“Circuito especial” e “evento à parte”: por que formato sprint faz tanto sucesso em Interlagos
Desde que foram implementadas pela Fórmula 1, em 2021, as corridas sprint estiveram em Interlagos em todos os anos e, geralmente, com repercussões muito positivas. Por isso, o GRANDE PRÊMIO procurou pilotos e jornalistas para entender o sucesso da pista mesmo com um formato tão questionado por torcedores e até membros do grid
Desde que foi implementado em 2021, o formato sprint dividiu opiniões no mundo da Fórmula 1. Enquanto alguns fãs defendem novidades na categoria como uma forma de atrair mais pessoas e gerar maior grau de entretenimento, outros apontam para um lado mais tradicional. Entre os pilotos, a cisão também acontece, inclusive com críticas públicas e nada discretas, inclusive de nomes como Max Verstappen. Nestes quatro anos, a F1 levou a novidade para diversos locais, mas só um se sustentou como palco fixo: Interlagos, cenário do GP de São Paulo.
A pista paulistana recebeu corridas sprint nos três anos anteriores, sempre com momentos importantes e boas disputas, consolidando-se como um palco permanente deste formato que ainda engatinha na Fórmula 1. Embora outros dez lugares tenham aparecido no mapa das provas curtas, só o Brasil recebeu edições em todas as temporadas — e só Áustria, Estados Unidos e Catar também tiveram mais de uma aparição. No fim, reflexo do sucesso em meio a tantas dúvidas e críticas, especialmente pelo inchaço que gera num calendário já bastante saturado.
Em 2021, a Fórmula 1 chegou ao Brasil com a intensa disputa pelo título entre Max Verstappen e Lewis Hamilton. Na corrida curta, punido, o britânico largou no fim do grid e executou uma grande recuperação até o quinto lugar. Em 2022, foi a vez de Kevin Magnussen surpreender e colocar a Haas na pole da sprint, que acabou vencida por George Russell em um fim de semana inesperado da Mercedes, que tantas dificuldades passou ao longo daquele campeonato. No ano passado, a etapa foi menos emocionante, mas ainda viu uma batalha entre Verstappen e Lando Norris na largada.
Ao longo destes anos, a Fórmula 1 tentou inovar com a sprint, inclusive mudando formatos e ordem das sessões ao longo dos finais de semana. Na base de tentativa e erro, ainda busca o jeito ideal para torcedores, equipes e pilotos. Mas, então, por que Interlagos foge da regra e faz o esquema funcionar tão bem?

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O GRANDE PRÊMIO procurou pilotos e jornalistas para entender como uma das mais antigas e menores pistas do calendário consegue gerar o entretenimento que palcos mais modernos e com diversos pontos de ultrapassagem não oferecem. Para isso, a busca foi por entender se o formato sprint é bom para o esporte e os fatores que influenciam nas disputas, sejam eles dentro ou fora da icônica pista localizada na zona sul da capital paulista.
O formato sprint deu certo? É bom para a F1?
Para o jornalista Fabio Seixas, o formato sprint “veio para dar uma sacudida no fim de semana” e modificar o ritmo de todos em relação a uma etapa habitual. “Em um cronograma comum, a sexta-feira é praticamente inútil e o formato com a sprint veio justamente para dar mais importância aos três dias do evento”, pontuou.
Vencedor do GP do Brasil em duas ocasiões e atualmente na Stock Car, o piloto Felipe Massa vai na mesma linha e defende a manutenção da ideia para agitar os finais de semana da F1. “Como fã, adoro, porque acontece muita coisa durante todo o fim de semana, não apenas uma sessão de treino monótona, depois classificação e corrida”, afirmou.

Há também quem goste do formato com mais ressalvas. É o caso do jornalista Flavio Gomes, que apoia as mudanças feitas nas corridas sprint ao longo dos anos, mas defende que elas não tenham qualquer tipo de influência no restante do fim de semana.
“Realmente a sprint, na minha visão, tem de ser um evento à parte, um evento que se encerra em si mesmo. Não pode ter nenhum tipo de influência na corrida e nesse sentido eu estou mais para gostar das sprints do jeito que são hoje do que para não gostar. Mas acho que o experimento começou de uma maneira muito capenga, muito improvisado”, destacou.
Geferson Kern, jornalista e narrador dos canais GRANDE PRÊMIO, também coloca a parte comercial como um fator explorado. “O formato casou bem com o circuito, o público da arquibancada comprou a ideia e o espetáculo entregue pela televisão fica muito bom, com ação dentro da pista — cortesia do traçado e do clima de Interlagos”.
Interlagos ser uma pista ‘old-school’ ajuda neste sucesso?
Interlagos é uma das pistas mais elogiadas pelos pilotos da Fórmula 1, especialmente por suas muitas variações de velocidade e alto grau de dificuldade. Apesar de não ser a mesma pista desafiadora dos anos 70, por conta de reformas feitas para receber a categoria novamente em 1990, ainda agrada a quase todos e carrega um grande peso histórico. Mas isso faz realmente a diferença?
“Interlagos é um circuito especial, um dos melhores da F1. O traçado, embora tenha sido dilacerado no início dos anos 1990, manteve características espetaculares. Falando de traçado, a pista manteve um tom moderno e com características da F1 de antigamente, com variedade de curvas, descidas, subidas, trechos de alta e mais travados”, disse Seixas.

Para Castilho de Andrade, diretor de imprensa do GP de São Paulo, a pista paulistana se faz fácil de agradar aos competidores. “O sucesso da sprint vem das características do circuito de Interlagos que, inegavelmente, é seletivo e tem bons pontos de ultrapassagem. Os pilotos gostam de correr aqui, essa é uma verdade”, afirmou.
Gomes também vê o tamanho do autódromo paulistano como um fator para ajudar no sucesso das sprints. “Acho que todas essas características, fim de campeonato, pista curta, pontos de ultrapassagem, o fato de ser uma pista curta — é uma pista que em poucas voltas você tem sempre muito atrito, muita disputa, o grid não se espalha. E isso é o que acaba combinando mais com esse tipo de corrida”, comentou.
Como alguém que já correu muito no traçado, e dominou como poucos, Massa destacou as qualidades que ajudam Interlagos a se diferenciar de outros palcos do calendário atual. “Interlagos, além de ser um circuito pequeno, é muito bem feito, com subidas como a da Junção e do Café, praticamente uma reta. Isso gera ainda mais chances de ultrapassagem, com o aumento do vácuo no fim da reta principal. Depois, a reta oposta também. Além de um miolo bem lento, técnico”, declarou o brasileiro.
História, tradição e até a atmosfera do público interferem?
Palco de momentos históricos, Interlagos é praticamente uma unanimidade entre os fãs da categoria, ainda mais com os pilotos marcantes que brilharam ao longo do tempo no traçado. Mas toda essa tradição do autódromo brasileiro faz a diferença para gerar grandes corridas sprint?
“Não acho que tem nada a ver com tradição, com história, nada disso. E não deve ter mesmo, porque eu acho que o que deve pautar a escolha das pistas que fazem parte desse minicalendário de sprints é realmente a possibilidade de fazer uma corrida legal. O brasileiro tende muito a achar que essa corrida aqui é especialíssima, que todo mundo ama, que ela é diferente do resto do calendário. Não é bem assim”, declarou Gomes ao ser questionado.

Seixas vai na mesma opinião. “Creio que tradição não tem a ver com isso, mas que há um olhar técnico. Tem um olhar comercial sempre, claro, mas acho que tem muito um olhar técnico. Interlagos é a reserva técnica de uma excelente corrida sprint. Por isso que a F1 sempre manteve Interlagos no calendário”.
Há quem veja por outro lado, claro. Os pilotos Massa e Tony Kanaan, por exemplo, acreditam que pode ser um fator determinante para a escolha da categoria e valorizam o público que sempre lota as arquibancadas. “A atmosfera e o apoio do público contam muito”, disse o ex-piloto da Indy.

