Verstappen esnoba teste que 2024 tentou impor e prova com tetra que disputa F1 real

Max Verstappen foi testado de todas as formas possíveis em 2024. E não se deixou esmorecer e nem recuou um centímetro sequer diante dos obstáculos e percalços que viveu ao longo da temporada que agora lhe coroa tetracampeão do mundo. Respondeu na pista aos críticos e deu uma aula a seus rivais. Mais do que nunca, Max mostrou que vive não só em uma liga diferente, mas em uma Fórmula 1 bruta e real. Doa a quem doer

MAX VERSTAPPEN É TETRACAMPEÃO DO MUNDO. A quinta posição no GP de Las Vegas na madrugada deste domingo (24) no Brasil foi suficiente para garantir o quarto título consecutivo na Fórmula 1. Embora a conquista tenha sido antecipada, uma vez que ainda restam duas etapas para o fim da temporada, não é capaz de traduzir fielmente o tamanho do campeonato que Max construiu em 2024. A verdade é que o Mundial tentou desafiá-lo a todo o instante, desde uma inesperada crise interna na Red Bull à perda da superioridade técnica, passando por disputas múltiplas e muita polêmica. Nada foi realmente capaz de pará-lo. E agora conquista o direito de se colocar em completa igualdade aos grandes nomes deste esporte e de fincar seu facão ali, porque disputa a mesma F1 deles — a real, por vezes ríspida e brutal, mas também fascinante e encantadora.

Ainda, talvez esse tenha sido o título mais difícil e aquele que demandou mais de Verstappen. É claro que o icônico campeonato 2021 possui um lugar especial, porque aquela temporada de fato está em um patamar altíssimo, um roteiro de cinema. A rivalidade com Lewis Hamilton e a vitória final ainda permeiam o imaginário dos fãs da F1. Mas 2024 contou uma história com mais camadas, digamos assim. Porque, embora menos épica, emprestou elementos inesperados, alguns dramas, ações controversas e reviravoltas inesperadas, forçando Max a revisitar aquele Max de três anos atrás. Foi interessante perceber como essas nuances do campeão marcaram a trajetória até a festa de hoje. E é igualmente curioso entender que, apesar da força mental e técnica, o filho de Jos Verstappen tem lá seus pontos fracos.

Porque o campeonato começou basicamente como terminou o anterior. Ou seja, com um triunfo categórico no GP do Bahrein, que abriu os trabalhos. Naquele momento, e dada a tranquilidade da pré-temporada, era impossível imaginar um cenário em que Verstappen tivesse alguma dificuldade para arrematar outra taça. Afinal, o então tricampeão vencera quatro das cinco primeiras etapas, consolidando uma forte liderança no Mundial de Pilotos. Apenas Carlos Sainz furou a série — mas é necessário ressaltar: a vitória no GP da Austrália foi facilitada por uma inesperada quebra do piloto #1.

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Max Verstappen abriu a temporada vencendo no Bahrein (Foto: Red Bull Content Pool)

Só que, em meio ao domínio na pista, Verstappen também precisou neutralizar uma estranha crise instaurada na Red Bull. Antes mesmo do campeonato começar, os taurinos foram sugados por uma fase turbulenta a partir de uma denúncia de abuso feita contra o chefe Christian Horner. O inglês de 51 anos acabou inocentado, mas as sequelas deixaram cicatrizes abertas, porque uma guerra pelo poder tomou conta do time, que demorou a encontrar alguma estabilidade.

De um lado, Christian passou a ter um forte apoio da chefia global da marca dos energéticos, enquanto o consultor Helmut Marko tinha os austríacos como pilar e o pai de Verstappen, Jos, que quis a cabeça de Horner a todo custo. O imbróglio resultou em especulações sobre uma eventual saída do piloto neerlandês, que acabou, mais tarde, jurando fidelidade à equipe. Max chegou a confidenciar há alguns dias que teve de assumir um papel de mediador para alcançar um convívio menos bélico entre o pai e o chefe. Mais um teste em que foi aprovado com louvor.

No entanto, houve ainda consequências concretas, sendo a maior delas, Adrian Newey. O gênio por trás dos carros que pediu para sair meses após o escândalo. Mas ele não foi o único. Outras peças chave também decidiram deixar a esquadra, como o diretor-esportivo Jonathan Wheatley, que partiu para chefiar a Audi, e o diretor de estratégia Will Courtenay, contratado para se tornar diretor-esportivo da McLaren. Ainda assim, Verstappen permaneceu firme e driblando os percalços.

Isso porque esse período de grave tensão culminou numa inesperada perda de desempenho do carro taurino. Os primeiros sinais de que havia algo esquisito apareceram na China, quinta etapa. Embora Max tenha varrido o fim de semana, a Red Bull sentiu pela primeira vez que o modelo atual não era tão imbatível quanto o antecessor. A chuva e o asfalto irregular do circuito de Xangai ligaram o alerta. Mas foi só na corrida seguinte, em Miami, que esse cenário ficou mais claro.

Em Miami, Norris venceu e Verstappen foi segundo (Foto: AFP)

A McLaren levou um enorme pacote de atualizações e mudou completamente o carro. A transformação a jogou para o topo do pelotão. Lá na Flórida mesmo, veio a primeira vitória da equipe na temporada e de Lando Norris, enfim, na carreira, aproveitando uma bobeada da direção de prova em uma entrada no safety-car, que o alçou à frente, deixando Max sem ação. Tal como na etapa chinesa, o carro taurino também apresentou deficiências em um terreno mais ondulado. O caso é que o projeto de 2024 se revelou mais desafiador e menos versátil. O assoalho mais rígido tornou a vida difícil, especialmente em relação à altura para o solo. A Red Bull começou a ter menos margem para manobra, e isso se refletiu em diversos resultados ao longo do ano. Porém, havia uma constante: Verstappen.

Mesmo com um carro que perdia velocidade e equilíbrio para uma McLaren cada vez mais competitiva, Max tirava a diferença com uma tocada cada vez mais agressiva, mas aproveitando também os vacilos da concorrência. Basta entender que, apesar de se ver longe do ritmo ideal, Verstappen obteve vitórias importantes: após Miami, o piloto levou a melhor em Ímola, Canadá e Espanha. Provas em que havia uma grande desvantagem para o time de Woking, especialmente.

Nesta altura dos acontecimentos, além da equipe papaia, a Ferrari e a Mercedes também já eram ameaças. Tanto que Charles Leclerc chegou a figurar na vice-liderança por algum tempo nesse período, também pela dominante conquista em Mônaco, até a consolidação de Norris, que acabou por assumir o posto de principal rival — logo depois da corrida em Barcelona. A partir daí, o campeonato passou a acompanhar uma fase das mais loucas e divertidas, com uma série de vencedores diferentes — mas nenhum deles atendia por Verstappen.

George Russell, Hamilton, Oscar Piastri, Leclerc, Sainz e Norris. Todo mundo aí alcançou ao menos um triunfo entre meados da primeira metade do ano e essa reta final. Enquanto isso, Verstappen lidava com um carro instável e tentava limitar os danos, apoiado na grande vantagem construída no trecho inicial da temporada. Porém, o que se entende como administrar pontos não é exatamente o que Max compreendia, porque ele estava sempre tentando mais. É tão verdade que seu pior resultado foi um sexto lugar.

Max Verstappen concede coletiva de imprensa fora da sala oficial da FIA em Singapura (Foto: F1)

Só que, ao mesmo tempo em que procurava soluções com a Red Bull, o neerlandês também perdia a cabeça. Na Áustria, depois de um pit-stop lento, se viu acossado por Lando. Como de costume, jogou duro e empurrou o adversário para fora. Poucas semanas depois, na Hungria, se viu fora da briga, mas travou duelos acirrados, sobretudo com o heptacampeão da Mercedes. Acabou sobrando até para o engenheiro Gianpiero Lambiase — com quem o piloto vive entre tapas e beijos no rádio. Mas o fato é que Max deixou transparecer que, no calor dos problemas, a frieza habitual dava lugar a um desespero incomum. Por outro lado, foi irritante observar que, nem assim, os rivais tiravam proveito.

Importante destacar também um segundo ponto: 2024 viu um lado diferente de Verstappen, muito embora ele não disfarce a personalidade rebelde que habita em si. Durante o GP de Singapura, o neerlandês foi punido por soltar um palavrão na sala de coletivas. Diante do que entendeu como uma arbitrariedade da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) em relação ao caso, Max decidiu protestar e passou a falar com os jornalistas fora do ambiente oficial de entrevistas. A ação ganhou elogios até de Hamilton.

Mas a fase mais tensa do ano ainda estava por vir. Quando a F1 desembarcou na América do Norte, a diferença entre Verstappen e Norris era de 52 tentos, ainda uma distância confortável. Só que o piloto foi do inferno ao céu nas três semanas da viagem ao continente. É que, nos EUA e no México, o #1 da Red Bull acirrou a disputa com o inglês da McLaren ao retomar uma postura ainda mais agressiva nas brigas em pista. Em Austin, acabou livre de sanções quando defendeu tão fortemente a colocação, forçando o adversário a sair da pista. Sete dias depois, ao repetir a ação, agora com mais intensidade, se viu duramente punido — as manobras de Max foram examinadas por uma lupa, tanto por parte da direção de prova quanto de seus pares. As críticas pesaram sobre o taurino, que chegou a zombar da gritaria e jamais assumiu os erros.

Então, chegou a corrida no Brasil. Ainda se defendendo dos comentários mais ríspidos e tentando manter o foco, Max brilhou e deu uma aula aos rivais. Depois de duas novas sanções e uma classificação desastrosa, em que ficou só na 17ª posição, o líder do campeonato se lançou ao GP de São Paulo atrás da vitória, usando a encharcada pista de Interlagos a seu favor. Aqui, também é essencial colocar que a diferença entre o taurino e Norris era de 42 pontos, a menor registrada no ano, graças à vitória do britânico na sprint brasileira, disputada um dia antes. A corrida, entretanto, contou uma história diferente.

Verstappen protagonizou uma largada assombrosa, à Senna em Donington Park 1993. E daí para frente fez história, na que foi seguramente uma das melhores corridas de sua carreira — a celebração mais efusiva é prova disso. E o triunfo sepultou qualquer esperança de Norris e o ensinou a primeira regra da disputa de um campeonato: querer vencer.

A magnífica primeira volta de Verstappen em Interlagos

E é exatamente isso que encanta em Verstappen. O fato de querer, efetivamente, ganhar. Enquanto um apático Lando passou a temporada esperando algo acontecer, teimando em erros básicos e resistindo à vitória, o oponente neerlandês fez o caminho contrário. Mesmo em situações de desvantagem, soube tirar o melhor e jogou com as armas que tinha, sem receio. É correto dizer que há uma diferença de experiências entre os dois concorrentes, mas a alta competitividade de Max nada tem a ver com isso.

Agora, Verstappen enfim conquista o tetra em um ano em que foi testado de muitas formas, portanto. E prova, mais uma vez, que está em um patamar muito diferente de seus colegas de grid. É provavelmente o melhor piloto desta F1, mas facilmente poderia disputar, com honras, em qualquer grid de qualquer era do Mundial. Max tem o que é preciso, ele corre na F1 real. É claro que algumas arestas ainda devem ser ajustadas, a extrema irritação ainda provoca danos e ações que destoam do piloto que é.

Certa vez, ainda no início da temporada, o chefe da Red Bull disse que Max “não é humano”. E talvez realmente tenha razão, mas é bom pensar que existe, sim, um lado bem humano, muito notado em diversos momento em 2024, para o bem e para mal, mas é o que faz de Verstappen quem ele é. Ainda bem.

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