F1 se faz de sonsa ao correr na Arábia Saudita e adiciona capítulo de desprezo à história

Aceitar a Arábia Saudita no calendário já é uma aberração por si só, mas confiar nas autoridades sauditas diante de um ataque que acontece a poucos quilômetros da pista é ratificar a posição de desprezo pela vida. É fechar os olhos para a crueldade

“Não é pessoal, são negócios.” A máxima que permeia a trilogia da mais famosa história de mafiosos do cinema é também um retrato fiel do que sempre foi a Fórmula 1. O maior campeonato de monopostos do mundo é um negócio gigantesco, na mesma proporção de sua posição para o esporte mundial, em que o dinheiro fala, fala muito. Então, não é uma surpresa acompanhar as declarações e a decisão de seguir com o espetáculo na Arábia Saudita, mesmo diante de ataques a míssil a poucos quilômetros do circuito de Jedá. É só mais um capítulo em que a F1 se faz de sonsa.

A responsabilidade pelo atentado é do grupo Houthi do Iêmen. Os rebeldes atingiram uma refinaria de petróleo da Aramco – que pertence ao governo saudita e é uma das principais patrocinadoras da F1. As explosões puderam ser vistas da pista de Jedá. A F1 realizava o primeiro treino livre naquele momento. Max Verstappen disse no rádio que sentia cheiro de combustível.

O Iêmen vive uma guerra civil e que, desde 2014, enfrenta também um conflito que envolve não só a Arábia Saudita, mas também os Emirados Árabes Unidos e o Irã. Os sauditas e os EAU apoiam o governo de Abd-Rabbu Mansour Hadi. Já os iranianos estão do lado dos rebeldes Houthis, da etnia xiita, que dominam várias regiões. Eles tentam tomar o poder.

Explosão na Aramco deixou nuvem de fumaça no céu de Jedá (Foto: Andrej Isakovic/AFP)

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Nunca a F1 flertou tanto com o perigo como nesta sexta-feira (25) – em todos os sentidos. Foi algo real e palpável. Mas aparentemente não serve de nada. A categoria simplesmente aceita o conflito. A conversa de que “acreditamos nas autoridades” é absolutamente fantasiosa. Não há como garantir segurança em um cenário de guerra como esse, não há um protocolo. Falta transparência e uma explicação. A F1 corre, então, escorada no fato de que os Houthis não quiseram bombardear a pista.

E isso é resultado da decisão desastrosa de aceitar fazer parte do infame sportswashing que a Arábia Saudita empurra em troca de milhões de dólares. A Fórmula 1 ignorou por completo o massacre que acontece no Iêmen. O assassinato de uma população inteira, o massacre de crianças e mulheres. É uma das maiores crises humanitárias do mundo, mas que importa pouco ao ocidente, não comove. É a sensibilidade seletiva da qual a F1 se gaba de fazer parte.

A ONU (Organização das Nações Unidas) estima que o conflito no Iêmen já causou 377 mil mortes, 60% causadas por fome, falta de saúde básica e falta de água potável. Segundo a emissora britânica BBC, foram 700 ataques aéreos no mês passado.  

A verdade é que o Mundial foi comparsa ao negar a humanidade no Iêmen durante todo o processo. Agora, conta com a humanidade dos rebeldes para não ser atacada. E quer não ser atacada enquanto mantém o evento, mantém a negação da humanidade iemenita e recebe os dólares. É isso que acontece.

Ainda, é nisso que a F1 se mete com a pretensão de quem realmente se acha importante. E só fere a própria história.

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