Retrospectiva 2020: Racing Point até faz bom carro, mas paga caro por copiar Mercedes

A Racing Point teve a grande sacada de ir atrás das linhas do W10 da Mercedes na concepção do RP20. Mas a cópia dos dutos de freios acabou tirando a chance da equipe rosa de terminar a temporada com uma forte terceira colocação. Ainda assim, a esquadra fechou o ano com uma vitória, uma pole e mais três pódios

A quarta posição conquistada pela Racing Point no Mundial de Construtores não reflete o real desempenho da equipe rosa em 2020, que colocou na pista o terceiro melhor carro do campeonato. A esquadra chefiada por Otmar Szafnauer sentiu a punição sofrida após o imbróglio dos dutos de freios copiados da Mercedes, mas soube dar a volta por cima e concluiu a temporada com uma histórica primeira vitória de Sergio Pérez no GP de Sakhir e com a surpreendente pole de Lance Stroll na etapa da Turquia. Os dois pilotos também figuraram no pódio ao longo do ano, sendo que o mexicano foi responsável por 64% dos pontos somados pelo time – ainda que tenha perdido duas provas por conta do contágio pelo novo coronavírus. De forma geral, foi uma disputa bem-sucedida, mas a sensação que fica é que poderia ter sido ainda melhor.  

Nem a majestosa pintura rosa do RP20 foi capaz de disfarçar o que a Racing Point havia planejado para a temporada 2020. Assim que o carro foi à pista pela primeira vez, em Barcelona, ficou claro que aquelas linhas já eram bem conhecidas. A esquadra que tem Lawrence Stroll como dono não hesitou em buscar mais do que inspiração no vitorioso modelo concebido pela Mercedes em 2019. O time e a montadora alemã são parceiros técnicos desde 2009, quando a equipe ainda atendia pelo nome de Force India, então o fluxo de informações certamente ajudou na hora de pensar o carro cor de rosa, e os engenheiros acertaram em cheio.

O modelo se mostrou rápido e eficaz, chamando a atenção da concorrência logo de cara. O desenho era uma cópia do campeão W10, com ênfase no downforce e em recursos que ajudavam a melhorar o comportamento dos pneus, bem como uma gerência mais adequada das temperaturas. O carro também apresentou confiabilidade, o que amplificou os comentários no paddock catalão durante os testes. Acontece que o mundo e o campeonato entraram em pausa devido à pandemia, e o assunto acabou esquecido. Mas só por um tempo. Quando as atividades retornaram, na Áustria, a Renault ligou o sinal de alerta, porque ainda tinha aquela pulguinha atrás da orelha. Afinal, a briga no pelotão intermediário é ferrenha e, em 2020, o bloco do meio estava, particularmente, embolado e ainda tinha a presença da Ferrari.

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Detalhes e semelhanças do RP20 para o Mercedes W10
Detalhes e semelhanças do RP20 para o Mercedes W10 (Arte: Rodrigo Berton; Fotos: Racing Point e Mercedes)

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Ainda que o início de temporada tenha sido mais discreto, não demorou para que a Racing Point fosse chamada à mesa dos comissários. Logo depois da segunda etapa, o GP da Estíria, a Renault fez a queixa contra a rival, alegando que a equipe havia copiado o design dos dutos de freios da Mercedes, o que é ilegal, segundo o regulamento, pois as peças não fazem parte dos itens listados – aqueles em que o compartilhamento é permitido. A esquadra francesa insistiu mais no caso e protestou nos fins de semana seguintes, até que a FIA (Federação Internacional de Automobilismo), depois de aceitar as reclamações, concluiu a investigação. A entidade entendeu que a Racing Point violora as regras, de fato.

Desta forma, a escuderia perdeu 15 pontos no Mundial de Construtores (sendo 7,5 para cada um dos carros a respeito do protesto no GP da Estíria) e ainda foi multada em € 400 mil (ou cerca de R$ 2,5 milhões), sendo € 200 mil (R$ 1,27 milhão) para cada um dos carros.

A FIA justificou a decisão afirmando que o projeto do duto de freio dianteiro do RP20 foi uma evolução do que a equipe já tinha usado em 2019, mas apontou que o conceito dos dutos dos freios traseiros foi baseado no que a Mercedes produziu. Os pontos perdidos fariam diferença ao fim do campeonato.

Enquanto lidava com a desconfiança das adversárias, a Racing Point demorou para engrenar na temporada, o que era uma decepção, dada toda a expectativa em cima da ‘Mercedes rosa’. O time sofreu um abandono com Stroll, na Áustria, por conta do motor. Pérez foi apenas o sexto, em uma prova bem agitada na abertura do ano. Depois, apesar de boas posições em classificação, o desempenho em corrida deixava a desejar, embora figurasse sempre na zona de pontuação. Aí, na semana do GP da Inglaterra, dias antes da notícia da punição, Sergio revelou que havia testado positivo para a Covid-19, após uma viagem ao México e à Itália.

Nico Hülkenberg substituiu Pérez e Stroll na Racing Point (Foto: Beto Issa)

Com o desfalque inesperado, a equipe rosa acionou Nico Hülkenberg. O alemão estava fora da F1 desde o fim de 2019, quando perdeu o lugar na Renault para Esteban Ocon. Hülkenberg se preparava para um teste em Nürburgring, quando recebeu o telefonema de Szafnauer. Foi uma pequena maratona entre a viagem, o acerto do banco e o teste do coronavírus. No fim, Nico entrou no paddock cerca de 15 minutos antes do primeiro treino livre. Mas essa primeira expectativa de volta ao grid acabou frustrada. Isso porque o RP20 sequer deixou os boxes para alinhar na reta de largada. O alemão partiria da 13ª posição, mas o carro apresentou um problema ainda nos boxes e impediu qualquer tentativa de disputar a corrida.

Mas a sorte estava ao lado de Nico. Uma semana depois, na mesma pista de Silverstone, Hülk brilhou na classificação, conquistando a terceira melhor marca no Q3, ficando atrás apenas dos dois carros da Mercedes. E ainda superou Max Verstappen. A corrida foi mais complexa, devido ao desgaste excessivo dos pneus. Ainda assim, o piloto de 33 anos foi capaz de cruzar a linha de chegada em sétimo. Até poderia ter terminado à frente, mas um pit-stop extra não permitiu. A atuação renderia semanas de boatos, pois colocou o nome de Nico de volta ao mercado de pilotos.

Ainda nesta primeira parte do campeonato, o time cor de rosa aparecia apenas em quinto na tabela. A ‘silly season’, entretanto, vinha fervendo. A Racing Point já havia confirmado a mudança para Aston Martin em 2021 e, embora Pérez tivesse contrato por mais uma temporada, era o seu nome que estava berlinda. E a concorrência era forte, porque Sebastian Vettel, a pé depois da dispensa da Ferrari, conversava com Lawrence Stroll. O acordo seria confirmado no início de setembro, o que deixou o mexicano sem lugar. E como desgraça pouca é bobagem, Pérez ainda viu Lance conquistar o primeiro pódio do ano, no maluco GP da Itália.

F1; FERRARI; SEBASTIAN VETTEL; GP DE PORTUGAL;
Sebastian Vettel assinou com a Aston Martin para 2021 (Foto: Scuderia Ferrari)

Só que Pérez e Stroll seguiram para uma segunda parte de temporada mais consistente, com melhores posições no grid e performances mais sólidas em corrida, sobretudo Sergio. O canadense se envolveu em mais problemas, como a batida logo na largada do GP da Rússia e um toque sem sentido com Max Verstappen em um treino, no Algarve. O pior ainda estava por vir, porém. Pouco antes das atividades em Nürburgring, no sábado, já que a sexta-feira foi cancelada devido ao mau tempo, Lance se sentiu mal e acabou perdendo a corrida. Dias depois, descobriu-se que o jovem havia contraído o novo coronavírus – Hülkenberg, de novo, foi chamado para andar com o carro rosa.

Stroll demorou para retomar a forma, enquanto a Racing Point perdia uma grande oportunidade com Pérez em Ímola. Mas a temporada reservaria momentos gloriosos ao time. Primeiro, veio a pole inesperada de Lance numa das classificações mais difíceis dos últimos tempos, no traiçoeiro circuito de Istambul. É bem verdade que o canadense não foi capaz de transformar a posição de honra do grid em vitória, mas Pérez salvou o dia com um importante segundo lugar.

Mais tarde, o GP de Sakhir, penúltima etapa da temporada, testemunhou o melhor fim de semana da história da equipe rosa. Com uma atuação brilhante, depois de cair para último após um toque de Charles Leclerc ainda na primeira volta, Sergio se recuperou e, no fim, se viu na liderança, depois de uma intervenção do safety-car. O mexicano não esmoreceu e deu à Racing Point sua primeira vitória na Fórmula 1. Stroll ainda foi capaz se cruzar a linha de chegada em terceiro.

F1; FÓRMULA 1; SERGIO PÉREZ; GP DE SAKHIR; VITÓRIA; PÓDIO;
Sergio Pérez se emociona com a vitória no GP de Sakhir (Foto: Reprodução)

A corrida derradeira, em Abu Dhabi, frustrou a equipe, uma vez que não houve chance de tentar derrotar a McLaren, rival direta pelo terceiro posto do Mundial. Pérez abandonou ainda no início da corrida, com problemas de motor, enquanto Lance foi apenas o décimo.

No entanto, o desempenho sólido e combativo ao longo da temporada premiou Pérez. O piloto de Guadalajara, que chegou a cogitar um ano sabático, ganhou a chance na Red Bull para 2021, em que vai formar dupla com Verstappen – certamente uma das formações mais fortes da F1. Já Stroll mostrou evolução, especialmente em ritmo de corrida. Teve performances surpreendentes e amadureceu, já é uma peça importante na nova fase do time que pertence ao seu pai.  

E a Racing Point agora sai de cena para a chegada da Aston Martin, elegante marca que vai também fortalecer o grid, tendo um tetracampeão em suas garagens.

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