970. Os ingleses dominaram a F1.
Durante toda a seca da Ferrari, entre 1979 e 2000, apenas equipes inglesas ganharam o campeonato – a Benetton, embora tivesse um dono e chefe italianos, era registrada como inglesa em 1994 e 1995. O panorama mudou, porém. A última vez que um time inglês foi campeão mundial de F1 foi em 2009, quando a surpreendente Brawn GP, que era a Honda um ano antes, tomou de assalto a competição.
De lá para cá, quatro conquistas da austríaca Red Bull e outras quatro da Mercedes. No primeiro degrau da F1, essas duas escuderias germânicas são acompanhadas pela Ferrari. Enquanto isso, as gerências inglesas vivem desastres.
Christian Horner e Maurizio Arrivabene (Foto: Reprodução/TV)
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As duas equipes mais tradicionais da terra da rainha são os maiores exemplos de decepção do campeonato nesta temporada. Como equipe garagista que é a Williams é realmente um time que não briga para ter o padrão campeão de outros tempos. O orçamento simplesmente não bate com aquele necessário para superar os times de fábrica, tudo bem. Mas a sequência de decisões tomadas nos últimos 15 meses tirou o time de Grove da metade de cima da F1 e enfiou no fim do pelotão.
Um carro problemático e a decisão de contratar uma dupla de pilotos inexperientes e de talento duvidoso para fazer a máquina evoluir e brigar por qualquer tipo de resultado na pista pesam muito. Tudo em nome de uma salvação financeira que não apenas não veio sem uma representação esportiva minimamente aceitável, mas se corroeu por completo.
Aceitar vender a alma e trocar a bancarrota esportiva por dinheiro por parecer uma boa ideia para quem fecha planilha de Excel, mas não se sustenta num negócio que é, acima de qualquer outra coisa, sobre esportes. Sem o lado esportivo, o lado financeiro não vai sobreviver.
Na próxima temporada, a Williams não terá a patrocinadora-máster que caminha junto consigo desde 2014, a Martini, e nem o maior mecenas atual, Lawrence Stroll, pai de Lance. Após comprar a Force India, o investidor magnata do mundo da moda vai levar o filho e os dólares para Silverstone. O que sobra? Se a situação financeira era problemática antes, como sobreviver e se recuperar agora que as maiores fontes de renda estão fora e o prêmio por resultados da equipe será o menor do grid?
Claire Williams e Paddy Lowe (Foto: Reprodução/Twitter)
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Contratar o jovem George Russell é uma aposta no talento para 2019, claro, mas também uma tentativa de reaproximação com a Mercedes para o futuro próximo e um sistema que possa beneficiar ambas. É uma torcida de caminhar junto e buscar desoneração de algum peso financeiro que puder. Quem será o outro? Robert Kubica corre atrás de dinheiro polonês para financiar a outra vaga, mas a não ser que possa competir com Sergey Sirotkin e a grana de banqueiros russos, vai ser difícil vê-lo em ação. Neste momento, a Williams deve rezar para contar com ele.
Quando Paddy Lowe foi contratado como diretor-técnico vindo da Mercedes, no começo de 2017, o recado era de que a Williams tinha grandes aspirações. Quase dois anos depois, Lowe representa uma das maiores decepções do futuro recente. Claire Williams, a chefe-adjunta, ainda fala como se não tivesse
a menor ideia do que se passa e
tem medo de ser rifada pelo pai. É difícil entender como a Williams pode sair de um buraco no qual se afundou com tamanho vigor.
O outro exemplo é o da McLaren. Com orçamento de fábrica e aspirações de brigar, sim, por títulos, a equipe de Woking não consegue deixar a espiral da morte na qual entrou há meia década. Por alguns anos, a Honda estava lá para ser o bode expiatório. 2018 deixou claro que não era esse o problema.
Sem vencer desde 2012 e com uma sequência absurdamente ruim de classificações nos campeonatos de Construtores desde então – quinto lugar em 2013 e 2014, sexto em 2016 e nono em 2015 e 2017 -, a McLaren vive um processo semelhante ao que a Williams passou para deixar de ser grande.
É real que nos anos em que a McLaren se tornou equipe oficial da Honda havia um problema a mais. O motor era sofrível, mas um 2018 em que a McLaren pena mesmo empurrado pela Renault e a Honda cresce com a Toro Rosso deixa claro: conjunto McLaren e motor Honda conseguiam a façanha de destacar os pontos fracos de cada uma.
Zak Brown (Foto: Xavi Bonilla/Grande Prêmio)
Durante bons anos, Éric Boullier era o responsável pelas operações de pista. Uma falha monstruosa. Nem mesmo o retorno de Ron Dennis deu jeito: Dennis acabou demitido da McLaren, algo impensável. Zak Brown agora é quem tenta ajustar a nau e, crédito para ele, consegue pensar algo mais fora do regular para tentar recuperar ao menos algum brilhareco.
A segunda experiência com Fernando Alonso termina no fim do ano se provando humilhante para a McLaren. Em quatro anos, nenhum pódio e nem sequer oportunidade de disputar as primeiras posições com a McLaren. As dificuldades da equipe jogaram fora a última chance do bicampeão, que
agora caminha para a Indy. Woking não quer deixar Alonso ir embora, então arquitetou um projeto de parceria nos Estados Unidos. Por mais sucesso que possa ser, a conexão com Alonso será sempre lembrada como um desastre corporativo.
O contraponto que pode ser oferecido está nem nas equipes grandes. O austríaco Toto Wolff comanda a Mercedes que mantém linhas germânicas; o inglês Christian Horner toca a Red Bull ao lado do também austríaco Helmut Marko; enquanto a Ferrari segue levada por Maurizio Arrivabene, mas já em crise executiva de quem tem intenção de demitir a chefia após mais uma perda de campeonato.
Quem cresce na busca por algo diferente é a Haas. Equipe norte-americana chefiada por um ítalo-germânico em Guenther Steiner, a Haas buscou um modelo sustentável para si. Os acordos com Ferrari e Dallara para adquirir tudo que não precisasse construir e desenvolver do zero, trocar o incerto de novatos pelo desenvoltura de poderosos especialistas.
Chefe da Haas, Guenther Steiner durante a classificação deste sábado em Sóchi, na Rússia (Foto: Getty Images)
A Haas tem também seus pecados. A forma como passa a mão na cabeça de Romain Grosjean e Kevin Magnussen, sempre afeitos a chuvas e trovoadas e não poucas vezes perigosos para os outros pilotos, é um tanto quanto controversa, mas a briga pelo quarto posto do Mundial em 2018 é um incrível feito. Basta lembrar que a Haas sequer existia até o começo da temporada 2016. Não era outra equipe que acabou comprada: foi construída do zero. Três anos depois tem enormes chances de chegar aos 100 pontos, bater McLaren e Williams e tudo isso sem uma fonte fácil de muito capital.
O que fazer daqui para a frente? Difícil precisar, mas é fácil concluir que as equipes inglesas cometem muitos erros inaceitáveis.
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