Luta de Hamilton e Bubba Wallace gera incômodo e expõe esgoto do esporte a motor

O hexacampeão da Fórmula 1 e o único preto no grid da Nascar levantam a voz contra o racismo. A horda que se mostra contra a luta por igualdade, lá e aqui, só prova que a humanidade deu muito errado. Mas é preciso resistir porque o ódio não pode vencer

O assassinato de George Floyd há quase um mês de forma covarde pelo policial Derek Chauvin em Minneapolis desencadeou protestos em todo o mundo contra o racismo e a repressão policial. E libertou da garganta o clamor de um povo oprimido pelos poderosos. Vidas negras importam, sim, e o movimento se fortaleceu na sociedade, sendo o esporte importante voz. No esbranquiçado, elitizado e reacionário automobilismo, onde são raríssimos os pilotos pretos, Lewis Hamilton tomou a frente ao ser o grande emblema da Fórmula 1 nos protestos, cobrou que seus pares saíssem da inércia e do mundinho cor-de-rosa das redes sociais e foi para a linha de frente. Nos Estados Unidos, Bubba Wallace levou para a Nascar a luta contra símbolos racistas e clamou pelo banimento da bandeira confederada. A mais popular categoria da América mergulhou de cabeça na luta e decidiu pelo fim do nefasto pavilhão.

O momento é de luta, é de resistência. De lutar e resistir contra o racismo estrutural, mas também de se posicionar frontalmente contra o preconceito em um meio tão conservador e avesso a mudanças no status quo. O universo do esporte a motor, rico e branco, via de regra, se opõe a tudo o que seja contra o padrão ao qual estamos todos acostumados a ver desde sempre.

Os últimos dias têm mostrado o quanto é importante resistir e seguir em frente. Em Londres, Hamilton foi para as ruas e, como qualquer anônimo, protestou contra o racismo, mostrando novamente o seu inconformismo diante da discriminação sofrida mesmo sendo hexacampeão mundial de Fórmula 1. O gesto de Lewis é enorme porque mostra um atleta extremamente bem-sucedido, que sai do lugar comum e reforça o posicionamento já expresso nas redes sociais, mas de maneira ainda mais forte, chamando a atenção do mundo do esporte para o que realmente importa.

Lewis Hamilton
Lewis Hamilton protesta contra o racismo nas ruas de Londres (Foto: Reprodução/Instagram)

As reações à batalha travada por Hamilton foram inúmeras. Muitas felizes com a postura de um multicampeão, que até poderia se dar ao luxo de estar em sua confortável casa, mas que decidiu ir além e dizer ao mundo que vidas negras importam, sim, e que a luta contra o racismo deve ser incessante. As redes sociais, no entanto, expuseram novamente o esgoto do esporte a motor com outras tantas manifestações de cunho racista, no Brasil e lá fora, sobre a atitude do piloto da Mercedes. As frases são tão nojentas que nos recusamos a republicá-las aqui.

Ao mesmo tempo em que Hamilton ia para as ruas de Londres protestar, do outro lado do Atlântico, na Nascar, Bubba Wallace foi vítima de nefasto ato de represália por sua luta contra a bandeira confederada em Talladega. Um nó de forca, símbolo associado ao linchamento e morte em ataques racistas nos Estados Unidos, foi encontrado na garagem da equipe Richard Petty Racing, pela qual corre o único piloto preto do grid e que virou símbolo antirracista na categoria.

Para piorar, os céus de Talladega foram palco de outro ato, tão nefasto quanto, quando um piloto ainda não identificado sobrevoou o superoval do Alabama com uma bandeira confederada pendurada no avião.

Imediatamente, Bubba Wallace recebeu o apoio de boa parte dos competidores da Nascar, incluindo o próprio Richard Petty, heptacampeão da categoria e dono da equipe pela qual compete o piloto. Com mais de 80 anos, o ex-piloto abriu uma exceção durante seu processo de quarentena para “abraçar” Wallace nesta segunda. E esse deve ser o tom da corrida de logo mais na categoria.

Bubba Wallace
Luta de Bubba Wallace contra o racismo expôs o esgoto do esporte a motor (Foto: Nascar)

Por outro lado, houve quem zombasse do racismo sofrido por Bubba e mostrasse novamente o quão vestido de ódio e preconceito pode ser o fã do esporte a motor.

A horda aumentou o tom quando, nesta segunda-feira, a Fórmula 1 anunciou a criação da iniciativa #WeRaceAsOne (corremos juntos, em tradução livre), com o objetivo de levantar temas cruciais na nossa sociedade, como a diversidade, a causa antirracista e a valorização dos profissionais de saúde. O movimento é simbolizado pelo arco-íris, símbolo mundial da bandeira LGBTQIA+.

Para uma categoria baseada em muitos princípios bastante conservadores, mas que vem registrando avanços como o fim das grid-girls, a iniciativa é um importante divisor de águas e mostra que a Fórmula 1 na era Liberty Media quer sair dos posicionamentos institucionais para ser mais efetiva em um movimento que não tem mais volta. É preciso, de uma vez por todas, firmar posição contra o preconceito, seja de qual espécie for.

Mas não chega a surpreender a manifestação de ditos fãs do automobilismo com posicionamentos racistas, machistas e homofóbicos. E não só no Brasil, que virou praticamente um berço reacionário. O que reflete, novamente, que o esporte a motor tem muita gente mergulhada na lama do esgoto do preconceito.

Aliás, quando se fala em Brasil e automobilismo, o mar de chorume é tão grande que o risco de afogamento é enorme. Para começar, praticamente não há piloto preto nos grids das categorias do esporte a motor, tampouco do kartismo. Por mais que existam competidores com milhares, até milhões de seguidores, inexiste quem se posicione além de hashtags vazias e rasas. Quando o fazem, mesmo politicamente, são de uma torpeza atroz, prestando desserviço no momento em que choramos milhares de mortes causadas pela pandemia do novo coronavírus.

Se há algo a tirar de lição com base nos últimos acontecimentos, lá fora e aqui no Brasil, é que a luta é dura, mas precisa continuar. É um caminho sem volta. Porque o ódio não pode vencer! E não vai vencer!

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