Era Gen3 bagunça ordem de forças na estreia da Fórmula E, mas começa em marcha lenta

Início da Era Gen3 na Fórmula E passou longe de ser um desastre, mas a estreia no eP da Cidade do México trouxe raros lances de emoção na pista e já deixou os primeiros alertas

É impossível — e até injusto — definir se uma nova geração inteira de carros fracassou ou obteve sucesso em apenas uma corrida. Certamente, não é isso que este texto se propõe a fazer. No entanto, é impossível não analisar as dificuldades trazidas pela nova Era da Fórmula E — não apenas em relação aos carros — que transformaram o eP da Cidade do México, prova de estreia da temporada, em uma abertura com poucas grandes disputas.

Todos os problemas relacionados ao novo carro Gen3 — como a baixa confiabilidade durante o período de testes e a dificuldade na logística de entrega de peças sobressalentes — culminaram em uma estreia insossa, que resumiu os lances de emoção à corrida de Lucas Di Grassi, que optou por uma estratégia ousada para se manter no pódio com a Mahindra e tornou a corrida interessante até o fim.

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De resto, chamou atenção o baixo número de ultrapassagens na prova: a grande maioria das trocas de posição foi feita em momentos nos quais algum competidor ativou o modo ataque, ou seja, quando alguém usou a parte externa do traçado. Ainda que o artifício tenha trazido uma nova gama de possibilidades estratégicas, já que agora os pilotos não precisam usar os quatro minutos de uma vez, não foi o bastante para agregar emoção.

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Dennis sobrou e venceu estreia da temporada da Fórmula E na Cidade do México (Foto: Fórmula E)

Os novos pneus Hankook, extremamente duros, transformam a superfície do asfalto em uma verdadeira pista de gelo. Em traçados mais abrasivos — como o do próprio Autódromo Hermanos Rodríguez, por exemplo —, o forte calor eleva a temperatura da borracha e diminui ainda mais a aderência. Ou seja, a prioridade passa a ser a manutenção do controle do carro, muito mais leve e suscetível a um erro do que os Gen2.

Mesmo com três entradas do safety-car, o que aproximou o pelotão diversas vezes, nenhuma relargada contou com tentativas de ultrapassagem — que só foram executadas em momentos de algum equívoco de um ou outro piloto.

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Stoffel Vandoorne, Jake Dennis, Pascal Wehrlein e André Lotterer conseguiram efetuar movimentos de ultrapassagem bonitos, mas é pouco. A emoção real ficou restrita à briga pelo terceiro lugar, que tinha um Di Grassi desesperadamente precisando segurar energia, enquanto Jake Hughes e o alemão da Andretti forçavam com tudo.

O brasileiro se manteve na frente até o fim, mas possibilitou momentos de expectativa devido à proximidade dos carros que vinham atrás — Lucas segurou os rivais de tal forma que permitiu até a aproximação de Sébastien Buemi e António Félix da Costa, que se aproximaram perigosamente e não tiveram tempo para um ataque na última volta.

Di Grassi teve atuação espetacular na estreia da Fórmula E em 2023 e foi ao pódio (Foto: Mahindra)

Ou seja, em circuitos que já costumam ser sujos de natureza devido ao fato de serem pistas de rua, os novos carros são ainda mais difíceis e físicos de controlar, além de utilizarem compostos que dificultam o ganho de aderência ao longo da corrida — basta observar o desempenho do monoposto em curvas mais fechadas e sua dificuldade de manter o controle de traseira.

Naturalmente, os tempos de volta também sofreram. Antes de qualquer comparação, é preciso salientar que o traçado escolhido pela Fórmula E para o eP da Cidade do México deste ano é diferente do ano passado, com uma chicane formando as curvas 9 e 10 e cortando a maior reta do circuito.

Ainda assim, carros tão mais potentes que os do ano passado e com uma regeneração de energia consideravelmente maior ficaram em torno de 5s mais lentos do que os Gen2. A volta mais rápida da corrida do ano passado foi de Di Grassi, com 1min09s487 — este ano, o giro mais veloz foi de Jake Dennis, com 1min14s195. A distância é grande.

Nada disso quer dizer que os Gen3 não podem ser mais rápidos que os Gen2, e apenas dois traçados idênticos poderiam dar uma ideia exata da situação — o que traz uma dúvida sobre o motivo da Fórmula E adotar um desenho mais lento logo na estreia da nova geração.

Não foi um dia fácil para Jean-Èric Vergne, que saiu zerado em sua estreia na DS Penske (Foto: Fórmula E)

As equipes ainda precisam de tempo para conhecer os carros, e o próprio Di Grassi prevê dificuldades para um ganho considerável de velocidade. Apesar de ainda ter muita coisa pela frente, a Fórmula E precisa mostrar que implementou de fato um carro melhor do que o do ano passado. Qualquer coisa diferente disso seria, naturalmente, uma vergonha para a categoria, que anunciou com pompa os Gen3 como “os carros elétricos mais tecnológicos e velozes da história”.

Obviamente, a estreia de 2022/2023 também trouxe coisas boas. A ordem de forças foi completamente bagunçada pelos novos carros, com Andretti, Mahindra e McLaren largando à frente do pelotão. Para quem esperava superioridade dos ingleses, que incorporaram a Mercedes, e da Maserati, que absorveu a Venturi, nada disso: sete equipes diferentes terminaram no top-10, com destaque para o péssimo dia da DS Penske, que abriga talvez a dupla mais forte do grid — Vandoorne e Jean-Èric Vergne — e só conseguiu um ponto com o belga.

A NIO parecia ter um bom ritmo na classificação, mas Sérgio Sette Câmara acabou atrapalhado pelo tráfego e não conseguiu emplacar um tempo forte. Com isso, largou em uma posição complicada e não conseguiu se aproximar dos líderes, perdendo terreno até o fim da corrida — terminou em 16º, à frente apenas do companheiro Dan Ticktum. A Abt Cupra é outra equipe que demonstrou ter problemas a resolver antes de estar em posição de desafiar as demais, conforme previsto por Robin Frijns.

Hughes perdeu o quarto lugar no fim, mas fez uma estreia de respeito na Fórmula E (Foto: Fórmula E)

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A genialidade de Dennis, que parece compreender melhor o novo carro do que seus rivais, o fim de corrida espetacular de Di Grassi, que carregou sozinho a responsabilidade de trazer emoção no fim da prova, e principalmente o novo gerenciamento de energia também foram aspectos que trouxeram brilho à disputa mexicana.

O motivo é simples: a vergonha de 2021 em Valência ainda assombra a Fórmula E, e ver uma nova geração de carros cumprindo a distância da corrida sem problemas também representa um alívio. Nada de muito ruim aconteceu, é verdade; a questão aqui é que os destaques positivos também foram escassos.

Nada determina que a trajetória dos Gen3 será necessariamente uma vergonha, e o início deste texto deixa claro que não é possível fazer um julgamento preciso logo na primeira corrida. O que pode se dizer, entretanto, é que o início decididamente não tem sido promissor. Uma penca de problemas e uma dor de cabeça generalizada já tomavam conta antes do início do campeonato, e a estreia confirmou que ainda há muito se estudar — e a melhorar. Enfim, cenas para os próximos capítulos.

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