Retrospectiva 2021: Mercedes e Red Bull dividem holofotes em disputa brutal na F1

A temporada 2021 da F1 ganhou ares de guerra não só pelo duelo épico entre Max Verstappen e Lewis Hamilton, mas principalmente pelo extremo confronto entre os chefes de Mercedes e Red Bull

A F1 2021 será para sempre lembrada pelo extraordinário duelo entre Max Verstappen e Lewis Hamilton. Mas esse confronto direto só foi possível porque Mercedes e Red Bull entregaram carros altamente competitivos em um fantástico trabalho de desenvolvimento ao longo do ano. E isso também abriu espaço para uma tensa guerra que extrapolou as garagens. Os chefes das duas equipes assumiram um inédito protagonismo ao se enfrentarem publicamente – e não só por meio da imprensa, mas também via rádio, na pressão que colocaram em cima de quem rege o esporte. Em muitos momentos do campeonato, Christian Horner e Toto Wolff superaram (e muito) aquilo que acontecia nas pistas, ofuscando até mesmo suas estrelas.

É importante pontuar aqui que a F1 nunca foi tão acompanhada de perto. As conversas entre pilotos e equipes, chefes e diretores ganharam manchetes, o que proporcionou uma carga de drama ainda maior a uma disputa que por si só já era extremamente intensa. Do sofá de casa, o espectador não perdeu nenhum detalhe – e se divertiu bem.

Há também uma questão igualmente fundamental: as duas adversárias foram capazes de manter, ao longo de 22 corridas, um patamar de alta performance poucas vezes visto no esporte. Tanto é assim que apenas dois outros times conseguiram vencer: Alpine na Hungria e McLaren na Itália. Fora isso, Red Bull e Mercedes comandaram o ano com um placar de 11 x 9 para os austríacos.

Depois de anos dominando o Mundial, a esquadra alemã enfim encontrou uma rival à altura, sólida e muito forte. Os taurinos elevaram o sarrafo em 2021 e fizeram a multicampeã se voltar para si e realinhar os pensamentos. E a verdade é que o golpe de mestre dos energéticos começou na sutil mudança que o regulamento sofreu entre a temporada passada e essa. A alteração do assoalho e a redução do downforce tiveram um enorme impacto no projeto da Mercedes. Já a Red Bull interpretou melhor essas alterações e foi capaz de encontrar soluções eficazes, o que tornou o RB16B um modelo vencedor.

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Hamilton e Verstappen tiveram nas mãos os dois melhores carros de 2021 (Foto: AFP)

Desde os primeiros testes coletivos, estava claro que o time austríaco tinha nas mãos uma arma poderosa, que, aliada ao talento de Verstappen, poderia encarar de frente a poderosa marca da estrela. Na verdade, a Red Bull começou a desenvolver esse carro ainda em 2020. Os energéticos utilizaram as fichas de desenvolvimento disponíveis para acertar a caixa de câmbio. Essa decisão permitiu uma alteração fundamental da suspensão traseira, dando a chance de um melhor entendimento do assoalho, difusor e freios.

A tetracampeã passou a lidar de forma mais eficaz com as mudanças e anulou a perda da pressão aerodinâmica rapidamente. O RB16B corrigiu as deficiências do carro anterior e se tornou um modelo versátil, capaz de andar bem em diferentes tipos de circuito.

Enquanto isso, a Mercedes tentava entender seu W12. O projeto enfrentou diversos problemas inicialmente. A mudança no assoalho deixou a traseira mais arisca, e os engenheiros demoraram para entender os efeitos do regulamento. Apesar disso, Hamilton começou a temporada no topo do pódio. Mas havia algo no ar, porque em todas essas provas, a impressão era que a Red Bull poderia também ter vencido, não fossem decisões erradas – o holandês pecou por exceder os limites de pista e pagou caro por isso no Bahrein e em Portugal. Na Espanha, tal como em Sakhir, a equipe cometeu vacilos ao não reagir à estratégia da rival. Não à toa, Lewis faturou essas três etapas. Apenas em Ímola, Max foi capaz de se impor. E aqui, o inglês se recuperou de um raro erro, ao escapar da pista.

Então, o cenário era o seguinte: o RB16B parecia um carro com menos problemas que o W12, ainda que o resultado na tabela não falasse isso. Porém, uma queixa feita pela Mercedes ainda em Barcelona serviu como um gatilho para o restante da temporada. A equipe alemã passou a reclamar das asas demasiadamente flexíveis da adversária. Isso se estendeu até Baku, no Azerbaijão, quando as reclamações forçaram a FIA (Federação Internacional de Automobilismo) a verificar as asas. Antes disso, porém, a Red Bull rebateu as críticas da rival apontando para a flexibilidade das asas dianteiras do carro alemão. Era o jeitinho de devolver os ataques.

Max Verstappen venceu o GP da França: o primeiro sinal real de que a Red Bull seria um osso duro de roer foi em Paul Ricard, tradicional palco de vitórias da Mercedes (Foto: Red Bull Pool Content/Getty Images)

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E não ficou só nisso. A partir do GP da França, quando Verstappen emendou três vitórias consecutivas, a Mercedes passou a reclamar do motor Honda – a fabricante havia mudado para a segunda versão da temporada e foi acusada pelos rivais de ampliar a potência. Nada foi comprovado, e o time alemão foi obrigado a reconhecer o melhor desempenho da concorrente. Foi aí também que a multicampeã decidiu correr atrás do prejuízo.

O GP da Inglaterra foi um marco neste sentido. Décima etapa do campeonato, Silverstone recebeu o primeiro teste das corridas de classificação – o formato que visa definir o grid de largada. Hamilton brilhou na decisão das posições na sexta-feira, enquanto Verstappen superou o adversário na prova curta de sábado, mostrando que, apesar das novidades do carro alemão, a Red Bull seguia muito forte. Acontece que na corrida verdadeiramente dita a história foi um pouco diferente.

Mais uma vez, Verstappen e Hamilton dividiram a primeira fila e passaram boa parte da volta inicial andando praticamente lado a lado, até que o inevitável toque na Copse. Na tentativa de ultrapassagem, Lewis tocou a roda traseira esquerda de Max, que tentava endurecer a disputa. Resultado: o holandês rodou, escapou na brita e bateu com força na barreira de proteção. Acabou com o carro. E foi para o hospital por precaução.

O dono da casa seguiu na pista, mas foi punido. Os comissários entenderam que o heptacampeão teve mais culpa pelo incidente. A corrida precisou ser interrompida. No reinício, Hamilton impôs um ritmo forte, pagou a sanção e levantou a torcida com uma atuação de tirar o fôlego. Enquanto isso, nos boxes taurinos, o clima esquentava, com críticas duras dos chefes ao inglês e muita pressão sob a direção de prova.

Hamilton venceu a corrida, depois de uma última ultrapassagem em Charles Leclerc, que lembrou muito a manobra realizada na volta 1. A Red Bull continuava suas queixas, compartilhadas depois por Verstappen. Os energéticos ainda foram mais longe: decidiram pedir uma punição maior a Lewis. E para tanto, recriaram as condições do acidente, usando um dia de filmagem na própria Silverstone, com Alex Albon ao volante. Levaram os dados ao simulador, tudo para fundamentar o argumento de que Hamilton não seria capaz de fazer aquela curva sem bater.

MAX VERSTAPPEN; ACIDENTE; GP DA INGLATERRA; LEWIS HAMILTON;
Assim ficou o carro de Verstappen depois do primeiro grande embate do ano (Foto: Reprodução)

A FIA decidiu ouvir a alegação dos taurinos. Mas não acatou. Em reunião já na Hungria, a entidade entendeu que a equipe criou as evidências do caso. Tudo ficou como antes, mas as bravatas seguiram. E dos dois lados, porque a Mercedes recrutou a adversária, lamentando a tentativa de “manchar a reputação” de Hamilton.

Foi nesse clima que a F1 correu em Hungaroring, na prova final antes da pausa das férias. Como nada é tão ruim que não possa piorar, a corrida do time das latinhas ficou completamente comprometida em um boliche armando por Valtteri Bottas logo na largada, que aconteceu com piso molhado. O finlandês conseguiu tirar Sergio Pérez e danificar o carro de Verstappen. O mexicano acabou abandonando, enquanto o holandês ainda seguiu, mas com “meio carro”, uma vez que toda a parte da lateral direita – bargeboards e trechos do assoalho – foi arrancada. Max correu um déficit grande downforce em uma pista travada. Terminou em nono. Hamilton, por sua vez, foi o segundo, ajudado pela desclassificação de Sebastian Vettel. Lewis precisou de prova de recuperação, entretanto. A recompensa veio na forma de liderança na classificação.

Neste momento, pareceu que a Mercedes havia de fato tomado as rédeas da temporada e seguiria firme para mais um título. Mas esse não era um campeonato comum. A Red Bull voltou muito forte, sobretudo Verstappen. O holandês ficou com a vitória na não corrida na Bélgica e faturou categoricamente o GP da Holanda, diante de uma torcida laranja enlouquecida.

Mas a situação entre as equipes seguia quente, com alfinetadas de todo o lado. O salto de qualidade do carro alemão era a queixa favorita dos taurinos. Isso ganhou contornos ainda maiores na Itália, quando Verstappen e Hamilton viveram um segundo incidente. Agora, ambos acabaram abandonado. Desta vez, a culpa recaiu sobre Max, que, ao disputar a primeira curva de Monza com o rival, viu seu carro decolar para cima do de Hamilton. Foi a imagem do ano, de certa forma.

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Batida forte na Itália foi o último momento em que Hamilton e Verstappen trocaram suas caixas de câmbio (Foto: Beto Issa)

As reclamações surgiram novamente. E serviram muito para ampliar a rivalidade entre Horner e Wolff, que não poupavam um ao outro. Depois da Itália, Hamilton venceu na Rússia, com Max em segundo. Na Turquia, a velocidade de reta assustou os energéticos, mas o holandês terminou em segundo de novo, enquanto Lewis foi apenas o quinto. A temporada vivia uma estranha calmaria que culminou em dois triunfos importantes de Verstappen: EUA e México. Ali, o jovem #33 pareceu colocar a mão na taça.

Só que, em um ano tão caprichoso, não seria fácil. E foi aqui que a relação já explosiva entre as duas equipes se tornou insuportável.

As dúvidas da Red Bull sobre a velocidade de reta da Mercedes tinham como foco a asa traseira do W12 – esse tópico, de fato, permeou o Mundial, para ambos os lados.

Em Interlagos, a F1 viveu uma sexta-feira interminável em que os comissários da FIA levaram horas e horas para definir uma infração a Mercedes, por conta de uma irregularidade na asa, além de uma punição a Max, por um toque no carro adversário no parque fechado. Drama, drama, drama.

Mas também foi no Brasil que Hamilton teve uma de suas maiores atuações não só do ano, mas da carreira, ao vencer o GP de São Paulo. Como se não bastasse toda a treta envolvendo FIA e as duas equipes, Verstappen jogou duro com Hamilton na parte final da corrida, quando empurrou o rival para fora. O incidente sequer foi investigado pelos comissários.

MAX VERSTAPPEN; LEWIS HAMILTON; GP DE SÃO PAULO;
Max Verstappen e Lewis Hamilton travaram, no Brasil, outra disputa polêmica em 2021 (Foto: Pirelli)

A Mercedes não gostou nada e pediu uma revisão. Mas os homens da FIA permaneceram irredutíveis. O que parece ter dado um fôlego a mais aos alemães. Hamilton, então, venceu no Catar e na Arábia Saudita, empatando a disputa. Só que a corrida noturna em Jedá foi uma das mais confusas da temporada e gerou críticas sobre a forma como a direção de prova estava levando o campeonato.

Mercedes e Red Bull passaram a pressionar o diretor Michael Masi sem nenhuma cerimônia. Isso também se refletiu na forma como os chefes se tratavam. Horner e Wolff trocaram cutucas o ano inteiro, mas a parte final do campeonato acompanhou ataques pesados entre eles. Christian chegou a chamar Toto de covarde: “Ele é um galinha”. Já o austríaco falou em “fim da diplomacia” e mandou um “fodam-se todos”.

Mas nada superou o embate da última corrida do ano em Abu Dhabi. Com os dois candidatos ao título em igualdade, a vitória era o que interessava. E Hamilton tinha a oitava taça nas mãos até cinco voltas do fim, quando um safety-car foi acionado depois de um acidente com Nicholas Latifi. As ações da direção de prova a partir deste momento acabaram por definir o campeonato.

Isso porque a Red Bull aproveitou a entrada do SC para trocar os pneus de Max e devolvê-lo a pista em condição de atacar Lewis, que não mudara seus compostos, porque, inicialmente, Masi passou a mensagem de que não nenhum carro descontaria a volta para o líder. Essa decisão praticamente garantia o triunfo ao inglês. Só que, depois de muita pressão no rádio, o diretor de prova mudou de ideia e autorizou que apenas os retardatários entre Hamilton e Verstappen ultrapassassem o líder. Essa situação deixou o britânico vulnerável e facilitou a vida do holandês, que passou o rival na retomada da corrida, conquistando o primeiro título na carreira.

A dramática volta final do decisivo GP de Abu Dhabi (Vídeo: Reprodução/F1)

Só que, enquanto os taurinos comemoravam, a Mercedes e Wolff espumavam no rádio e nos boxes. Mesmo diante do oitavo título seguido na F1, a equipe alemã protestou veementemente contra das decisões tomadas por Masi, mas teve o pedido rejeitado. Mais tarde, ainda ensaiou levar o caso mais adiante. Só que a FIA prometeu uma investigação detalhada sobre tudo o que aconteceu durante a parte final da corrida em Abu Dhabi, garantindo transparência. Dessa forma, a marca da estrela optou por não apelar.

Ainda assim, a multicampeã lançou duras críticas à direção de prova e cobrou mudanças, cujo resultado só será visto em 2022.

A Red Bull, por outro lado, celebrou muito o título de Pilotos, mas não deixou de alfinetar a adversária. “É difícil de entender”, disse Horner.

Portanto, apesar do fim da temporada, a impressão que ficou é que as duas equipes ainda vão seguir dividindo os holofotes por muito tempo na F1.

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