Na Garagem: Schumacher vira maior campeão da F1 com oitavo lugar no GP do Japão. Barrichello vence

Com uma modesta oitava colocação em Suzuka, há exatos 15 anos, Michael Schumacher se tornou o maior campeão da F1. Foi no Japão que o alemão conquistou seu sexto título mundial, que veio em uma prova tensa e dramática, mas que o colocou no posto de maior vencedor da F1

Foi em um 12 de outubro que a F1 viu um dos mais emblemáticos recordes cair por terra. A marca de Juan Manuel Fangio, pentacampeão e lenda do esporte a motor no planeta, enfim, fora superada. O argentino permaneceu como o maior de todos por 45 temporadas, até que um implacável Michael Schumacher enfileirou vitórias e campeonatos pela Ferrari entre o fim da década de 1990 e início dos anos 2000. Em 2002, o já consagrado alemão igualou o mítico número de títulos de Fangio, mas ainda queria mais. E foi logo no ano seguinte que Michael negritou seu nome na história da mais importante categoria do automobilismo, ao levar o sexto caneco, que veio de forma dramática, na etapa derradeira em Suzuka, circuito que parece ter o talento de testemunhar as conquistas dos grandes campeões. 
 
Naquele momento, Schumacher alcançava algo que homens como Ayrton Senna, Alain Prost, Jackie Stewart, Niki Lauda e Jim Clark jamais sonharam ser possível. E chorou, fumou charutos e se permitiu cair na farra naquele dia, 15 anos atrás.
 
Só que o campeonato de 2003 chegou com mudanças sérias, e isso ajudou a embaralhar um pouco as cartas. A Ferrari, por exemplo, não apresentou o comando costumeiro e teve de lidar com o crescimento da McLaren, especialmente com o jovem e rápido Kimi Räikkönen, e da Williams, com um agressivo Juan Pablo Montoya. Aquela temporada também apresentou rostos novos no alto do pódio, corridas tumultuadas, como o aguaceiro no GP do Brasil e a vitória de Giancarlo Fisichella, e uma disputa de título que chegou até a última etapa. 
 
E Schumacher, particularmente, viveu um campeonato de menor domínio, ainda que tenha vencido seis corridas ao longo do ano. Tanto é assim que a primeira vitória aconteceu apenas em San Marino, na quarta etapa. Aí o alemão conseguiu vencer na Espanha e na Áustria e, depois, somente no Canadá. O período mais crítico se deu durante a fase europeia, em que Michael ganhou apenas na Itália, e teve de responder à cobrança da mídia. Antes disso, ainda via seus rivais andarem com mais regularidade. Os triunfos em Monza e em Indianápolis, porém, fizeram Schumacher voltar aos trilhos, chegando à prova nipônica precisando de tão pouco. Já Kimi tinha de vencer e torcer para que o adversário não pontuasse. O placar mostrava 92 a 83 a favor do ferrarista.
2003 foi um ano bem especial: a vitória de Fisichella é uma prova (Foto: Getty Images)

No Japão, o impetuoso alemão alinhou a Ferrari só na 14ª posição do grid, então um cenário aparentemente tranquilo se transformou em uma trama tensa – primeiro porque naquele ano houve uma mudança no sistema de pontuação. Agora não mais o top-6, mas os oito primeiros colocados somavam pontos. Ainda, a definição do grid era decidida com os pilotos saindo um a um, na ordem inversa do campeonato, daí a colocação estranha do ferrarista – na verdade, o piloto pegou pista úmida em sua volta rápida na classificação. E Michael tinha em Räikkönen seu único adversário naquele 12 de outubro – o finlandês largava apenas em oitavo. 

 
A verdade é que o veterano tinha de cruzar a linha de chegada apenas na oitava posição para faturar o título. Fácil? Nem tanto. Vivendo uma disputa mais acirrada do que nos anos anteriores, o ferrarista se achou em apuros ao se deparar com um GP do Japão turbulento, marcado por erros, mudanças de estratégia e decisões afobadas desde a primeira volta. 
 
Mesmo guiando um pouco fora de seu padrão de excelência, o hexacampeonato foi arrematado em um dia também de vitória de Rubens Barrichello, que ajudou a equipe italiana a levantar a taça entre os Construtores, reforçando o domínio da escuderia de Maranello naquele período – foi o quinto Mundial seguido dos italianos. 
 
Falando no brasileiro, foi ele quem largou da pole-position em Suzuka. Montoya partiu da segunda colocação, com os dois carros da Toyota, Cristiano da Matta e Olivier Panis, saindo da segunda fila. Só que foi o colombiano que contornou a primeira curva na frente. 
 
A liderança do piloto da Williams durou pouco, até a volta nove, quando precisou abandonar com pane hidráulica. Assim, Barrichello retomou a ponta, seguido por um intrépido Fernando Alonso, que superara com facilidade a dupla da equipe japonesa. Enquanto isso, mais atrás, Schumacher foi para cima de Takuma Sato de forma agressiva e acabou levando a pior, tendo danificado o carro. Assim, precisou ir aos boxes e voltou em último. reiniciando a prova de recuperação.
 
"Perdi o bico por estupidez minha. Entrei nos boxes de repente e os mecânicos estavam lá. Foi maravilhoso. Eles estavam nervosos como eu, mas, mesmo assim, conseguiram mudar a estratégia e me devolver com um bico novo."
 
Ainda havia por vir. O ferrarista, então, foi ganhando posições e chegou a décimo, depois sexto, com os pit-stops dos rivais, mas o então pentacampeão ainda teve de parar uma segunda vez e, na volta, nova escalada. Só que acabou envolvido em uma confusão com Da Matta e o próprio irmão, Ralf, que acabou com a parte dianteira danificada, depois de um toque da Ferrari, que evitava uma batida com o brasileiro.
Kimi Räikkönen foi ao pódio em Suzuka, mas não foi o bastante para ser campeão (Foto: McLaren)
"Eu travei minhas rodas para não acertar Da Matta e o Ralf acertou o meu pneu traseiro esquerdo, que ficou quadrado. A partir daí, foi como dirigir um carro em uma estrada cheia de pedras. Na reta, quase perdia a visão, de tanto que meu carro vibrava. Aí comecei a pensar um monte de coisas, a imaginar vários problemas e, então, decidi que iria me manter o mais seguro possível para levar o carro até a bandeirada."
 
No fim das contas, Schumacher conseguiu alcançar a oitava colocação já na fase final da prova. Por lá ficou até o momento do alívio da bandeirada. Mais à frente, Barrichello seguia absoluto para a vitória, seguido de um Räikkönen, que ganhou a posição em uma ordem de equipe com David Coulthard. A ideia era esperar uma quebra do brasileiro da Ferrari que nunca aconteceu. Então, ao final das 53 voltas, Rubens voltou a vencer na F1 e Michael se tornou o maior campeão de todos os tempos, aos 34 anos.
 
Exausto ao fim da corrida, Schumacher mal conseguiu revelar seus sentimentos e afastou qualquer chance de comparação com Fangio.

"Não posso descrever, de uma maneira apropriada, o que estou sentido. É um título muito estranho. Das outras vezes, ganhei a corrida e conquistei o Mundial. Ganhar o campeonato chegando em oitavo é muito esquisito. Se sou o maior, isso é o que a imprensa diz, não é o que penso ou sinto. A vitória da Ferrari é muito maior do que o meu título. Estou feliz pela equipe, mas não sei descrever os meus sentimentos. Estou vazio e exausto", disse Michael aos jornalistas.

 
"Não me comparo ao Fangio porque isso não se justifica. Ele é muito maior do que eu. Não posso me comparar a Fangio nem de longe. Tenho enorme respeito pelo que ele fez e jamais vou me comparar a ele, disso estou certo.”
Schumacher comemora com a Ferrari o título do Mundial de Construtores e a façanha de Schumacher (Foto: Ferrari)
Diretor da Warm Up, que abriga o GRANDE PRÊMIO, Flavio Gomes acompanhou ‘in loco’ a conquista inédita de Schumacher e foi dessa forma que a descreveu, após o fim de semana do dia 12 de outubro de 2003.
Foram precisos 46 anos para que Juan Manuel Fangio fosse desbancado. Outros tantos serão necessários para que alguém repita a façanha de Michael Schumacher. Os fãs da Fórmula 1 que estão podendo acompanhar de perto, ao vivo e em cores a epopeia do alemão devem ser-lhe gratos. Não é toda hora que se vê a história sendo escrita no esporte, aqui e agora.
 
Pelé foi o maior do mundo, mas quem tem menos de 40 anos só o conhece por videoteipe. Jesse Owens riu na cara de Hitler nos Jogos de Berlim, mas a gente só sabe disso por livros, fotos e algumas poucas imagens em branco e preto. Mark Spitz encheu a mala de medalhas em Munique/72 e é tratado como lenda. Joe di Maggio, para muita gente, é apenas uma citação em “Mrs. Robinson”. Mesmo as conquistas de Fangio estão restritas a fotos amareladas e testemunhos cada vez mais difusos.
 
No esporte, tem-se sempre a impressão de que os melhores já passaram, privilegiados aqueles que os viram desfilar seus talentos por pistas, campos, quadras, autódromos e piscinas. Ah, fulano que era craque, sicrano que era piloto, beltrano que era um fenômeno, bons tempos, aqueles.
 
Schumacher, a exemplo de outro Michael, o Jordan do basquete, é um deus contemporâneo do esporte. É o melhor de todos, e está aí, vivo, correndo, em plena atividade, sem demonstrar nenhuma intenção de parar pelo menos nos próximos três anos.
 
De 1994, quando conquistou seu primeiro campeonato, até domingo passado, foram dez temporadas, seis títulos, dois vices, um ano capenga, 1996, seu primeiro na Ferrari, e outro em que ficou alijado da disputa, 1999, porque quebrou a perna. É só fazer as contas: oito vezes em dez brigando até o fim para ser campeão, ganhando seis e perdendo duas.
 
Uma máquina trituradora de adversários e recordes? Sim, e mesmo com tudo isso, capaz de fazer as bobagens que fez em Suzuka, correndo riscos desnecessários, guiando como um novato atrás de seu primeiro ponto. O que mostra que não é nem infalível, nem imbatível. E se os outros não o batem, e falham mais que ele, bem, aí é problema dos outros.
 
Schumacher ainda sustenta o posto de maior vencedor da história da F1. O alemão conquistaria, no ano seguinte, seu último título mundial, o sétimo, de uma carreira altamente vitoriosa. E ainda hoje, Michael segue detentor de alguns recordes, mas Lewis Hamilton vem na tentativa de quebrar essas marcas. De qualquer forma, é o heptacampeão ainda o homem que mais venceu no Mundial: 91 vitórias. Quem mais se aproxima é o inglês, que possui 71 neste momento. 
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