Diários de Viagem, por Juliana Tesser: De carona com o Guiga

Se você nunca viveu uma experiência como essa, saiba que a primeira reta é a maior enganação do universo. Na primeira acelerada você pensa: ‘Ah, isso é tranquilo’, mas toda reta sempre leva a uma curva — ou, no caso do caminhão, a um cavalo de pau

Foi no já distante ano de 2012 que eu tive a minha primeira experiência em uma pista de corrida — dentro dela, no caso. Naquele 1 de abril, no agora extinto circuito de Jacarepeguá, no Rio de Janeiro, fui parar no caminhão do Juninho, um dos protagonistas do show da F-Truck.
 
Na época, eu não tive muito tempo para pensar no que estava fazendo. Recebi o convite, aceitei e, quando vi, já estava dentro do caminhão colocando o cinto de segurança. 
Mitsubishi deixa um ASX reservado para levar jornalistas conhecerem o trajeto (Foto: Cadu Rolim)
Para quem não sabe, o show da Truck é feito por três pessoas — os três filhos de Aurélio Batista Félix e Neusa Navarro, os fundadores da categoria — Danielle, Gabrielle e Aurélio Junior.
 
Não lembro muito bem como eu fui parar no caminhão do Juninho, mas, para o meu azar, ele era o último a entrar na pista, então eu fiquei lá, sentada, quieta, vendo tudo que ia acontecer e com tempo o bastante para alimentar meu medo.
 
Lembro de ter perguntado ao Juninho desde quando ele fazia aquilo, mas não tive coragem de replicar quando ele respondeu: “Ah, desde os 16”. A julgar pela aparência, não fazia muito tempo que ele tinha passado dos 16, mas já era tarde demais para mudar de ideia.
 
A experiência foi super divertida, mas também um pouco assustadora — especialmente na hora em que ele me largou sozinha no caminhão em movimento e desceu para acenar para o público. 
 
Porém, tirando aqueles primeiros minutos, eu nunca me arrependi de ter entrado no caminhão aquele dia, mas sempre disse que não sabia se faria algo do tipo outra vez. Até que eu desembarquei em Curitiba para a segunda etapa da temporada 2015 da Mitsubishi Cup.
 
 Ainda no aeroporto da capital paranaense, soube que a marca dos três diamantes mantém um carro de imprensa em todas suas etapas para levar jornalistas conhecerem o trajeto. Desta vez, eu até que tinha um tempo para pensar, mas acabei aceitando logo de cara.
 
Mais tarde, fui apresentada ao piloto que me levaria para conhecer a pista montada em campos colhidos de milho e soja. Eu disse que ele teria que pegar leve, mas ele logo respondeu: “Não dá. O carro não consegue fazer isso”.
 
Ora, claro que consegue. A ASX certamente saberia tratar com jeitinho uma jornalista que se assusta com facilidade. O problema são os pilotos, esses seres que nunca foram apresentados ao sentido da expressão “pega leve”.
 
No sábado, logo pela manhã, fui para a Fazenda Campo Novo passando por uma estrada de terra. O dia mal tinha começado por lá quando recebi a notícia de que iria me aventurar na pista da etapa da Mafra com um outro piloto. Alguém que atende por Guilherme Spinelli, o Guiga.
 
Embora moto seja a minha especialidade, eu sei bem quem é o Guiga. É o Guiga do Dakar, do Rali dos Sertões. O Guiga do Yousseff Haddad, o Guiga da Mitsubishi!
 
A primeira coisa que eu pensei? “Ferrou! Se tem alguém que não conhece o sentido de ‘pegar leve’, esse alguém muito que provavelmente é o Guiga!”. E se conhece, o ‘pega leve’ dele, certamente, é diferente do meu. 
 
Mas aí eu lembrei que ficar apavorada com antecedência nunca é uma boa opção, então tratei de pensar no lado bom das coisas. O Spinelli é um dos melhores pilotos de rali do Brasil, o que certamente significava que eu estaria em ótimas mãos — sim, eu sei que isso também significava que provavelmente seria bem rápido, mas, de novo, eu estaria em boas mãos. 
Guilherme Spinelli é piloto do time da Mitsubishi (Foto: Vinícius Branca)
Meu pensamento era simples: ele vai no Dakar — que é difícil para caramba —, vai no Sertões — que também não é mamão com açúcar —, então não ia ter problemas em um circuito fechado.
 
‘Ah, o Guiga não deve ser do tipo que pega leve! Sim, mas, mesmo em modo ‘virado no capeta’, deve ser tranquilo’.
 
Na hora combinada para a minha aventura, fui vestir o macacão, colocar o capacete e fui para o carro esperar pelo Guiga. Fazia um tempão que eu não colocava um casco e já tinha esquecido o quanto eles te isolam do mundo. O que até que tem seu lado bom.
 
Ali, parada do lado do ASX R, fiquei ‘sozinha’ com os meus pensamentos, vendo o pessoal da Mitsubishi preparar o carro. No caso, o cinto de segurança. O que foi ótimo, porque eu me ocupei vendo como aquilo era trabalhoso e esqueci da parte de ter medo.
 
Quando o Guiga chegou, ele logo me perguntou se eu era a “vítima” da vez. Sim, isso seria assustador se ele não tivesse continuado falando do Flavio Gomes, também conhecido como meu chefe. No dia anterior, quando eu ainda estava na estrada indo de Curitiba para Mafra, recebi uma foto do dono do GP no programa dele na FOX Sports pagando uma aposta. 
 
Desculpa, chefe, mas eu disse pro Guiga que se eu soubesse disso antes, teria providenciado você em versão Penélope Charmosa para acompanhá-lo, mas já não dava mais tempo. Teria que ser eu mesma.
 
O Guiga entrou no carro, testou o rádio pelo qual a gente poderia conversar e antes de sair brincou comigo: ‘Vê se não grita. E, se for gritar, grita baixo’. Bom, isso não seria problema. O maior risco que ele corria era sentir o carro chacoalhando mais do que o normal por conta da minha tremedeira. 
 
Se você nunca viveu uma experiência como essa, saiba que a primeira reta é a maior enganação do universo. Na primeira acelerada você pensa: ‘Ah, isso é tranquilo’, mas toda reta sempre leva a uma curva — ou, no caso do caminhão, a um cavalo de pau. 
 
 Eu levei algum tempo para assimilar onde estava, mas, surpreendentemente, eu estava bem controlada e, depois de achar um lugar para me segurar, consegui até iniciar uma conversa.
 
Antes de sairmos, eu já tinha comentado com Guiga sobre o conforto do carro — esses bancos de carros de corrida não são as melhores coisas do mundo — e ele tinha me contado que a versão do Dakar é muito pior. Não sei como ele e o Haddad aguentam por tanto tempo!
 
Durante o percurso na fazenda, eu fiquei surpresa ao descobrir que o carro tinha ar condicionado. Na verdade, eu nunca tinha pensado a respeito, mas o Spinelli me contou que até no carro do Dakar tem. O carro da Mitsubishi Cup, como é um veículo de série adaptado, tem até rádio.
 
Falando em Dakar, este foi um ano onde eu trabalhei bastante com ele, então estava bem curiosa a respeito. O Guiga foi me explicando a diferença de visibilidade entre o que eu estava vendo e o que ele consegue ver por lá.
 
Nós também conversamos sobre a importância do navegador. Em alguns pontos do trajeto você não consegue ver o que tem pela frente e aí surge o navegador, quase como aqueles anjinhos de desenho animado que te dizem o que fazer. 
 
E a conversa toda acontecia enquanto nós ainda estávamos na pista. As curvas em um carro de rali são um tantinho assustadoras, porque parece o tempo todo que você vai capotar. 
 
Quando estávamos chegando ao fim do passeio, o Spinelli perguntou se eu tinha gostado e eu respondi que sim, que não estava nem tremendo. Ele brincou dizendo que isso nós só saberíamos quando eu descesse do carro, mas eu contei para ele da minha aventura com o Juninho e de como eu tremia desde antes de entrar no caminhão. Progredi muito desde então!
 
Ao descer do carro, nós encontramos com o Fernando, da assessoria de imprensa da Mitsubishi, e o Guiga falou que eu tinha sido uma boa navegadora, o que foi muita gentileza da parte dele. Mas isso foi só porque eu não tive que indicar o caminho. Do contrário, ele provavelmente não chegaria a tempo para a largada promocional do Dakar de 2016.
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