DS Techeetah e BMW saem na frente, mas ‘nova’ Fórmula E se recusa a abandonar velhos hábitos

A nova Fórmula E deu as caras na Arábia Saudita durante a manhã deste sábado (15). Embora muitas novidades se apresentem interessantes, a categoria insiste em não resolver erros claros que repete há algum tempo. No quinto ano de sua história, é fundamental entender que o sucesso comercial depende do esportivo e que forçar briguinhas casuais pela vitória não represente sucesso esportivo a longo prazo

Muito se falou nos últimos meses sobre todas as mudanças, diferenças e inovações que a Fórmula E traria para a sua temporada da revolução. E, de fato, muitas coisas estão diferentes ao que eram no último campeonato. Outras tantas coisas são distintas de tudo mais que já foi visto em toda a história do esporte a motor. Mas é necessário reforçar: a FE precisa dar um passo para crescer também esportivamente. Precisa ser organizada e lembrar que o mundo elétrico para o qual ela olha só se move por causa da questão esportiva. A FE é um fenômeno comercial, sim, mas que só vive por conta do lado esportivo. Em suma: na Arábia Saudita, a nova FE repetiu os velhos erros.
 
O que precisa ser destacado inicialmente é a quantidade de punições: entre classificação e corrida, dez faltas foram distribuídas para dez pilotos diferentes. As da classificação, quase todas reveladas horas depois, mudaram bastante desenho do grid de largada. Tirando Tom Dillmann, vitimado pelo desentendimento da NIO com as regras – a punição que ficou clara ainda durante o treino -, todas as outras foram por uso excessivo de energia. Após quatro anos completos…
 
Na corrida, cinco punições decretadas juntas e de supetão por conta do uso do Regen: os pilotos recuperaram mais energia que o permitido. Tudo bem que o Regen está diferente com o novo sistema de frenagem, mas a Fórmula E não pode ser refém de competência das equipes desta forma. Um dos punidos foi Jean-Éric Vergne, que vencia a corrida com sobras. A punição mudou tudo.
Stoffel Vandoorne (Foto: HWA)

Há duas verdades aí: uma que a punição de Vergne, nessa corrida específica, até tornou a disputa mais divertida. Mas é puramente casual que seja assim e, mesmo que não fosse, o sucesso da FE como mercadoria não pode ser calcado nos erros esportivos grotescos. A outra verdade é que a FE vai passar algum tempo lidando com mais erros mesmo. Pudera, a tecnologia ainda é muito nova.

 
Mesmo com a permissividade de entender o contexto, o campeonato passa dos limites em dias como hoje, perde a mão e mela as corridas e as cabeças de quem assiste em casa. O líder nunca é o líder até que haja confirmação. É chato que seja assim, mesmo quando dá certo por linhas tortas.
 
Outro erro que precisa ser rapidamente corrigido: as especificidades do modo de ataque têm de ficar claras. Quantas vezes os pilotos vão poder acionar o modo numa corrida? O combinado era que houvesse uma divulgação pouco antes da prova – quantas vezes ele poderia ser acionado para que desse um somatório de oito minutos. Foi isso que aconteceu em Ad Diriyah? Responder a pergunta se torna um labirinto, porque não teve esclarecimento algum.
 
A FE precisa entender – e parece que nestes quase cinco anos a organização inteira se recusa a fazer isso – que o sucesso a longo prazo não pode ser apenas baseado no interesse que as montadoras têm na tecnologia ou mesmo em corridas divertidinhas. O interesse na tecnologia diminui até acabar uma vez que as montadoras absorvem o máximo possível do que se tem para oferecer: know-how; as corridas divertidas puramente na base da várzea do bem formam algum público, mas com um interesse sazonal que pode sumir a qualquer instante e vai sempre flutuar de forma descoordenada.
 
Esportivamente falando, a FE precisa se organizar mais e definir o que não pode ser feito para evitar ficar distribuindo um sem número de punições em todas as corridas pelos próximos 15 anos. É fundamental entender que não se sobrevive como uma luta pela vitória absolutamente casual aqui e ali, também. Precisa ter situações reais, de combate, rivalidade e luta. Precisa ser organizado e ter pistas que o público reconheça. Precisa de muita coisa que a FE ainda não tem ou não tem o suficiente.
 
Tem de parar de tapar o sol com a peneira. 
António Félix da Costa (Foto: José Mário Dias)

Para falar da corrida em si, o que se viu foi a DS Techeetah voando na pista com Vergne por toda a prova e com André Lotterer por alguns momentos. O time franco-chinês foi o que mais impressionou, mas não impressionou sozinho. A BMW pode não ter uma dupla do mesmo nível – especialmente porque Alexander Sims é um calouro -, mas tem António Félix da Costa. O português comeu o pão que o Agag amassou com a Andretti nos últimos dois anos. Assim como antes, quando estava na Aguri – que, aliás, virou a Techeetah. Está mais do que disposto a lutar pelo título.

 
No outro lado, vale a preocupação com a Audi. Lucas Di Grassi e Daniel Abt nunca apareceram entre os primeiros colocados. O lamento foi tamanho que, depois da classificação, Di Grassi chamou o carro de "indirigível". Se for assim, problema sério.
Após a prova, Da Costa estava claramente feliz. As vitórias na FE voltaram, quatro anos depois. Só que agora com uma diferença evidente: o carro dele é mesmo um dos melhores do grid.
 
"Estou de volta! Tem sido difícil, muito difícil. Foram longos meses de trabalho, eu estou muito feliz", afirmou. 
 
"Acho que temos algum trabalho a fazer, porque esses dois caras [da Techeetah] estavam tão rápidos… Mesmo com o drive-through ele [Vergne] estava logo atrás de mim no final. Mas foi um bom começo e vamos trabalhar nisso para continuar vencendo", seguiu.
 
"É incrível. Os últimos dois anos não foram fáceis. Como eu disse, trabalhamos muito entre as fábricas da Andretti e da BMW, Indianápolis e Munique, então estou muito feliz por todo mundo lá em Munique. Obrigado, BMW! Eu consegui. Yes!", comemorou.
 
Ao jornal espanhol 'AS', falou mais um pouco. "Levei quase quatro anos para vencer de novo e me sinto muito, muito contente. Os últimos anos foram muito complicados e aí você mesmo começa a pensar no que está faltando, se é culpa do carro ou sua", falou.
 
"Conquistar a pole e a vitória no mesmo dia é algo incrível e quero apenas agradecer aos membros da equipe. Acho que agora temos armas para lutar, e isso me deixa feliz", completou.
António Félix da Costa (Foto: BMW)

O campeão vigente que tinha a vitória nas mãos até ser punido ficou com um pé atrás no pódio. Nada estranho, afinal deixou de vencer uma corrida que tinha em mãos por um erro que, ao que tudo indica, foi da equipe. Mesmo assim, destacou que se divertiu bastante durante os cerca de 47 minutos de corrida.

 
"Infelizmente perdemos um lugar. Queria vencer hoje. Eu tinha um carro fantástico, mas quero dar os parabéns ao pessoal da BMW e ao António. O carro que tínhamos hoje era extremamente rápido, só temos que evitar cometer esse erro [do Regen, que custou a punição] novamente. Foi uma corrida muito encorajadora, e agora estou ansioso para o Marrocos", disse. 
 
"Eu me diverti, fiz ultrapassagens por dentro por fora, todos os tipos. Foi uma corrida muito divertida, eu me diverti. Claro que você sempre quer ganhar, especialmente quando sabe que tem condições, mas levamos o segundo lugar hoje e precisamos manter o conjunto forte e conseguir mais vitórias durante a temporada."
Jean-Éric Vergne (Foto: Techeetah)
No terceiro posto, ficou Jérôme D'Ambrosio em sua estreia pela Mahindra. Aliás, se rasgou em elogios para o novo time.
 
"Muito feliz. Grande primeira corrida, ótima estreia com a Mahindra. Boa maneira de começar o campeonato. Tenho sorte de fazer parte de uma excelente equipe, com grande pessoal. É apenas o início da nossa colaboração e certamente ainda vamos aprender muito juntos. É um grande jeito de começar", destacou. 
 
Questionado sobre a forma como usou o modo de ataque, deu uma explicação.
 
"Na verdade eu nem deveria ter acionado naquele momento, mas senti que era a hora e resolvi fazer. Diminuí a distância e fiquei em boa posição. Quando o safety-car saiu, usei novamente. Até poderia ter usado um pouco depois, porque Vergne acionou o dele e me passou, mas é apenas o começo da temporada e já estamos no pódio", declarou. 
Nelsinho Piquet (Foto: Jaguar)
Nelsinho Piquet largou bem atrás no pelotão após ser atrapalhado pelo acidente de Felix Rosenqvist. Planejou, junto com a Jaguar, partir para dentro na corrida e não conseguiu. É como funciona na FE, ele aponta. Ao menos um ponto foi garantido com o décimo posto. 
 
"Foi uma corrida um pouco frustrante porque fizemos uma estratégia de ser agressivo, mas não fomos agressivos o suficiente e não tiramos vantagem das situações. Foi um dia caótico, mas a Fórmula E é assim de qualquer forma. Poderia ter sido melhor, mas vamos olhar pelo lado positivo e aprender com as coisas. É difícil dizer onde estamos devido ao que foi a corrida mas dá para melhorar bastante", argumentou.
Felipe Massa (Foto: Venturi)
Assim como Piquet, Felipe Massa também teve o grid de largada comprometido pelo momento do acidente de Rosenqvist na classificação, mas fazia uma corrida muito boa. Já ocupava a oitava colocação e buscava a sétima quando chegou a ordem punitiva de fazer o drive-through. Nem ele mesmo entendeu.
 
"Honestamente, nem sei qual o motivo do meu drive-through. Estava fazendo minha corrida, passei vários carros. Fico triste de não conseguir um bom resultado nesse meu primeiro eP. No fim, fiz tudo bem tirando essa punição, que não sei de onde veio", disse.
 
"A corrida estava indo bem, bom ritmo, usei tudo direitinho. Com FanBoost eu passei um carro, usei boa estratégia no Modo Ataque, também ganhei posições lá", completou o estreante, que terminou como o segundo mais votado na eleição do FanBoost.

A FE agora volta e janeiro com duas corridas. Primeiro, no dia 12 de janeiro, com o eP de Marrakech; depois, em 26, o eP de Santiago.

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