Ovais, TV e até montadora: as batalhas entre Indy e Nascar pelo protagonismo nos EUA

Texas, Iowa, Honda, direitos de transmissão e outros circuitos ovais são palco das disputas entre as duas categorias dos automobilismo local

Os bastidores da Indy e da Nascar estão agitados, com embates constantes entre as categorias, que buscam ainda mais espaço no mercado do automobilismo norte-americano. Ficou destacado o duelo de ambas pelo GP de Long Beach, um episódio em que o principal campeonato de monoposto dos Estados Unidos saiu vitorioso — Gerald Forsythe assumiu o comando total do evento e afirmou que “esta é e será uma corrida da Indy no futuro”.

Esse não é o único episódio em que as organizações se digladiam. Enquanto a Nascar precisa quebrar a cabeça para encontrar uma praça próxima a Los Angeles para atender seus desejos naquela região, a rival sofreu uma dolorosa derrota para esse ano: perdeu para a categoria rival a data no oval do Texas e ficou fora de um dos principais mercados nos Estados Unidos.

Em que pese o bom relacionamento de Roger Penske com a Nascar — inclusive, sua equipe venceu os últimos dois campeonatos por lá, com Joey Logano e Ryan Blaney —, estamos diante de uma situação que traz à tona o famoso jargão: “Amigos, amigos, negócios à parte”.

Por essas e outras, o GRANDE PRÊMIO elencou algumas das disputas que Indy e Nascar travam nos bastidores. Confira:

Ruas de Long Beach continuarão recebendo a Indy (Foto: IndyCar)

Nascar rouba data e tira oval do Texas do calendário da Indy

A Indy penou para reencontrar o caminho para uma boa corrida no circuito em Fort Worth, cerca de 60 km de Dallas, uma das mais importantes cidades dos Estados Unidos. A partir de 2019, a categoria precisou conviver com a aplicação do PJ1 na pista, uma resina colocada no traçado que melhora a aderência dos pneus da Nascar e ajuda nas disputas lado a lado.

Entretanto, o efeito para a Indy é contrário pelo fato dos bólidos serem mais leves e os compostos mais duros. As primeiras edições com PJ1 no circuito foram verdadeiras procissões. Quase sempre bater no muro era o resultado ao passar pela resina e, sem opções, os pilotos seguiam uns ao outros.

A partir de 2022, a Indy mudou a programação e o Texas deixou de abrigar uma rodada dupla. Em compensação, surgiu um treino de 30 minutos para emborrachar a área onde o PJ1 estava aplicado. Além disso, a categoria fez algumas atualizações no Dallara IR-18 para permitir brigas por posições.

Essas medidas não possibilitaram que os carros acelerassem sobre a resina, mas vimos duas edições muito acirradas no Texas. Se o público local ainda não enchia as arquibancadas dos autódromos, os números da audiência nos Estados Unidos eram celebrados — a corrida auxiliou a NBC, detentora dos direitos televisivos no território estadunidense, a atingir em 2023 o maior índice das 12 temporadas que transmitiu até então.

GP do Texas disse que público de 2023 aumentou “uma porcentagem de dois dígitos” em relação a 2022 (Foto: Chris Jones / Indy)

Após este bom resultado, a Nascar alterou seu calendário e antecipou a etapa do Texas de setembro para abril, justamente na data em que estava reservada à rival — foi lá e pagou mais, simples assim. Com a programação de 2024 já comprometida, a organização de Roger Penske ficou sem eventos no Texas. A expectativa é que este duelo não permaneça deste modo, pois os dirigentes da Indy já conversam pelo retorno em 2025.

Circuitos ovais: Nascar muito à frente

A Nascar tem um calendário com 39 eventos, sendo 36 etapas valendo pontos para o campeonato. Ao todo, a organização visita 24 circuitos, sendo que 21 deles são ovais — e boa parte abriga duas datas na competição.

Mais rica, com outras categorias — Xfinity, Truck e outras séries locais — e mais corridas, a Nascar tem maior poder de negociação e, claro, conta com boa vontade dos proprietários dos autódromos. Com isso, solicitar a aplicação do PJ1 não causa resistência e, como já explicado acima, essa resina afugenta a Indy desses palcos.

Além disso, a Nascar tem a Speedway Motorsports [SMI] como aliada, empresa dona de 11 circuitos — sendo dez deles ovais. É desta empresa, inclusive, o Texas Motor Speedway, o que exemplifica a postura no trato com a Indy.

A afinidade entre SMI e Nascar é tão grande que o Nashville Superspeedway ingressou o calendário da organização em 2021, mesmo ano em que foi adquirido pela companhia — aliás, essa é a única pista deles que está na programação da Indy, mas é fruto do enorme montante injetado pela Big Machine, patrocinadora da etapa decisiva do campeonato de monoposto.

Christopher Bell celebra vitória em etapa realizada em Homestead (Foto: Nascar)

Se não bastasse o PJ1 e a SMI, a própria Nascar possui diversos autódromos via Internacional Speedway Corporation [ISC], empresa que adquiriram em 2019 por US$ 2 bilhões [aproximadamente R$ 10 bilhões, de acordo com a conversão atual]. Fontana, Chicagoland, Homestead, Kansas, Michigan, Nazareth, Phoenix, Pikes Peak, Richmond, Talladega e Watkins Glen são circuitos de propriedade da Nascar que receberam a Indy nos últimos anos. Daytona, Darlington, Martinsville, Rockingham e Tucson são outros circuitos no portfólio do grupo. Por essas e outras, a concorrente está somente nos ovais de Indianápolis, Gateway, Iowa e Milwaukee, sendo que as duas últimas recebem rodadas duplas.

A Penske Entertainment até tentou causar leve desconforto ao tirar do oval a etapa da Nascar em Indianápolis. Oficialmente, a intenção era deixar o traçado exclusivamente para as 500 Milhas de Indianápolis, porém, o tiro saiu pela culatra. As edições de 2021, 2022 e 2023 da Nascar no misto obtiveram resultados muito aquém — a renda de bilheteria foi mais baixa, o que impactou no bolso do próprio Roger Penske.

Retorno da Honda à F1 pode fazê-la optar entre Indy e Nascar

No final de 2023, a Honda promoveu mudanças em sua operação nos Estados Unidos. A divisão deixou de se chamar Honda Performance Development [HPD] e foi renomeada para Honda Racing Corporation [HRC]. A alteração não foi somente no nome, mas também na estrutura. O programa, localizado em Santa Clarita, na Califórnia, vai contribuir para o desenvolvimento da marca na F1, que retorna oficialmente ao certame em 2026. Tudo indica que a Honda Global terá mais interferência na operação estadunidense e o orçamento possuirá porcentagem considerável dedicada à categoria mais popular do planeta.

Ao mesmo tempo em que se tornava HRC, a Honda questionava os custos crescentes da Indy. Chuck Schifsky, gerente da marca nos Estados Unidos, indicou em dezembro passado que poderia m deixar a categoria ao final do contrato, em vigência até 2026. Desta forma, haveria mais fôlego para investir na Fórmula 1 ou ir para a Nascar, como sugeriu o dirigente.

Motor híbrido da Honda em destaque durante teste da Indy em Indianápolis (Foto: IndyCar)

A Indy segue negociando a entrada de um terceiro fabricante na categoria, uma promessa de Roger Penske desde quando adquiriu a organização, no início de 2020. Com uma nova fornecedora, os custos da Honda — e também Chevrolet — diminuiriam, pois haveria uma divisão maior do grid entre as montadoras.

Enquanto isso, a Nascar segue conversando com a Honda. Coincidentemente ou não, a categoria considera que o tempo hábil para o ingresso de uma nova montadora no campeonato é 2027, ano seguinte ao fim do contrato da marca japonesa e a Indy.

Oval de Iowa tem duelo pelo público

O Iowa Speedway, oval de 0,875 milha [cerca de 1,4 km], esteve perto de fechar as portas por falta de atividades. Em 2021, a própria Indy deixou de correr no traçado da cidade de Newton, consequência da falta de público, patrocinadores e promotores. Naquele ano, apenas provas regionais foram realizadas por lá.

O ressurgimento de Iowa no cenário nacional do automobilismo estadunidense se deu por uma combinação entre Bobby Rahal, Roger Penske e a rede de supermercados HyVee, que tem sua origem naquela região. A empresa, que já patrocinava a Rahal Lanigan Lettermann, aumentou o orçamento de marketing e queria utilizar a Indy para ampliar a penetração pelos Estados Unidos.

Iowa tomada pelo público da Indy em 2022 (Foto: Indycar)

CEO da rede, Jeremy Gosch foi convencido por Rahal e Penske a reerguer o evento em Newton, que se tornou um verdadeiro festival. Além da rodada dupla da Indy, a Indy NXT também correria por lá. Entre uma atividade e outra na pista, show de estrelas internacionais, como Ed Sheeran, Carrie Underwood, Gwen Stefani, Blake Shelton e outros.

Os camarotes e as arquibancadas cheias deram uma sobrevida ao autódromo. Com a praça revitalizada, a Nascar efetivou seu interesse e correrá por lá pela primeira vez em sua história – até então, só os campeonatos secundários passaram por Iowa — em 16 de junho, quase um mês antes da Indy, agendada para os dias 13 e 14 de julho.

Nesse caso, a batalha é por aquele fã que tem a possibilidade de comprar somente um dos ingressos em espaço tão curto de tempo. E a Nascar está em vantagem nesse quesito: a organização anunciou que todas as entradas foram vendidas.

Direitos televisivos: relevância dá larga vantagem para Nascar

Nascar fechou contrato recorde de direitos de transmissão (Foto: Nascar)

A categoria com maior repercussão nos Estados Unidos — e com considerável vantagem — é a Nascar. Isso a coloca em condição privilegiada nas negociações dos direitos televisivos e coloca a Indy no famoso “compasso de espera”.

A temporada de 2025 marcará o início do novo contrato fechado pela organização, que abocanhou bilhões de dólares de diversos grupos de comunicação. FOX Sports, NBC, Warner Bros, Amazon e até a CW Network, que produz a série 100 Days to Indy 500 [100 Dias para as 500 Milhas de Indianápolis, em tradução literal], compraram os direitos das categorias da Nascar.

Os acordos irão até 2031 e representarão US$ 7,7 bilhões [cerca de R$ 38,5 bilhões] aos cofres da organização. Se considerarmos as receitas anuais provenientes de transmissões, a categoria fechará 2024 com US$ 820 milhões [aproximadamente R$ 4,1 milhões] — 25% a menos do que o montante que receberá a cada temporada a partir do ano que vem.

Com estes grupos de comunicação possuindo uma parte considerável de seus orçamentos comprometidos com a Nascar, as negociações da Indy são mais ponderosas, que está em último ano de contrato com a NBC.

A organização de Roger Penske estaria em situações avançadas para fechar os acordos de transmissão nos Estados Unidos. Estima-se que a Indy receba entre US$ 20 e 25 milhões [aproximadamente R$ 100 e 125 milhões] anuais e que o próximo trato fique na casa dos US$ 60 milhões [cerca de R$ 300 milhões] — um salto significativo, mas ainda é uma parcela ínfima se comparada à Nascar.

Long Beach é o palco da próxima etapa da Indy. A categoria retorna ao circuito de rua da Califórnia no próximo dia 21 de abril, com cobertura completa do GRANDE PRÊMIO.

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