F1 2024 sai de férias equilibrada e imprevisível, mesmo com Verstappen no comando

A Fórmula 1 2024 fechou a primeira parte de temporada vivendo um surpreendente equilíbrio técnico, muito embora Max Verstappen ainda permaneça firme e forte em busca da quarta taça do mundo. Acontece que o campeonato encarou uma reviravolta das mais interessantes, promovendo vencedores diferentes, dramas de todo tipo e até mesmo um dia de fúria que fez o piloto #1 reviver os velhos tempos

Quando os novos carros de 2024 foram à pista no Bahrein, ainda em fevereiro, a sensação era de que a Fórmula 1 viveria mais um ano de extremo domínio de Max Verstappen e da Red Bull. A equipe austríaca havia inovado uma vez mais, enquanto as rivais tentavam entender os próprios projetos e o regulamento em si. E de fato, as cinco primeiras etapas corroboraram com a ideia de uma repetição do que acontecera 12 meses antes. Só que o cenário virou de tal maneira e com tamanha rapidez que agora é quase impossível apostar em uma nova hegemonia, ainda que Verstappen permaneça firme em sua busca pelo tetra. A maior das categorias do esporte a motor encerra sua primeira fase com um sorriso de satisfação no rosto, porque, apesar de tudo, há muita mais histórias a serem contadas.

E é importante destacar que, desde antes do início da disputa, a F1 já dava sinais de que esse não seria um ano tão previsível. A bombástica decisão de Lewis Hamilton em trocar a Mercedes pela Ferrari veio acompanhada do polêmico anúncio do Liberty Media negando um lugar no grid à Andretti. Mas nada foi tão perturbador quanto à crise que a Red Bull passou a viver a partir de uma denúncia de abuso feita contra o chefe Christian Horner. O dirigente virou alvo de investigação e muito se falou sobre a gestão da equipe taurina. Horner acabou inocentado, mas as sequelas deixaram cicatrizes bastante aparentes, porque internamente se instaurou uma guerra pelo poder. De um lado, Christian passou a ter um forte apoio da chefia global da marca dos energéticos, enquanto o consultor Helmut Marko tinha os austríacos como pilar e o pai de Verstappen, Jos, que quis a cabeça de Horner a todo custo.

No meio da confusão, o time perdeu um nome de peso: Adrian Newey acabou pedindo para sair com o passar dos meses. Uma baixa considerável. Além disso, a permanência de Verstappen na equipe também foi colocada em dúvida, diante dos atritos internos. Ainda que o piloto tenha se mantido fiel — e olha que a Mercedes aproveitou o caos para investir em uma contratação estelar —, houve quem apostasse em uma reviravolta diante de uma cláusula contratual, que vinculava Max ao trabalho do conselheiro Marko.

No entanto, apesar do momento turbulento e da batalha de declarações controversas, o tricampeão não esmoreceu e seguiu ditando o ritmo na pista. Max venceu quatro das cinco primeiras etapas da temporada, consolidando uma forte liderança no Mundial de Pilotos. Assim como em 2023, coube a Carlos Sainz furar a série do neerlandês — mas é necessário ressaltar: a vitória no GP da Austrália foi facilitada por uma inesperada quebra do piloto #1.

Mas aí algo aconteceu em Miami, na sexta etapa. A McLaren levou um enorme pacote de atualizações e mudou completamente o carro. A transformação a jogou para o topo do pelotão. Lá na Flórida mesmo, veio a primeira vitória da equipe na temporada e de Lando Norris, enfim, na carreira, aproveitando uma bobeada da direção de prova em uma entrada no safety-car, que o alçou à frente, deixando Max sem ação. Também nos Estados Unidos, o RB20 começou a dar sinais de que não era tão espetacular quanto seu antecessor. Mesmo assim, Verstappen levou na prova seguinte, em Ímola — e aqui foi um triunfo mais trabalhoso, porque os laranjas se mostraram de novo muito fortes, mas se recusaram a vencer.

Na sequência veio Mônaco. De novo, a esquadra de Andrea Stella surgiu forte, mas a Ferrari surpreendeu. Os carros vermelhos voaram, sobretudo Charles Leclerc. O dono da casa finalmente pode comemorar uma conquista diante de sua torcida. Mas enquanto as duas emergentes celebravam, a Red Bull contava os prejuízos. Primeiro, com um fortíssimo acidente de Sergio Pérez logo na largada — o mexicano, que já vinha em boa fase, se envolveu em uma batida com os dois carros da Haas, também por estar no fundo do grid. Depois, porque ficou claro que o carro taurino tinha lá seus pontos fracos. Pistas onduladas e zebras mais altas tiraram o sono de Verstappen, que foi apenas o sexto colocado.

No Canadá, na prova seguinte, a esquadra austríaca ainda sofria com o ritmo, enquanto o time laranja parecia de novo muito bem. Mas aí a Mercedes resolveu também entrar na briga, ajudada por um pacote bem mais eficiente. George Russell surpreendeu na chuva e cravou a pole, com o mesmíssimo tempo de Verstappen. A corrida foi caótica, por conta da instabilidade do tempo, que chamou as equipes ao combate estratégico. Muita gente teve chance de vencer, mas o triunfo acabou nas mãos do tricampeão, que fez tudo certo. Max ainda venceria na Espanha, aproveitando mais um vacilo de Norris e cia.

Então, a Fórmula 1 deu início à melhor parte dessa primeira metade de campeonato. Correndo em casa, a Red Bull se preparou muito bem para a corrida na Áustria. Verstappen liderava tranquilamente, quando um pit-stop lento o fez perder tempo. Norris aproveitou o erro da rival e encostou no neerlandês. Os dois passaram a travar uma dura batalha, até que, nas voltas finais, Lando atacou e Max não deu espaço. Os dois se chocaram. Pior para o piloto da McLaren, que acabou abandonando. O piloto taurino terminou em quinto — ainda foi punido pelo acidente. O clima esquentou, Norris criticou o adversário, que rebateu. Parecia ali que enfim a F1 teria uma nova rivalidade.

Charles Leclerc venceu o GP de Mônaco de F1 (Foto: Pirelli)

Nada disso. Lando decidiu recuar nas palavras duras e perdoou o oponente, que deu de ombros e seguiu seu caminho. A Fórmula 1 chegou a Silverstone uma semana depois e, em meio a gravações do filme de Brad Pitt e o lançamento do trailer, a Mercedes, sobretudo Hamilton, ofuscou a todos. Russell cravou a pole novamente, mas agora sem tempos iguais. As Flechas de Prata voaram nas condições adversas do icônico circuito inglês. E assim como em Montreal, a corrida britânica foi uma balbúrdia, mas também muito tática. Verstappen, por exemplo, foi fundamental nas decisões que tomou quanto às paradas de box, aproveitando a pista seca e molhada.

Por outro lado, a McLaren cometeu mais um erro estratégico e tirou a chance de seus pilotos, enquanto a octacampeã alemã foi certeira, o que abriu caminho para uma vitória apoteótica de Hamilton — foi o primeiro triunfo do inglês depois de 945 dias ou desde o GP da Arábia Saudita de 2021. Bonito ver.

Inclusive, a conquista, da maneira que foi, parece ter feito o heptacampeão renascer na Fórmula 1. A partir dali, se colocou mais combativo e fez as pazes com a Mercedes. Enquanto isso, a McLaren tentava corrigir a rota. E o GP da Hungria surgiu como uma enorme chance. A equipe dominou a classificação, mas a corrida se transformou num vexame, depois de uma decisão controversa. Oscar Piastri, que liderava a corrida desde a largada, depois que superou o pole Norris, se viu atrás do colega de garagem na parte final da prova, porque a equipe conduziu um inexplicável undercut. A partir daí, o time se arrependeu e passou as voltas derradeiras tentando convencer Lando a devolver a posição — o piloto #4 acabou cedendo, em uma das cenas mais toscas da história. E assim foi a primeira vitória de Piastri, que se tornava ali o sétimo competidor a vencer em 2024.

Aqui vale um adendo: apenas Pérez, entre todos os pilotos das quatro primeiras equipes do Mundial, fechou a primeira metade sem vitórias. Além disso, o mexicano também colecionou problemas e acidentes, o mais sério em Monte Carlo. Não à toa, seu nome ecoou pelo paddock, sempre acompanhando de críticas não só da imprensa, mas também da Red Bull. A cobrança foi parar na cozinha de Horner, inclusive. Mas nada disso pareceu fazer efeito: Checo vai ganhar nova chance com os taurinos. Não só renovou o contrato, como também recebeu um voto de confiança da chefia.

Muito emocionado, Hamilton dá longo e apertado abraço no pai após vitória na Inglaterra (Vídeo: Reprodução/F1 TV)

A visita da F1 a Budapeste também rendeu um duelo eletrizante entre Hamilton e Verstappen. Os dois tiveram momentos que lembraram bem a acirrada batalha pelo título de 2021. Mais que isso, o neerlandês mostrou novamente a agressividade da Áustria, inclusive se voltando contra a Red Bull, por um erro de estratégia. O rádio do piloto com o pit-wall foi um show (de horrores) à parte.

Então, chegou a vez de Spa-Francorchamps. Em uma classificação chuvosa, Verstappen fez a pole, mas não levou devido a uma punição por troca de motor. Leclerc herdou a ponta, com um Pérez em segundo, mas foi Hamilton quem brilhou, com ultrapassagens certeiras nas primeiras voltas e a liderança da corrida, enquanto Norris despencava no pelotão após uma péssima largada e ainda tinha de lidar com o tricampeão da Red Bull no encalço. Só que, além do alto ritmo do heptacampeão na frente, chamou a atenção na prova belga a estratégia. Quase todo mundo optou por duas paradas, devido ao alto desgaste dos pneus, mas Russell arriscou e parou uma vez só, surpreendendo até a Mercedes. A escolha ousada deu certo e, depois de segurar o colega Lewis, cruzou a linha de chegada em primeiro em uma belíssima atuação.

O único problema foi que a FIA (Federação Internacional Automobilismo) flagrou o carro abaixo do peso mínimo, o que provocou a desclassificação do inglês, que entregou o triunfo ao companheiro de equipe.

De toda a forma, o triunfo da Mercedes, baseado em desempenho puro e tática, serviu para confirmar o incrível equilíbrio técnico que a Fórmula 1 vive em 2024. A Red Bull ainda possui um conjunto muito forte, sobretudo na liderança de Verstappen, que consegue driblar os reveses quase sempre, embora tenha dado sinais de que a tolerância não é mais a mesma. O que é ótimo para o campeonato. Além disso, a McLaren parece ter hoje o melhor carro grid, bastante versátil, mas ainda precisa aprimorar as decisões internas, sem contar Norris, que teima em ser segundo. Já a Ferrari, embora ainda dê lampejos de competitividade, vai ter de trabalhar um pouco mais para ameaçar as três ponteiras.

Toque entre Max Verstappen e Lewis Hamilton na curva 1 da Hungria (Vídeo: ESPN US)

Enquanto isso, no pelotão intermediário, a Aston Martin ainda briga para voltar para o grupo de cima — e Fernando Alonso também já mostra impaciência. Por outro lado, a RB parece ter um carro melhor do que Daniel Ricciardo e Yuki Tsunoda apresentam. Alpine, por sua vez, atravessa um período dos mais sombrios, com a decisão da Renault em deixar a F1 ao fim de 2025, além da polêmica chegada de Flavio Briatore. A Williams tenta algo novo, mas ainda patina em desenvolvimento. E na lanterna, a Sauber segue com zero ponto e incapaz de sair do lugar.

Lamentavelmente, apesar de o grupo da frente parecer cada vez mais compacto, a diferença para o bloco do meio e do fundo é cada vez maior e sem qualquer expectativa de mudança, sendo o ponto negativo dessa primeira fase de campeonato.

Por fim, ainda houve enorme movimentação do mercado de pilotos. A notícia sobre o acordo de Hamilton com a Ferrari jogou luz no destino de Sainz. O espanhol foi alvo de diversos rumores , se tornou chave das negociações e levou meses até decidir pela Williams, acreditando no projeto de James Vowles. Enquanto isso, a Mercedes seguiu azucrinando a Red Bull para tentar convencer Verstappen a substituir Lewis — o que neste momento parece totalmente fora do radar. Mas o grid ainda vai para as férias com algumas vagas interessantes em aberto, como na própria octacampeã, na RB, Alpine e Sauber, que futuramente vai virar Audi.

Portanto, diante de tudo, a Fórmula 1 pode aproveitar a pausa do verão europeu, porque fez bem a lição de casa.

A partir desta terça-feira, o GRANDE PRÊMIO publica uma série de análise sobre a primeira fase da temporada 2024 da Fórmula 1, que agora faz a tradicional pausa para as férias de verão na Europa e volta de 23 a 25 de agosto em Zandvoort, para a disputa do GP dos Países Baixos.

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