Retrospectiva 2023: FIA provoca e inicia guerra que não pode vencer contra Fórmula 1

Antes mesmo da temporada 2023 começar, a Fórmula 1 viveu o primeiro de muitos capítulos de uma batalha que agora parece não ter fim. Acontece que o presidente da FIA, Mohammed Ben Sulayem, decidiu investir contra os donos dos direitos comerciais do campeonato, e isso provocou uma avalanche de problemas e trocas de farpas, culminando numa investigação malsucedida que só fez enfraquecer a posição da federação

O último mês do ano de 2023 acompanhou um dos episódios mais tensos da atual relação entre a Fórmula 1 e a FIA, a Federação Internacional de Automobilismo. O recuo na investigação contra Toto e Susie Wolff talvez seja o capítulo que melhor explique o afastamento cada vez maior entre os dois principais pilares do esporte. O caso é que a gestão de Mohammed Ben Sulayem decidiu confrontar os donos dos direitos comerciais do campeonato, ignorando as consequências e impondo riscos até à existência de ambas da maneira como se tem hoje. Neste momento, apesar dos sorrisos e dos apertos de mão na festa que premiou os campeões em Baku, no Azerbaijão, a sensação ainda é de que uma ruptura está prestes a acontecer.

Importante dizer que, na história, a convivência entre FIA e F1 nunca foi linear e calma, apesar de sempre ter havido certa cumplicidade, mas a questão agora é que ambas não falam a mesma língua há algum tempo, mais precisamente desde o desenrolar dos acontecimentos da decisão do título de 2021, quando o recém-empossado Ben Sulayem manifestou contrariedade diante da decisão da Mercedes e de Lewis Hamilton em não comparecer à premiação no fim daquela temporada, por conta da maneira como o GP de Abu Dhabi foi concluído. Inclusive, o novo presidente defendeu até mesmo uma multa pela não participação. E isso, claro, pegou muito mal, mas serviu como um alerta do que viria a seguir.

Relacionadas


E apesar de conduzir uma investigação e desligar o diretor Michael Masi dos quadros da entidade, a realidade mostrou que muito ainda precisava ser feito para melhorar a administração geral não só das corridas da F1, mas também das categorias de base. A verdade é que 2022 já foi um ano atribulado e cheio de controvérsia por conta de regras e diretivas esquisitas, como da proibição de joias e fiscalização de roupas íntimas dos pilotos, até uma tratativa aleatória sobre o porpoising dos carros. No entanto, esse cenário se tornou ainda mais sombrio em 2023.

Ainda em janeiro, Ben Sulayem decidiu usar as redes sociais para provocar o Liberty Media — o grupo americano dono dos direitos comerciais da F1. Em meio a rumores sobre um interesse da Arábia Saudita em comprar o Mundial por um valor astronômico (algo na casa de R$ 100 bilhões), o presidente da FIA achou por bem questionar os valores e a própria categoria, classificando a avaliação de mercado como um “exagero”. Os posts viralizaram e geraram uma resposta contundente do Liberty, que não gostou da posição do mandatário e o colocou contra parede, depois de uma carta em que contestou as afirmações e não se furtou de ameaças. Como consequência, o dirigente acabou se afastando do dia a dia e das operações da Fórmula 1.

A FIA de Mohammed Ben Sulayem tem relação dura com a Fórmula 1 (Foto: Andrej Isakovic/AFP)

Só que não completamente, porque, nos bastidores, tratou de apressar o processo para escolha de novas equipes para a categoria principal, algo que desagrada sobremaneira não só o Liberty Media, como as próprias escuderias. Há uma enorme resistência do grid em aceitar um novo time, e isso é um dos assuntos mais espinhosos da F1. São recorrentes as declarações contrárias, questionamentos sobre como redistribuir a receita/premiação e preocupação sobre o futuro financeiro.

Ainda assim, Ben Sulayem levou adiante a ação, defendendo a necessidade de uma competição maior. E neste cenário, o projeto da Andretti caiu no gosto do dirigente, especialmente por causa da associação de Michael e Mario Andretti com a GM. Inclusive, o presidente da FIA usou essa ligação para pressionar mais de uma vez o comando do Mundial via imprensa.

Após a fase de inscrição e avaliação dos nomes, a Andretti ganhou a aprovação da entidade sem surpresas, mas não da F1, que segue analisando a proposta. Até o momento, aliás, não há qualquer sinal de que o Liberty Media vá mesmo levar a opção pela equipe americana em frente.

Ainda assim, Ben Sulayem descartou, no entanto, qualquer tipo de intriga (até mesmo medidas legais) com a F1 por causa da Andretti e reiterou que os interesses de ambas as partes estão bem alinhados. Mesmo assim, os times atuais seguem fazendo jogo duro e rejeitando a entrada de uma nova concorrente no grid.

Paralelo a essa novela que se transformou a ideia de ter mais equipes no grid, diversos rumores apontavam para a uma irritação cada vez maior da Fórmula 1 com relação aos problemas recorrentes durante as etapas, como a questão dos limites de pista na Áustria, as punições desmedidas, sem contar o bueiro em Las Vegas. Além disso, houve também uma chamada de atenção a Wolff e Frédéric Vasseur (Ferrari) por uma linguagem imprópria durante uma coletiva, o que reascendeu as críticas sobre o trabalho real da FIA.

Mas foi mesmo após o fim da temporada que a tensão na relação entre a entidade e a Fórmula 1 atingiu seu ápice. No último dia 5 de dezembro, o departamento de compliance da Federação Internacional de Automobilismo decidiu abrir uma investigação sobre possíveis trocas de informações entre o casal Toto e Susie Wolff — chefe da Mercedes e diretora da F1 Academy, respectivamente. A entidade alegou que o processo fora aberto após reclamações de outras equipes. “A FIA está ciente da especulação de mídia centrada na alegação de que informações confidenciais estão sendo passadas a um chefe de equipe de F1 por um membro da FOM (Formula One Management). O departamento de compliance da FIA está investigando o assunto”, divulgou o órgão em nota oficial.

A entrada da Andretti na F1 ainda é um problema na F1 (Foto; John Lamparski/Getty Images)

Acontece que, na verdade, a iniciativa se deu por conta de uma reportagem feita pela revista Business F1, em que revelava que um comentário feito por Toto, durante uma reunião de chefes, virou alvo das reclamações dos adversários, por entenderem que a informação dada só poderia ter vindo da FOM.

Isso foi o bastante para desencadear uma reação em massa. Primeiro, a Fórmula 1 se manifestou e saiu em defesa do chefe da Mercedes e da diretora da F1 Academy, além de uma alfinetada, quando revelou que sequer sabia das intenções da federação. Logo em seguida, a equipe alemã também respondeu ao movimento da FIA e disse que as alegações eram infundadas. Mas foi no dia seguinte que a coisa escalonou, quando os demais times do grid, em comunicados coordenados, saíram em defesa de Susie e negaram qualquer queixa sobre um possível conflito de interesses.

Foi um movimento forte e inédito na história recente da maior categoria do esporte a motor. É claro que a ação ecoou na federação, que não teve outra opção a não ser encerrar a investigação.

O recuo foi uma demonstração de vigor da F1, que uma vez mais ganhou o embate contra uma FIA perdida e cada vez mais enfraquecida. Porque também ganharam corpo os rumores sobre uma ruptura. De acordo com a BBC, o Liberty Media já cogita romper com a entidade se considerar que o presidente prejudica a imagem da categoria principal do esporte a motor.

Portanto, 2024 vai começar a desenhar os rumos do esporte e a hierarquia real do campeonato mundial.

▶️ Inscreva-se nos dois canais do GRANDE PRÊMIO no YouTube: GP | GP2
▶️ Conheça o canal do GRANDE PRÊMIO na Twitch clicando aqui!

Chamada Chefão GP Chamada Chefão GP 🏁 O GRANDE PRÊMIO agora está no Comunidades WhatsApp. Clique aqui para participar e receber as notícias da Fórmula 1 direto no seu celular! Acesse as versões em espanhol e português-PT do GRANDE PRÊMIO, além dos parceiros Nosso Palestra e Teleguiado.